Em locais tão distantes um do outro, como Belém do Pará e São Leopoldo, no Rio Grande do Sul, nasce - e cresce - um tipo raro de empreendedor. Nesses centros de geração de conhecimento e de mão de obra de qualidade, quem abre uma empresa não sonha com negócios comuns, mas sim com ideias que irão transformar a ciência, o campo e a tecnologia. Com a ajuda do Instituto Inovação, do Sebrae, do IBGE e de consultores, Pequenas Empresas & Grandes Negócios fez um levantamento de 45 bolsões brasileiros da inovação. São cidades nas cinco regiões do Brasil, em que empresários têm melhores condições para criar e atrair recursos. Sim, porque vem crescendo o capital, público e privado, destinado a negócios de fronteira.
Se no passado a falta de recursos era um dos principais impeditivos para o Brasil entrar no mapa da inovação mundial, hoje o cenário é outro. "Estamos longe do mundo ideal e bem melhor do que nas décadas passadas", afirma Eduardo Costa, diretor de inovação da Finep, agência de inovação do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). "Calculamos que 2% dos 5 milhões de empresas formais do país precisam inovar. Atendemos no máximo 3 mil de um universo de 100 mil", afirma.
Por ano, a Finep disponibiliza uma verba de R$ 4 bilhões para inovação - desses, R$ 2 bilhões para pesquisas em universidades, R$ 1,2 bilhão para crédito subsidiado, R$ 700 milhões para subvenção e R$ 100 milhões para capital de risco. A verba é multiplicada em parcerias firmadas com fundos de investimento e governos estaduais. "A demanda é grande, daria para operar com pelo menos três vezes esse valor."
AS FONTES DE RECURSOS PARA INOVAÇÃO, POR ESTADO
Saiba qual a verba disponível para investimentos em 2010
O MCT não é o único órgão que investe em inovação do país. As empresas brasileiras também podem recorrer aos programas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), dos Bancos da Amazônia e do Nordeste, do Sebrae e de fundos de investimentos públicos e privados. De acordo com o Centro de Estudos em Private Equity e Venture Capital da FGV-Eaesp, os recursos só em venture capital somam no Brasil US$ 1,5 bilhão, o equivalente a R$ 2,7 bilhões. Com base em São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Santa Catarina, os fundos garimpam empreendimentos inovadores em todo o país, com aportes entre R$ 50 mil e R$ 500 mil por empresa.
Um dos poucos programas voltados especificamente para a micro e pequena empresa, o SebraeTec de Inovação Tecnológica, por exemplo, disponibilizou R$ 32 milhões para cerca de 20 mil micro e pequenos empreendedores investirem em inovação em 2010. "A subvenção é de até 50% do projeto, em um teto de R$ 45 mil, porque nem toda inovação precisa de fortunas para ser implementada. Boa parte das empresas carece apenas de boa gestão", diz Edson Fermann, diretor de inovação do Sebrae. Pesquisa feita pelo Sebrae-SP sinaliza que 39% dos empreendedores precisariam de impostos menores para realizar inovações em seus produtos, enquanto 22% necessitariam de empréstimos bancários para desengavetar seus projetos. Todavia, apenas 20% das empresas ouvidas vão atrás de cursos e consultorias para se diferenciar.
AS CIDADES QUE MAIS GERAM PATENTES
REGIÃO CENTRO-OESTE
Brasília (DF)
REGIÃO SUDESTE
São Paulo (SP)
Rio de Janeiro (RJ)
Belo Horizonte (MG)
Campinas (SP)
Guarulhos (SP)
São Bernardo do Campo (SP)
Franca (SP)
Bauru (SP)
São Carlos (SP)
Jundiaí (SP)
Osasco (SP)
Sorocaba (SP)
Marília (SP)
São Caetano
do Sul (SP)
Santo André (SP)
Contagem (MG)
REGIÃO SUL
Curitiba (PR)
Porto Alegre (RS)
Londrina (PR)
Joinville (SC)
Caxias do Sul (RS)
Blumenau (SC)
Novo Hamburgo (RS)
Passo Fundo (RS)
São Leopoldo (RS)
Criciúma (SC)
Canoas (RS)
FONTES: INPI, IBGE; ANÁLISE: INSTITUTO DE INOVAÇÃO
"Chega a sobrar dinheiro para investir em inovação em determinadas regiões do país, por falta de bons projetos", afirma Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). A questão é que grande parte das empresas não está preparada para inovar. Nem sequer sabe fazer um plano de negócios. Segundo Cruz, o que a maioria dos candidatos a investimentos encaminha aos órgãos de fomento é a especificação do produto e não o projeto de pesquisa que gerará algo inovador. "Falta orientação para os empresários calcularem os riscos e mostrarem onde está a inovação. Só assim conseguirão ter acesso às verbas", afirma.
