Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) desenvolveram um chip bioeletrônico capaz de detectar ao mesmo tempo as vitaminas C e D em fluidos corporais.
Flexível e de fácil utilização, pode ser adaptado para se tornar um dispositivo vestível, contribuindo para uma nutrição personalizada, conforme detalhado em artigo publicado na revista ACS Applied Nano Materials , com destaque de capa.
As vitaminas C e D são consideradas micronutrientes de suporte imunológico, pois participam de vias metabólicas envolvidas na luta contra vírus e bactérias. Monitorar seus níveis no organismo é importante porque garante que elas estejam presentes em valores considerados saudáveis – nem demais, nem de menos.
No entanto, os métodos atualmente disponíveis para isso exigem equipamentos de laboratório caros, operados por profissionais especializados e demandam coleta de sangue, além de gerar resíduos que podem ser nocivos. Outra dificuldade é detectar e analisar essas duas vitaminas ao mesmo tempo, usando o mesmo volume de amostra.
Para simplificar esse processo, pesquisadores do Instituto de Física de São Carlos (IFSC-USP) apoiados pela FAPESP (projetos 22/03758-0, 22/15122-3, 19/13514-9, 22/00243-0 e 18/22214-6) utilizaram recursos acessíveis, de custo relativamente baixo, como carbono, e protocolos operacionais rápidos para desenvolver um chip eletroquímico que permite o automonitoramento dos micronutrientes.
Descartável, o dispositivo incorpora dois sensores distintos, que utilizam corrente elétrica para detectar cada uma das substâncias. No caso da vitamina D, o sensor é feito de nitreto de carbono grafítico e nanopartículas de ouro e contém uma camada de anticorpos anti-25(OH)D3 [25(OH)D3 é a forma mais abundante de vitamina D, devido à sua longa meia-vida]. Já o da vitamina C é feito de nanopartículas de carbono e atua como sensor eletrocatalítico.
O funcionamento é simples: basta conectar o chip a um dispositivo eletrônico portátil semelhante ao medidor de glicose, inserir uma amostra de saliva ou soro sanguíneo e aguardar os sinais de corrente elétrica que indicam a presença das vitaminas e seus níveis. O resultado é obtido em menos de 20 minutos.
“Ao imobilizarmos espécies eletroquimicamente ativas na superfície de um dos sensores, conseguimos eliminar a necessidade de ‘labels' e sondas redox, simplificando o dispositivo e reduzindo a complexidade da análise”, diz Thiago Serafim Martins, atualmente pesquisador no Imperial College London (Inglaterra) e primeiro autor do estudo.
“Isso torna o chip potencialmente mais prático e eficiente, o que possibilita a utilização direta no local de atendimento. Além disso, devido à sua flexibilidade, pode ser adaptado para sensores vestíveis, integrados em um mordedor bucal ou até mesmo aplicados diretamente sobre a pele.”
A seletividade e especificidade do dispositivo foram confirmadas com experimentos de controle, destinados a avaliar potenciais interferências de substâncias normalmente encontradas em amostras de soro e saliva humana, tais como vitamina B12, vitamina B6, vitamina B1, vitamina B3, glicose, lactato, cloreto de sódio e cloreto de potássio.
Desafios
Para que o chip bioeletrônico detector de vitaminas C e D fosse desenvolvido, os pesquisadores tiveram que superar uma dificuldade: garantir que não houvesse interferência entre as vitaminas. Isso significa que a presença de uma vitamina não deveria afetar a detecção da outra no mesmo volume de amostra.
“Para alcançar esse objetivo, desenvolvemos as duas áreas de trabalho, ou seja, os dois sensores do chip, com químicas de superfície distintas e os configuramos para operarem em diferentes potenciais elétricos”, conta Martins.
Os cientistas veem potencial para expandir o dispositivo a fim de detectar outros biomarcadores, incluindo aqueles relacionados a diversos tipos de câncer. Apesar desse avanço, reconhecem a necessidade de conduzir estudos adicionais para validar o sensor. A intenção é que, com isso, possam iniciar o processo de solicitação de patente e, posteriormente, transferir a tecnologia para o mercado.
O estudo também recebeu apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
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