A maior parte dos leitores deste artigo é suficientemente afortunada para ter empregos relativamente qualificados; eles provavelmente também freqüentaram a universidade. Se o fizeram, possivelmente prosperaram financeiramente durante a década passada. Em 1979, o homem americano médio, com diploma universitário, ganhou 49% mais do que o formado apenas no segundo grau; em 1993, a diferença havia aumentado para 89%. Os 10% de americanos homens mais mal remunerados tiveram uma queda em seus salários reais de quase 20%, desde 1980; os 10% mais bem pagos desfrutaram de um aumento salarial real em torno dos l0% (ver gráfico). E durante os últimos 20 anos, o salário médio dos principais executivos aumentou, de 35 vezes a mais que o do trabalhador médio da linha de produção, para 120 vezes. A desigualdade salarial nos EUA inegavelmente cresceu. E muitos culpam a TI (tecnologia da informação) e a globalização por isso.
Em outros países também, principalmente na Austrália, Grã-Bretanha e Nova Zelândia, a diferença de renda entre os trabalhadores mais instruídos e mais qualificados e os demais se ampliou desde o começo da década de 80. Na maior parte da Europa Continental, porém, continuou praticamente a mesma; na verdade, na Alemanha ela diminuiu. Os altos salários mínimos, os poderosos sindicatos de trabalhadores, a negociação salarial centralizada e os generosos benefícios da seguridade social estabeleceram um piso para salários em todo o continente. Em contrapartida, ao mesmo tempo em que a procura por trabalhadores não qualificados diminuiu, o desemprego se elevou mais acentuadamente do que em países onde os diferenciais de salário se ampliaram e sofreram pressões (ver o gráfico). Na Europa, a porcentagem de homens em idade produtiva que não estão trabalhando mais do que dobrou nas duas últimas décadas, para cerca de 30%, enquanto nos Estados Unidos essa porcentagem permaneceu praticamente inalterada, em 18%.
A procura por trabalhadores braçais caiu claramente em toda parte, em relação à procura por trabalhadores instruídos. No entanto, os economistas não estão de acordo se isso se deve à nova tecnologia ou à crescente competição, decorrente dos fabricantes que operam em países em desenvolvimento, com salários baixos. Essa divisão tende a acompanhar linhas geográficas: muitos economistas europeus afirmam que o comércio é o principal culpado por esse aumento nas diferenças salariais, enquanto os americanos culpam principalmente a tecnologia. Uma torrente de estudos explorando a ligação entre comércio e salários não conseguiu resolver essa controvérsia.
As importações americanas de produtos rnanufaturados de países em desenvolvimento aumentaram de 14%, em 1970, para mais de um terço de todas as importações manufaturadas, hoje. Isso é citado como uma comprovação de que a concorrência por parte dos produtores de países com baixos salários está empurrando para baixo os salários de trabalhadores americanos não-qualificados. De fato, uma diferença mais ampla entre o salário de trabalhadores com baixa e alta qualificação é exatamente o que a teoria internacional do comércio previa que poderia acontecer.
De acordo com o teorema de Stolper-Samuelson (proposto por Paul Samuelson e Wolfgang Stolper, em 1941), o comércio internacional vai reduzir a renda do fator de produção usado de uma forma relativamente intensa em produtos importados e aumentar a renda do fator usado intensivamente em exportações. Se um país como os EUA, onde o trabalho qualificado é relativamente abundante, aumenta seu comércio com um país como a Índia, onde esse trabalho é relativamente escasso (mas o trabalho não-qualificado é abundante), então o país com abundância de trabalhadores qualificados vai exportar produtos que utilizem esse trabalho qualificado e importar produtos que utilizem o trabalho não-qualificado. Dessa forma, enquanto os EUA transformam sua produção de indústrias que ,exigem baixa qualificação para outras que exigem elevada qualificação, a demanda por trabalhadores não-qualificados e, em conseqüência, os seus salários, vão cair em relação aos de seus colegas mais gabaritados.
Eliminar O Impossível
Adrian Wood, um economista da Sussex University, da Grã-Gretanha, admite que o comércio com os países em desenvolvimento é, na verdade, o principal suspeito pelo aumento da desigualdade. Ele calcula que isso reduziu em mais de um quinto a procura por trabalhadores de baixa qualificação nas economias mais ricas. Como evidência, Wood cita os números, mostrando que, entre 1970 e 1990, esses países que apresentaram os maiores aumentos em importações de manufaturas de países em desenvolvimento também sofreram a queda mais acentuada na participação da indústria no total de empregos.
No entanto, estudos feitos por vários economistas americanos argumentam que o impacto do comércio sobre os salários foi pequeno, representando um declínio na procura por trabalhadores não-qualificados de não mais de uns poucos pontos percentuais. Eles baseiam essa conclusão principalmente no fato de as importações de países em desenvolvimento desempenharem um papel relativamente pequeno nas economias dos países ricos (são equivalentes a menos de 5% do PIB nos Estados Unidos e na Alemanha), e os empregos menos qualificados estão nos setores não-comerciais, sob a proteção da concorrência internacional.