A análise é parecida fora dos centros públicos de pesquisa. "Tem muita ideia boa que se perde em todo o país por falta de preparo empresarial", diz Frederico Greve, sócio da DGF Investimentos, responsável pelos fundos Fipac e Terra Viva, ambos voltados à inovação e com dinheiro em caixa para investir. Segundo Greve, mais da metade dos projetos analisados pelo fundo são encaminhados pelos próprios empreendedores. Mas a maioria dos aprovados é prospectada pela equipe da casa. Dos R$ 100 milhões disponíveis para o Fipac, foram investidos R$ 70 milhões em 14 empresas, todas do Sul e do Sudeste. "Não investimos mais porque os projetos submetidos à seleção até agora não preencheram os pré-requisitos exigidos pelo fundo", afirma.
EMPRESAS COM POTENCIAL INOVADOR, POR REGIÃO
São 42.623 no Sudeste, 23.037 no Sul, 5.727 no Nordeste, 3.115 no Centro-oeste e 2.087 no Norte do Brasil (pequenas e médias)
Especialistas são unânimes: o caminho para melhorar a distribuição da inovação no país está no preparo das empresas. "É essencial investir em inovação. Mas ninguém coloca dinheiro em um negócio que não seja rentável, por mais revolucionário que seja", diz Greve, da DGF Investimentos.
Confira nas próximas páginas 10 negócios que crescem nos bolsões brasileiros de inovação.
> MECTRON
O que faz: o negócio de fabricação de produtos e serviços para as áreas de defesa e aeroespacial foi fundado há 20 anos por cinco engenheiros. "Somos obrigados a desenvolver tecnologias internas, porque essas são áreas controladas pelos países que detêm a tecnologia", afirma o sócio Azhaury da Cunha, 53 anos. Não há pesquisa pura: 95% do portfólio tem origem na demanda do cliente
Fundação: 1991
Sede: São José dos Campos (SP)
Por que é inovadora: é a única empresa do Hemisfério Sul a fabricar mísseis inteligentes de quinta geração
Aportes: R$ 50 milhões de subsídios nos últimos cinco anos - R$ 15 milhões do fundo BNDESPAR, que desde 2007 é sócio no negócio
Funcionários: 300
Faturamento 2009: R$ 69 milhões
> ANGELUS
O que faz: desenvolvimento de soluções para o segmento clínico-odontológico
Fundação: 1994
Sede: Londrina (PR)
Por que é inovadora: tem oito patentes depositadas, foi pioneira no lançamento de pinos de fibra de vidro e de carbono para a área odontológica, e também no desenvolvimento de produtos para tratamento de perfurações de raízes para tratamento de canal dentário e na criação da primeira embalagem antimicrobiana do mercado mundial para produtos de odontologia. Recebeu o Prêmio Finep de Inovação 2009
Aportes: R$ 14 milhões nos últimos quatro anos, em boa parte verbas de subvenção da Finep
Funcionários: 47
Faturamento 2010 (projetado): R$ 12,5 milhões
> AMAZON DREAMS
O que faz: especializada em química fina, produz compostos concentrados extraídos de frutas e folhas da floresta amazônica usados pelas indústrias de alimentos funcionais,
cosmética e farmacêutica
Fundação: 2002
Sede: Belém (PA)
Por que é inovadora: desenvolveu um processo de extração, purificação e fragmentação de extratos de frutas e folhas que garante um alto grau de pureza e concentração, acima de 75%. Até então o mercado trabalhava na casa dos 30%
Aportes: recebeu investimentos do Fundo Criatec da ordem de R$ 600 mil e até o fim deste ano contará com mais R$ 200 mil do CNPq
Funcionários: 450
Faturamento 2010 (projetado): R$ 1,5 milhão
> ASGA SOLUÇÕES EM TELECOM
O que faz: desenvolve sistemas de telecomunicação com transmissão por fibra óptica sob medida para operadoras de telefonia
Fundação: 1989
Sede: Paulínia (SP)
Por que é inovadora: a empresa foi pioneira no desenvolvimento do software "biling". Trata-se de um programa que consegue gerar a listagem de todas as ligações feitas por usuários de telefonia celular. O programa foi adotado pela operadora Oi. Lança uma média de 20 novos produtos por ano
