A recente crise econômica que atingiu os Estados Unidos e o mundo está deixando todos com um pé atrás. O sentimento de precaução se nota atualmente no Vale do Silício, alvo de um apetite por risco voraz nessa retomada estabilidade pós-crise. Alguns especialistas acham o momento atual ainda mais perigoso e dão como certo o resgate de empresas por atuação do Federal Reserve System (Fed), devido ao chamado “risco moral”.
O caso que está sendo usado como exemplo é o do WhatsApp, vendido por US$ 19 bilhões ao Facebook, enquanto o app de caronas compartilhadas, Uber, foi avaliado em US$ 17 bilhões, mas recebeu aporte de US$ 1,5 bilhão. Brian Blau, analista da Gartner, na Califórnia, reconhece que há preços inflados, sobretudo no segmento de análise de dados (Big Data). Mas pondera que as startups estão mais preparadas para fazer a transição da aposta de risco à economia real, o que não aconteceu na bolha da internet de 2000.
“Os investidores estão cientes dos erros do passado. Os smartphones e a internet estão disseminados, proporcionando oportunidades de monetização em número incrivelmente maior de consumidores”, afirmou Blau, que completa. “Além disso, a miniaturização e a conectividade em objetos abrem novos mercados”.
Mas para Ann Lee, da Universidade de Nova York, acima de tudo, o mercado tem um grave problema moral que certamente resultará no estouro de bolhas. Ela vê um Fed complacente com bancos, o que leva a comportamentos irresponsáveis. “A situação é pior que em 2008. O mercado financeiro sabe que, se houver qualquer problema, o Fed fará um resgate. É o chamado ‘risco moral’”, explica.
Nem todos, porém, estão pessimistas. O investidor conhecido pelo faro certeiro para negócios de internet, Peter Thiel, cofundador do sistema de pagamentos online PayPal, esteve no TechCrunch Disrupt, principal evento mundial para startups ligadas ao setor de tecnologia, e anunciou uma “nova era” para a economia americana nas próximas décadas, colocando o Vale do Silício no centro dessa mudança.
Ele diz que não vê motivo para mudar de lugar tão cedo. “Depois da crise de 2008, o Vale do Silício se tornou o lugar a ir. Não quero fazer muito barulho em cima disso, mas o Vale é o lugar em que se deve ir nos próximos 10 ou 20 anos”, garantiu. Para criar novas empresas no Brasil: ‘anjos’
As startups brasileiras estão longe de captar recursos como muitas das que estão no Vale do Silício. Mas elas contam com os investidores-anjos, que têm potencial de R$ 2,6 bilhões para aportar por aqui até o fim de 2015, segundo a associação Anjos do Brasil.
Um levantamento sobre o perfil desses investidores individuais que colocam recursos próprios em empresas iniciantes mostra que os 6.450 existentes no mercado pretendem desembolsar quase R$ 339 mil individualmente entre este e o próximo ano, totalizando R$ 2,6 bilhões em intenções. O número é menor do que o da pesquisa do ano anterior, que previa uma intenção de US$ 3,1 bilhões para 2013 e 2014, em um cenário de 6.300 investidores.
O presidente da associação Anjos do Brasil, Cássio Spina, acredita que o Brasil tem um grande número de investidores no mercado, mas que são cautelosos e estão avaliando oportunidades. Segundo o estudo, 49% do total de investidores ainda não realizaram nenhum aporte.
Entre os que já operam no mercado, a média geral de investimentos até agora foi maior, de R$ 687 mil para dois projetos. O relatório, porém, demonstra ainda uma disposição pequena desses investidores ao risco. A maioria (58%) declarou realizar aportes de, no máximo, R$ 100 mil; 25%, de até R$ 500 mil; 12%, até R$ 99 mil; e apenas 5% investem acima de R$ 1 milhão.
