O prédio do departamento de genética e evolução da Universidade Estadual de Campinas, Unicamp, a 90 quilômetros de São Paulo, tornou-se pequeno para o trabalho do agrônomo baiano Gonçalo Guimarães Pereira. Aos 36 anos, ele comanda uma equipe de 35 pesquisadores que se divide entre 20 projetos nas áreas de ecologia molecular, genoma e biotecnologia. O espaço atual, no entanto, já não comporta o ritmo das idéias de Pereira. Amparado pelos 4 milhões de reais de verbas para seus projetos e pelos resultados promissores obtidos até agora, o departamento vai receber da diretoria da Unicamp um prédio com laboratórios maiores, a ser construído na própria faculdade. "É o resultado de três anos de trabalho", diz Pereira. Entre os projetos do agrônomo que justificam a expansão está o uso da genética para criar uma nova técnica de fermentação do álcool capaz de aumentar a produtividade das usinas de cana-de-açúcar e dos fabricantes de bebidas alcoólicas não destiladas. Hoje, no final do processo tradicional de fermentação, os usineiros precisam usar grandes centrífugas para separar o álcool da levedura, um fungo empregado na preparação de bebidas fermentadas. As centrífugas podem representar 40% do custo de montagem de uma usina. Com a técnica de Pereira, esse tipo de equipamento é eliminado. O segredo está na modificação de um gene da levedura para evitar que, ao final do processo, os fungos fiquem boiando em meio à bebida. Com a alteração genética, quando toda a glicose do processo é consumida, as leveduras se agrupam por si e formam uma malha. Com o peso, decantam e descem para o fundo do recipiente. "Essa tecnologia também funciona na fermentação do vinho e é provável que seja usada para a cerveja", afirma Pereira.
Mercado - Ao tomar conhecimento da tecnologia, a recém-criada empresa paulista Genesearch, de fomento a projetos de biotecnologia, aceitou financiar parte do projeto em troca do direito de levar a levedura inteligente para o mercado. "O potencial comercial dessa descoberta é enorme", diz Marcelo Camargo, diretor da Genesearch, que investe em outros seis projetos, todos na área de genética. "A maior vantagem dessa levedura está no aumento da produtividade e na redução de custo de uma usina", afirma José Pessoa, dono de seis usinas em quatro Estados brasileiros.
Em 1997, no seu primeiro ano como professor da Unicamp, Pereira participou do seqüenciamento genético da bactéria causadora da praga do amarelinho nos laranjais, a Xylella fastidiosa. Em meio ao trabalho, Pereira percebeu o quanto a engenharia genética e a biotecnologia poderiam ajudar as indústrias a encontrar solução para seus problemas. "Na genética, o céu é o limite", diz o agrônomo. Neste momento, a maior parte da atenção de Pereira está voltada para o seqüenciamento do DNA do fungo Crinipellis perniciosa, que ataca as plantações de cacau e causa a doença conhecida como vassoura-de-bruxa. A pesquisa custará 2,3 milhões de reais ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, CNPq, e ao governo da Bahia, além dos incentivos indiretos da Unicamp, da Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo, Fapesp, e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Embrapa.
Ao contrário do que ocorreu com a pesquisa da Xylella, Pereira não quer esperar o fim dos trabalhos para começar a encontrar aplicações práticas do estudo. À medida que os pares de genes são seqüenciados, o laboratório de bioinformática vai fazendo a análise de genes mais importantes. Com cinco meses de pesquisa, 50 pessoas e nove laboratórios envolvidos no projeto, os primeiros resultados da análise do gene do fungo começaram a aparecer. Um deles mostra a existência de uma enzima, a cutinase, que ataca a superfície do cacau. "Se você já conhece a proteína, basta criar um remédio que a destrua", explica Pereira. Até agora, apenas 10% do genoma do fungo foi seqüenciado. "No máximo em dois anos pretendo ter soluções para o problema da vassoura-de-bruxa", diz.
Um dos maiores interessados no sucesso do novo projeto de Pereira é o governo da Bahia. Pressionado pela baixa no mercado internacional e pelos constantes ataques da vassoura-de-bruxa às plantações, o cacau, principal produto vendido ao exterior pela Bahia até meados da década passada, caiu para o quinto posto na pauta das exportações. "Uma solução para esse problema pode trazer de volta a rentabilidade do setor", afirma Armando Avena, professor de economia da Universidade Federal da Bahia. "É a salvação da lavoura."
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Forbes Brasil