Aportes: contou com vários projetos de subvenção da Finep e participou do programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe)
Faturamento 2009: R$ 130 milhões
> CIANET
O que faz: a empresa oferece soluções de hardware e software para comunicação de dados de alta velocidade, equipamentos para convergência digital e telecomunicações, conversores para redes de internet e centrais telefônicas
Fundação: 1994
Sede: Florianópolis (SC)
Por que é inovadora: criou um equipamento que permite o uso de redes de internet externas (outdoor) com tráfego de 256 megabits por segundo por cabo coaxial, próprio para gerenciamento de grandes volumes de dados e conteúdo digital. Foi premiada mais de uma vez pela Finep como empresa inovadora e recebeu o prêmio Caspar Temer de Inovação 2010
Aportes: quatro subvenções da Finep no valor de R$ 3,5 milhões, além de investimentos do Fundo Criatec
Faturamento 2010 (projetado): R$ 15 milhões
> DESIDRATEC
O que faz: desidratação de produtos de origem vegetal, animal e mineral
Fundação: 2006
Sede: Fortaleza (CE)
Por que é inovadora: criou um processo único de evaporação a baixa temperatura, menos de 60° C, que mantém intactas as moléculas e preserva as características dos produtos desidratados. Foi premiada pela Anprotec como a empresa incubada mais inovadora em 2009
Aportes: dois projetos de subvenção da Finep no valor de R$ 1,2 milhão
Faturamento 2010 (projetado): R$ 1 milhão
> INVITRO CELLS
O que faz: realiza testes de toxicidade in vitro usando células e não animais para estudos de eficácia e segurança de produtos fármacos e cosméticos
Fundação: 2007
Sede: Belo Horizonte (MG)
Por que é inovadora: desenvolveu uma tecnologia capaz de identificar com precocidade o efeito tóxico de uma nova molécula
Aportes: R$ 1,3 milhão do fundo Criatec e R$ 10 mil do Sebraetec
Faturamento 2010 (projetado): R$ 700 mil
> MODCLIMA
O que faz: produz chuvas artificiais
Fundação: 2007
Sede: São Paulo (SP)
Por que é inovadora: desenvolveu uma tecnologia para produção de chuva artificial sem aglutinadores químicos, usando apenas água potável. Já fez chover mais de 500 vezes em Santa Catarina, Bahia, Maranhão e São Paulo
Aportes: R$ 120 mil de subvenção da Primeira Empresa Inovadora (Prime), da Finep
Faturamento 2010 (projetado): R$ 1,8 milhão
> ENALTA
O que faz: os softwares e hardwares criados e instalados pela Enalta em tratores, colheitadeiras, plantadeiras e equipamentos de irrigação ajudam usinas de álcool e açúcar a controlar melhor o processo de produção. Foi com a ajuda da Embrapa que o engenheiro Cléber Manzoni, 38 anos, transferiu seu negócio de Catanduva para São Carlos, ambas no interior de São Paulo. "Acertamos a rota depois de patinar dois anos", afirma Manzoni. "Até 2006 tínhamos apenas 15 clientes. Hoje passam de 70 e já exportamos para o Sudão e a Colômbia"
Fundação: 1999
Sede: São Carlos (SP)
Por que é inovadora: o monitoramento realizado pela Enalta aumenta em até 50% a produtividade de máquinas na lavoura
Aportes: linhas de fomento da Finep, da Fapesp e do CNPq e aporte do fundo de capital semente Criatec
Funcionários: 47
Faturamento 2010 (projetado): R$ 4,6 milhões
> VÍQUA
O que faz: o funcionário da Tigre Daniel Alberto Cardoso colecionava ideias não utilizadas pela empresa. Até que resolveu abrir seu próprio negócio para aproveitá-las. Hoje, quem toca a Víqua é seu filho, Daniel Alberto Cardoso Júnior, 32 anos. "Temos mais de cem lançamentos anualmente", diz. A empresa conta com um comitê para aprovar sugestões dos empregados e criou um banco de dados com um acervo de 300 novas ideias de produtos
Fundação: 1995
Sede: Joinville (SC)
Por que é inovadora: 90% dos produtos hidráulicos que já lançou foram novidades
Aportes: são investidos R$ 1,5 milhão por ano em projetos de inovação, com recursos próprios e com subvenção do BNDES
Funcionários: 450
Faturamento: não divulgado