O estudo também mostra que 61% dos anjos julgam a qualidade do projeto como fator essencial na hora de escolher uma startup para aplicar dinheiro; outros fatores são a perspectiva de saída/retorno do investimento (50%), receber a proteção jurídica de seu patrimônio (45%) e ganhar algum tipo de retorno fiscal ou tributário (15%).
As startups nas áreas de TI são consideradas as mais atraentes para 60% dos investidores; seguidas por empresas de aplicativos (56%), educação (54%), saúde e biotecnologia (48%) e comércio eletrônico (40%). Facebook apoia desenvolvedores de APPs
O Facebook abriu inscrições para o FbStart, seu “programa de aceleração de startups”. O projeto dará US$ 30 mil em ferramentas para que startups, que tenham aplicativos mobile, possam utilizar no desenvolvimento de seus produtos.
O programa é aberto ao mundo inteiro, desde que as startups tenham lançado um aplicativo na App Store ou Google Play ao menos há 30 dias. Para se inscrever, basta preencher o formulário.
De acordo com Renato Goulart, gerente responsável pelo programa na América Latina, “o objetivo do programa é fomentar a inovação de startups e, desse modo, poder contar com mais parceiros desenvolvendo sistemas inovadores que possam atender às necessidades locais”.
O Facebook escolherá os vencedores (sem número determinado) de acordo com o potencial de crescimento, qualidade, engajamento e investimentos anteriores do aplicativo. A startup que tiver mais de um app pode inscrever quantos quiser.
O programa, que vai até 30 de abril de 2015, está dividido em dois grupos: Accelerate e Bootstrapping. O primeiro para startups com um grau pouco maior de maturidade que o segundo. O perfil do mercado nacional e local
E o Rio de Janeiro, será que pode ser considerado referência no Brasil quando o assunto é tecnologia? Para o diretor do programa educacional Startup Rio, do Governo do Estado, Marcelo Salim, o Rio caminha na direção certa. O problema é que o Brasil esbarra na falta de mão de obra especializada, o que acaba dificultando a difusão de novas ideias e, consequentemente, projetos.
Salim é bacharel em Matemática pela UFRJ, com mestrado em Engenharia de Sistemas pela COPPE e tem cursos de especialização por HBS, MIT e Babson. Atuou como pesquisador na COPPE, no Centro Científico IBM e é fundador de empresas no Brasil e no exterior. Ele diz que as startups brasileiras esbarram em três problemas: a questão macroeconômica e política, a cultura e a dificuldade de tornar a empresa uma realidade.
“É muito mais difícil montar um negócio no Brasil do que nos Estados Unidos. Isso é culpa da forma como trabalhamos. Esbarramos também na nossa cultura regional, a latina, de se esconder um pouco frente aos desafios, às possibilidades. Isso permeia todos nós”, observa Marcelo Salim.
A situação das startups é ainda mais delicada. Elas devem ter um cuidado especial, já que ainda estão se desenvolvendo. “Imagina-se no Brasil, equivocadamente, que ao incentivar empresas grandes, as startups automaticamente são beneficiadas. Mas uma startup não é uma versão pequena de uma empresa grande. Ela precisa de um tratamento diferente de uma grande empresa, pois ainda nem se criou. Não é possível dar remédio de adulto para uma criança. Uma startup é uma organização temporária em busca de encontrar um modelo de negócio que dê lucro, que funcione”, explica.
O diretor do programa também aponta o problema da falta de inovação. A prática do “eu também” acaba tirando a capacidade de criar novos conceitos. “A maior parte das ideias que chegam ao mercado são a do ‘eu também’. São as empresas que adotaram uma ideia que já deu certo em outro lugar. Isso dá segurança, pois se foi sucesso lá fora, provavelmente vai vingar por aqui também. Por outro lado, você perde a capacidade de inovação”, afirma Salim, acrescentando que essa questão está diretamente ligada à falta de mão de obra qualificada. "Encontrar qualidade técnica no mercado não é tarefa fácil. Claro que existem esses profissionais, mas não em grande quantidade. Então, eles rapidamente são absorvidos e isso acaba tendo um impacto no setor”. As áreas que concentram maior volume de projetos
Salim também comentou sobre as áreas que possuem maior quantidade de projetos no Rio. A principal delas é a chamada “você fazer coisas do mundo real através do mundo web”. Como por exemplo, os famosos aplicativos que buscam táxi. São ideias para resolver problemas do mundo real no mundo digital.
