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Jornal da USP online

Origens e aplicações dos computadores no Brasil

Publicado em 15 dezembro 2014

Por Izabel Leão

Parcela considerável do desenvolvimento da informática no Brasil – hoje presente nos mínimos detalhes do cotidiano dos brasileiros – se deve à USP, e em especial a uma de suas unidades, a Escola Politécnica. Foi ali que, em 1971, se deu o marco inicial de todo esse desenvolvimento: a construção do Patinho Feio, o primeiro computador brasileiro. Bem-humorado, o nome se refere a uma saudável disputa com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que também buscava a construção de um computador, através do Projeto Cisne Branco.

O nome oficial do histórico computador da Escola Politécnica é G10. O G homenageia o comandante da Marinha Luis Guaranis Lins e Rego, que contratou a USP para a construção da máquina, e o número 10 representa um fundo de tecnologia da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos).

Mas a importância da USP para o desenvolvimento da informática no Brasil não se refere somente à criação de produtos industriais. Ela está ligada principalmente à formação de recursos humanos, segundo o professor Lucas Antonio Moscato, do Departamento de Engenharia Mecatrônica da Escola Politécnica, que participou da construção do Patinho Feio. “A missão principal da Universidade sempre foi a de ensinar alunos a serem engenheiros, matemáticos, físicos habilitados em computação e cientistas da computação, entre outros, já que todos os ramos da ciência usam a computação.”

Ao longo das décadas, alunos egressos da USP criaram ou contribuíram com indústrias de computadores, periféricos e softwares que promoveram o desenvolvimento da informática no Brasil. É o caso da Scopus, que hoje pertence ao grupo Bradesco, da Digigraph e da Itautec, que contou com apoio de alunos e professores da Poli no desenvolvimento de produtos de informática.

Além do ensino de graduação e pós-graduação, Moscato destaca que a Escola Politécnica realiza programas de extensão, promovendo a inclusão digital. “Temos aproximadamente 200 cursos de especialização em informática, criados para a área empresarial e a sociedade em geral.”

Sistemas – Na área de sistemas, a Poli desenvolveu o sistema de controle de inundações da cidade de São Paulo, instalado no Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE). “O que funciona hoje é um ‘descendente’ do sistema inicial, que está instalado em todos os rios do Estado e teve o radar meteorológico agregado funcionando para o controle de inundações”, explica Moscato.

Em 1976, o sistema de análise de confiança de equipamentos de trens de subúrbio e do Metrô controlados por computador não era muito bem definido, lembra Moscato. Contratada pelo Metrô de São Paulo, a Escola Politécnica, em parceria com o Battelle Memorial Institute, de Ohio, nos Estados Unidos, desenvolveu uma nova tecnologia para análise da confiabilidade dos trens através da informática, via microprocessadores – o que antes era feito nos moldes tradicionais, via circuitos elétricos e eletrônicos. Moscato ressalta que hoje todos os trens públicos brasileiros usam essa tecnologia, assim como os trens americanos e europeus.

O setor administrativo se beneficia com inovadores sistemas desenvolvidos pela USP. Na Universidade são utilizados sistemas que abrangem todas as áreas da administração universitária, como finanças, recursos humanos e ensino, facilmente acessíveis na internet (www.sistemas.usp.br). Segundo Moscato, esses sistemas foram replicados em várias universidades brasileiras pela Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação, na época em que o ex-reitor da USP José Goldemberg atuou como ministro da Educação, em 1991 e 1992.

Internet – A instalação da internet no Brasil – esse recurso de comunicação indispensável hoje – ocorreu com intensa participação da USP. No começo dos anos 90, professores de engenharia, física e matemática viajaram para o exterior e trouxeram a tecnologia para o Brasil. Inicialmente, ela foi instalada pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) para uso dos pesquisadores brasileiros. “Foi o embrião do que veio a ser a internet utilizada agora pelo público em geral”, diz Moscato.

Uma área em que a USP também se destaca é a da regulamentação da informática no Brasil. Moscato enfatiza que vários professores da Universidade participaram de comissões que regulamentaram a informática no País, principalmente nos anos 70 e 80, fornecendo também ajuda para a elaboração da legislação básica brasileira, patrocinada pela Secretaria Especial de Informática (SEI) do Ministério do Planejamento.

A Lei da Informática – que a partir de 1987 regulou todo o ambiente dos direitos autorais de software, estabelecendo regras de como deveria ser tratada a área de computação no País – contou com a participação da USP. O Marco Civil da Internet foi outra frente de participação dos professores da Universidade. “Não há dúvida de que a USP tem um papel muito ativo na melhoria da sociedade brasileira através dos profissionais que forma, das pesquisas que realiza e de várias outras maneiras”, conclui o professor Moscato.

Incubadora de notáveis

As mais remotas origens de todo o desenvolvimento da informática na USP e no Brasil se encontram na criação, em 1962, do Centro de Cálculo Numérico da Escola Politécnica, que foi responsável pela instalação do primeiro computador numa universidade paulista, um IBM 1620.

Com o correr do tempo, o CCN tornou-se o Centro de Computação Eletrônica (CCE) e passou a ser administrado pelo Instituto de Pesquisas Matemáticas, vinculado ao Instituto de Matemática e Estatística (IME) da USP. O professor aposentado do IME Valdemar Setzer, que participou desse processo, lembra que o centro teve um papel de uma “incubadora de pessoas notáveis”, que contribuíram sensivelmente para a ciência da computação no Brasil. “Era um centro aberto, em que as pessoas utilizavam livremente os computadores. Formou vários pesquisadores que atuaram nessa área pelo Brasil afora.”

De acordo com Setzer, uma das grandes contribuições da USP para o desenvolvimento da informática brasileira foi a criação do Bacharelado em Ciência da Computação, oferecido pelo IME. “Temos uma contribuição acadêmica muito relevante”, observa.

Além dessa contribuição acadêmica, o IME também desenvolve ferramentas que, geradas a partir do conhecimento da informática, facilitam o cotidiano das pessoas. Entre essas ferramentas está, por exemplo, o simulador de etiquetas para identificação por radiofrequência ou Radio-Frequency Identification (RFID), capaz de fazer a simulação da leitura de todos os objetos ou pessoas presentes em um ambiente, de forma mais rápida e eficiente do que ocorre atualmente. Essas etiquetas são aplicadas hoje em diversas áreas e serviços.