Um estudo recém concluído sobre a biodoversidade de répteis no Cerrado mostra que a riqueza desses animais no bioma e muito superior aos últimos registros oficiais. As amostragens, obtidas ao longo de sete anos esquadrinhando dez diferentes áreas em seis estados e reunindo informações em museus e na literatura, chegou a 236 espécies,
O resultado do inventário, que recebeu apoio da Conservação Internacional (CI-Brasil), oferece informações fundamentais para a conservação de répteis no Cerrado Segundo Cristiano Nogueira, analista em Biodiversidade da CI-Brasil e autor do estudo, ao contrário do que diziam interpretações anteriores, a fauna de lagartos e serpentes depende de micro- ambientes específicos, e poucas espécies são capazes de se manter em ambientes degradados. Além disso, quase metade dos lagartos, 45%, 56 ocorrem no Cerrado, ou seja, são endêmicos do diminio, tendo sua sobrevivência diretamente relaciona da às ações de conservação específicas pa ra esta região. Entre os espécimes coletados, foram registradas 20 espécies novas - nove de lagartos, nove de serpentes e duas de anfisbenas - e várias espécies raras, incluindo duas serpentes cujo último registro era de 1921 e que foram fotografadas em vida pela primeira vez.
A diversidade local de répteis do Cerrado também é alta, ao contrário do que diziam interpretações anteriores. "Em localidades preservadas de Cerrado, co mo Parques Nacionais e Estações Ecológicas, onde toda a gama original de habitats do Cerrado está intacta, podem ocorrer mais de 100 espécies de lagartos e serpentes, colocando o Cerrado como um dos ambientes mais ricos em répteis no continente", revela o pesquisador.
Outro dado importante é que as espécies não se distribuem de modo homogêneo ao longo de toda a extensão do Cerra do. Nogueira observa que boa parte da diversidade e endemismo de répteis ocorre em áreas abertas, em geral, em topos de chapadas -nos campos sujos e limpos -, justa os principais ambientes afeta dos pela destruição de habitats com o avanço da fronteira agrícola. Se o Cerrado não for protegido adequadamente, um grande número de espécies e um legado evolutivo único estará em risco alerta.
Proteção aos remanescentes
Da área original que cobria um quarto do território brasileiro, restam apenas 20% de remanescentes, e menos de 3% está legal mente protegido, por isso a urgência em estudos de prospecção de biodiversidade no Cerrado, um dos 25 hotspots mundiais, como são identificadas as regiões naturais mais biodiversas e ameaçadas do planeta.
O diretor do Programa Cerrado e Pantanal da CI-Brasil, Ricardo Machado, observa que os dados, em constante atualização, já foram incorporados na primeira revisão das áreas insubstituíveis do Cerrado, aquelas essenciais para estabelecer um sistema representativo de regiões e espécies protegidas e na definição de espaços prioritários para a Serra do Espinhaço.
Espécies ameaçadas - Os novos da dos também oferecerão subsídios para re ver a situação de risco de répteis Squarna ta no Cerrado. "Muitas espécies amostra das neste projeto eram tão pouco conhecidas que nem sequer podiam ser avaliadas adequadamente para possível inclusão em listas oficiais de espécies ameaçadas", explica. Hoje, apenas duas das mais de 200 espécies de répteis do Cerrado fazem par te da lista brasileira oficial de espécies ameaçadas. O pesquisador salienta que algumas espécies novas e boa parte das espécies endêmicas, especialmente aquelas da região sul do Cerrado, já estão com boa parte de seus ambientes originais degradados. É até possível que espécies tenham sido extintas mesmo antes de terem sido descritas — ciência", acredita
Os estudos procuraram avaliar a riqueza e a diversidade em áreas preservadas de Cerrado, para as quais haviam poucas informações biológicas. Muito do que se sabia estava vinculado a eventos de destruição de habitats por enchimentos de represas em hidrelétricas, o que obrigava a realização de um inventário necessário estudar em detalhe as áreas protegi das, para entender a distribuição e os ambientes originais das espécies, e fornecer dados para o manejo dessas unidades de conservação", conta.
Alem do inventário geral de Squamata, a ecologia e os padrões de diversidade dos lagartos no bioma foram detalhados em tese de doutorado em Ecologia, pelo Instituto de Biociências da USP, defendida recentemente por Nogueira, e que contou com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).