Outra linha que está aparecendo muito é a ligada à medicina. São os aplicativos que remetem às práticas saudáveis de vida, tão comuns nos smartphones. Salim não comemora a falta de melhores opções.
“O Brasil ainda deixa muito a desejar nesse quesito inovação. Falta estudo. Aquele mito popular de que empreendedor é aquele cara que não estudou e deu certo é uma mentira. Quanto mais tempo de estudo, maiores são as possibilidades de se alcançar o sucesso, e avistar novas possibilidades e projetos”, acrescenta. O Rio pode ser o Vale do Silício brasileiro?
O Estado do Rio é o que está melhor servido de instituições educacionais ligadas à tecnologia. Mas, será que o local que já foi capital da República pode se tornar a capital da tecnologia no Brasil? E mais, pode um dia ser chamado de o Vale do Silício brasileiro?
Marcelo Salim acredita que virar um Vale do Silício é uma tarefa praticamente impossível, mas avista o Rio como o polo principal de tecnologia no país. “Nem os Estados Unidos conseguiram reproduzir o Vale do Silício em Nova York. Aquilo é uma coisa única, que nasceu de forma espontânea. Mas o Rio pode ser considerado referência no Brasil, pois possui a maior quantidade de universidades de ponta em tecnologia. O Rio tem quase o dobro de universidades nota A no MEC em relação a São Paulo. Qualidade, nós temos. E, com isso, há possibilidade, sim, de sermos os líderes no país”, diz.
E Salim acredita que essa liderança pode ser estendida, desde que o Rio chegue a um ponto em que consiga segurar seus melhores profissionais. “Nosso problema é a falta de mercado. Tanto que muitas das grandes empresas de tecnologia instaladas em São Paulo são comandadas por cariocas. Nós temos a formação, mas os profissionais acabam sendo levados para onde tem mais mercado e dinheiro”. Onde buscar incentivos para tirar ideias do papel
Quando um empreendedor tem uma ideia que avalia ser boa, e sonha em montar uma startup, é a hora de correr atrás de um parceiro para incentivos. Este pode ser público ou privado.
“O melhor dinheiro é o que vem de cliente, que vai acreditar naquela proposta e incentivar, que vai ser o evangelizador. O empreendedor pode encontrar uma empresa maior que vai visualizar um futuro na sua ideia”, diz Salim.
Mas, nem sempre é possível encontrar um parceiro privado. Salim aconselha a ficar longe dos bancos para conseguir estes fundos. O ideal é procurar as agências e bancos públicos.
“Existem diferentes tipos de agência de fomento, a Finep, a Faperj, Fapesp, o Startup Rio, ligado à Faperj, o BNDES. São os melhores de se pegar dinheiro. Em algumas agências, você tem um dinheiro livre. Não tem que devolver. Existem outras iniciativas, como a do BNDES, onde você pega quantias maiores, mas tem que pagar. É preciso avaliar suas condições e o que lhe cabe melhor. Mas ambas as situações são melhores do que procurar um banco privado”, explica.
O que é o projeto Startup Rio
O projeto Startup Rio é uma iniciativa público-privada do Estado do Rio de Janeiro e parceiros para fomentar a cultura de empreendedorismo, e com o objetivo de transformar o estado em um polo de referência internacional em tecnologia digital.
Ele é destinado tanto a brasileiros quanto a estrangeiros. Os projetos bem elaborados podem receber até R$ 100 mil em capital somente para desenvolvimento da ideia. Durante o processo, a equipe vai participar de um programa educacional com mentores qualificados.
Você pode conhecer todos os detalhes e inscrever sua ideia inovadora diretamente no site do programa.