Paço das Artes realiza novos encontros com artistas e críticos de arte da Temporada de Projetos 2023
Iniciativa realizada há mais de duas décadas, a Temporada de Projetos já faz parte do calendário cultural do país e tem a tradição de revelar nomes da arte contemporânea brasileira
Após três edições realizadas em agosto, o Paço das Artes (instituição da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Governo do Estado de São Paulo) realiza, em setembro, três novos encontros gratuitos com artistas e críticos de arte da Temporada de Projetos 2023. A exposição segue aberta à visitação até o dia 1º de outubro.
No dia 22, Ana Raylander conversa com o crítico André Pitol, responsável pelo acompanhamento da artista na exposição William,. Em uma pequena sala do Paço, espaço que já foi uma cela em épocas obscuras da ditadura militar, e, agora, é ocupada pela artista, procura-se reconfigurar códigos entre encarcerados do país. Estetizando o universo prisional, as obras que compõem o ambiente trazem detalhes gráficos e escultóricos de tatuagens e seus significados sociais.
William,, 2023, de Ana Raylander. Instalação composta por uma fotografia impressa em fine art, montada em caixa backlight; grade de ferro recuada à esquerda da sala; teresas construídas com roupas usadas, recolhidas em casas de caridade e brechós; par de esculturas de madeira, cimento e cacos de vidro; escultura de aço doce torcido; recortes de bobinas de papel branco; e inscrição textual em placa de cimento dimensões variáveis
Já no dia 26, a artista Thatiana Cardoso e a crítica Gabriela de Laurentiis discutem o projeto “Os algoritmos te trouxeram até mim. Agora, o satélite me leva até você”. Na exposição, Thatiana propõe rastrear a localização de um dos soldados com quem manteve conversa nos últimos meses por meio do envio de um link rastreável. O objetivo desta ação é descobrir o local em que o golpista vive, obter imagens da cidade de fontes diversas, tais como imagens via Satélite, street view, imagens de parques, restaurantes e outros lugares que a artista considerar romântico. Em seguida, escrever cartas nas quais relatos anônimos de mulheres que sofreram o golpe são alinhavados a cartas românticas encontradas por meio do buscador da internet e a criação de narrativas ficcionais sobre um encontro ideal com o soldado, misturando fantasia e realidade, desejo e frustração. A forma de apresentar este percurso se dá por meio da documentação do processo: dados geográficos fornecidos pelo site de rastreamento por meio de URL rastreável, fotografias via satélite da cidade justapostas às cartas escritas pela artista.
Sinto-me grata por termos encontrado um ao outro neste mundo tão vasto, 2023, de Thatiana Cardoso. Trabalho com imagens via satélite de Madri, feito a partir de rastreador de localização, que indicou essa como sendo a cidade onde um dos golpistas atua.
Por fim, no dia 28, o bate-papo é entre o artista Gustavo Torrezan e o crítico Mario Gioia, que debatem a exposição Exercícios cosmopolíticos. Abordando democracia e relações sociais, a obra é uma série de trabalhos produzidos durante a pandemia, em um período e reclusão como medida de cuidado e diminuição da proliferação do vírus COVID-19. Na desconstrução dos símbolos nacionais, como a bandeira e suas estrelas, Torrezan provoca questionamentos “dos modos políticos de constituição da presença e da interação de quem e o que pode compor o mundo comum”, segundo o próprio artista; objetos e esculturas monocromáticas como dispositivos para se discutir a dinâmica da vida.
Ciranda cósmica (Exercício cosmopolítico VIII), 2022, de Gustavo Torrezan. O trabalho apresenta a movimentação celeste entre 01/01/2019 e 31/12/2022, a partir do mapeamento das estrelas contidas na bandeira do Brasil, tendo como eixo central a estrela “cão menor”.
A Temporada de Projetos é uma iniciativa de mais de duas décadas reconhecida por abrir espaço no circuito cultural para jovens artistas brasileiros. Com entrada gratuita, o público pode conferir cinco projetos individuais e um trabalho coletivo de curadoria. Saiba mais:
https://www.pacodasartes.org.br/exposicoes/em_cartaz/6c5493bf-daf3-4ff5-abf9-bb00e7112be9/temporada-de-projetos-2023
Sobre os artistas e críticos Ana Raylander (João Monlevade, MG, 1995) procura estabelecer um diálogo entre a história coletiva e sua própria história, envolvendo grupos de pessoas para colaborações. Com formação em palhaçaria, bacharelado em artes pela Universidade Federal de Minas Gerais e arte e multimédia pela Escola Superior Gallaecia, Portugal, entende sua atuação como um fazer interdisciplinar. Vem recorrendo aos saberes da educação, escrita, performance e brincadeira para discutir urgências em projetos de longa duração. Foi contemplada com a residência de pesquisa no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (2021), arte contemporânea na Adelina Instituto, São Paulo (2019) e o Prêmio de Residência EDP nas Artes, do Instituto Tomie Ohtake, São Paulo (2018). Realizou projetos pelo Programa de Exposições do Centro Cultural São Paulo (2018) e pela Apexart de Nova York (2021).
André Pitol (Jaú, SP, 1989) é curador e pesquisador. Desenvolve prática de pesquisa documental, cursos e projetos em curadoria e mídia digital, crítica de arte, fotografia, arquivos, artes e migrações, a partir de uma perspectiva afrotópica da história da arte. Estudou no Museu do Sol de Penápolis, na Fundação das Artes de São Caetano do Sul e na Universidade de São Paulo. Escreveu artigos e ensaios sobre Madalena Schwartz, Claudia Andujar, Pierre Verger, Almir Mavignier, José Oiticica Filho e Alair Gomes. Realizou a exposição Expondo patrimônios: a arte de pendurar histórias (São Paulo, 2019), foi cocurador da 30ª Mostra de Arte da Juventude (Sesc Ribeirão Preto, 2022/ Sesc Consolação, 2023) e curador-adjunto de A parábola do progresso (Sesc Pompeia, 2022/2023).
Thatiana Cardoso (São Bernardo do Campo, SP, 1984) busca problematizar o engano e seus mecanismos, seja mimetizando o corpo humano a partir do registro de utensílios domésticos, seja desdobrando-se sobre armadilhas da sedução em golpes de amor. Trabalhando principalmente com fotografia, vídeo, performance e desenho, sua produção transita entre as artes visuais e o cinema. A artista participou de exposições e mostras, entre elas: NÓS:–arte e ciência por mulheres, Paço das Artes (2023); Experimental Film & Music Video Festival, Toronto, Canadá (2023); Artistas mulheres do ABC e do acervo da Pinacoteca de São Caetano do Sul, SP (2022); 21º Festival Internacional de Cinema Contis, França (2016). Thatiana possui bacharelado em Artes Visuais pelo Centro Universitário Belas Artes de São Paulo (2016), onde também fez especialização em História da Arte: Teoria e Crítica (2020).
Gabriela De Laurentiis (São Paulo, SP, 1987) trabalha como artista e pesquisadora, explorando relações entre ciências sociais e artes. É pós-doutoranda na FAU-USP, onde realizou a pesquisa de doutorado
Espacializações de Anna Bella Geiger: a imaginação é um ato de liberdade, com financiamento da FAPESP. É autora do livro Louise Bourgeois e modos feministas de criar (1ª edição Annablume, 2ª edição Sobinfluencia), que conta com tradução em espanhol (No Libros), resultado da pesquisa de mestrado concretizada no IFCH-Unicamp, com bolsa FAPESP. Graduada em Ciências Sociais pela PUC-SP, participou de intercâmbio acadêmico na Sciences Po – Paris. É integrante do duo Lâmina, que explora relações entre elementos artísticos e arquitetônicos, elaborando obras sobre temas como violência, turismo, tecnologia e espacialidades no capitalismo contemporâneo.
Gustavo Torrezan (Piracicaba, SP, 1984) é artista, pesquisador e educador. Em sua prática artística, volta-se para a reflexão sobre as estruturas de poder que configuram historicamente as organizações coletivas, bem como suas constituições culturais e identitárias. Realiza trabalhos híbridos, nos quais se vale de diferentes materiais e disciplinas para discutir relações de domínio a partir das quais se modulam os processos de subjetivação da sociedade. Tem observado o papel do Estado, de seus regimes administrativos, de suas autoridades e instituições. Nesse processo, evoca os campos da sociologia e da geopolítica em suas pesquisas conceituais, muitas vezes fazendo uso de símbolos oficiais da nação para tensionar suas conotações. Para além da experimentação com a síntese formal e com procedimentos de revisão simbólica, propõe também o debate sobre os mecanismos de poder em dispositivos do sistema das artes, aproximando-se das questões de arquivo, memória, espaço e lugar. Por vezes, seus trabalhos insurgem de circunstâncias comunitárias específicas e aproximam-se dos processos sociais ligados a uma determinada localidade. Nesse sentido, as noções de colaboração e dialogia também vêm sendo exercitadas em sua produção. Vive e trabalha entre Piracicaba (SP) e São Paulo.
Mario Gioia (São Paulo, 1974) é curador independente e crítico de arte, graduado pela ECA-USP. Foi crítico convidado de 2013 a 2015 do Programa de Exposições do CCSP e fez, na mesma instituição, parte do grupo de críticos do Programa de Fotografia 2012. Em 2015, no CCSP, fez a curadoria de Ter lugar para ser. Em 2011, passou a integrar o grupo de críticos do Paço das Artes, instituição na qual fez o acompanhamento crítico de Luz vermelha (2015), de Fabio Flaks, Black Market (2012), de Paulo Almeida, e A riscar (2011), de Daniela Seixas, além de Ateliê Fidalga no Paço das Artes (2010). Em 2019, iniciou o projeto Perímetros, no Adelina Instituto, em São Paulo, dedicado a artistas ainda sem mostras individuais na cidade, que contou com cinco exposições solo de artistas da Bahia, Distrito Federal, Rio Grande do Sul e interior do estado de São Paulo. Em 2016, a mostra Topofilias, com sua curadoria, no Margs (Museu de Arte do Rio Grande do Sul), em Porto Alegre, foi contemplada com o 10º Prêmio Açorianos, categoria desenho. Na feira ArtLima 2017 (Peru), assinou a curadoria da seção especial CAP Brasil, intitulada Sul-Sur, e fez o texto crítico de Territórios forjados (Sketch Galería, 2016), em Bogotá (Colômbia). Em 2018, assinou a seção curatorial dedicada ao Brasil na feira Pinta (Miami, EUA) e a curadoria de Esquinas que me atravessam, de Rodrigo Sassi (CCBB-SP). Já fez a curadoria de mostras em cidades como Brasília ( Decifrações, Espaço Ecco, 2014), Porto Alegre ( Fulgor na noite, Galeria Mamute, 2022), Rio de Janeiro ( Histórias naturais, Caixa Cultural, 2014) e Salvador ( Fragmentos de um discurso pictórico, Roberto Alban Galeria, 2017), entre outras. É colaborador de periódicos de artes como Arte al Día