Sherlock Holmes acreditava que a forma de solucionar um crime era "eliminar o impossível, portanto, o que sobrar deve ser a verdade." Muitos economistas têm usado a mesma técnica para explicar a desigualdade salarial: se o comércio parece ser inocente, então a tecnologia é considerada culpada por omissão. Existem poucas evidências diretas, porque a tecnologia é muito difícil de ser mensurada, mas economistas entrevistados para uma pesquisa durante uma conferência do Federal Reserve de Nova York, no ano passado, concordaram, com uma margem de diferença de quatro para um, que a tecnologia era mais importante do que o comércio para explicar o aumento na desigualdade salarial. Outros discordam. Como por exemplo Jeffrey Sachs, da Harvard University, para quem o comércio e a tecnologia são provavelmente de importância quase igual.
Existem três formas pelas quais a TI poderia estimular a procura por trabalhadores gabaritados em relação aos menos qualificados. Em primeiro lugar, novas máquinas executam as tarefas anteriormente feitas por trabalhadores não-qualificados; em segundo, o mais instruído tende a se adaptar com maior facilidade à mudança tecnológica; e em terceiro, os computadores aumentam a produtividade de trabalhadores altamente qualificados, que têm mais condições de usá-los. Um trabalhador com instrução universitária tem duas vezes mais probabilidade de utilizar um computador do que um formado no segundo grau.
No entanto, de um ponto de vista político, na realidade não importa se o comércio ou a nova tecnologia devem receber a culpa pelo aumento das desigualdades, uma vez que tanto as barreiras protecionistas quanto um neo-ludismo destruidor de máquinas seriam igualmente soluções inadequadas. Tarifas sobre importações poderiam ajudar a preservar empregos e elevar salários em setores de baixa qualificação, mas apenas às custas tanto dos consumidores quanto dos empregos mais bem remunerados, em setores de elevada qualificação. Fazer a tecnologia parar é provavelmente impossível; e se não for, isso simplesmente empobreceria, e não enriqueceria as pessoas.
Aprender, Aprender
Será que os governos deveriam se preocupar com o aumento da desigualdade? Os números da desigualdade precisam ser julgados em conjunto com os dados sobre a mobilidade da renda; e estes mostram que não existe uma divisão fixa entre os que têm e os que não têm. Um estudo feito pelo Federal Reserve Bank de Dallas descobriu que cerca de 95% dos domicílios americanos que em 1975 estavam entre os 20% mais pobres haviam melhorado sua situação, em 1991; destes, 29% haviam conseguido alcançar os 20% mais bem-remunerados. (No entanto, existem evidências de que a mobilidade pode ter diminuído de certa forma nos últimos anos.)
Além disso, a elevação na desigualdade de renda nos EUA não está refletida na elevação da desigualdade de consumo (ver gráfico). Desde 1985, a desigualdade no consumo tem permanecido quase estática. A explicação pode estar nos dados sobre a mobilidade; muitos dos trabalhadores mais mal-remunerados têm condições de defender temporariamente seu nível de consumo recorrendo às poupanças ou tornando empréstimos, na esperança e na expectativa de que sua sorte venha a melhorar.
Não obstante, muitos trabalhadores de baixos salários nos EUA e na Grã-Bretanha realmente sofreram na última década e parece que não terão melhores chances no futuro próximo. Se os governos querem minorar uma situação em que as pessoas qualificadas e escolarizadas prosperam em função da TI e do comércio externo, mas os não-qualificados e de pouca escolarização ficam para trás, eles terão de combinar flexibilidade de salários com outras medidas, para evitar que os trabalhadores fiquem presos na armadilha dos empregos de baixo salário. A única solução de longo prazo é garantir que a força de trabalho seja melhor equipada com educação e qualificação.
Teoricamente, diferenças mais amplas de salários deveriam tornar a educação e o treinamento mais atraentes aos indivíduos e, portanto, aumentar a quantidade de trabalhadores 'qualificados e reduzir a diferença. Mas a melhoria em educação básica poderia levar uma geração inteira para aparecer no mercado de trabalho. E embora a maioria dos "experts" concorde que a educação precisa ficar mais flexível, com freqüentes "retreinamentos" durante a vida de um indivíduo, eles também concordam principalmente que os esquemas de retreinamento não são muito úteis para os trabalhadores mais velhos e de baixa qualificação.
Enquanto isso, a melhor política é os governos permitirem que os salários sejam livremente determinados no mercado de trabalho, enquanto oferecem algum apoio aos de baixo salário, semelhante ao crédito de imposto sobre renda no,, EUA, uma espécie de imposto de renda negativo atrelado ao salário. Isto aumenta o incentivo para se aceitar um emprego sem distorcer o mercado de trabalho da forma provocada pelos salários mínimos. Na última década, os EUA permitiram que seu salário mínimo caísse em termos reais para 34% do salário médio (embora estejam em vias aumentá-lo). Na França, ao contrário, o salário mínimo está perto de 60% do médio.
Nem todos estão convencidos de que a compressão do pagamento através de salários mínimos ou pela de negociação centralizada de salários reduza a oportunidade de trabalho para trabalhadores de baixa qualificação. Um artigo no relatório Perspectiva de Emprego em 1996, da OCDE, publicado em julho, concluiu experimentalmente que o emprego para trabalhadores não-qualificados não parecia ser muito mais baixo, ou o desemprego mais alto, nos países onde a desigualdade de salários era relativamente baixa. Alguns comentaristas saudaram esse fato como prova clara de que um mercado de trabalho flexível não era necessário para reduzir o desemprego.
Entretanto, o estudo da OCDE simplesmente examinou correlações brutas entre o nível de desigualdade de renda e o nível de desemprego. Isso não é um teste apropriado de uma barganha entre empregos e igualdade, porque os, níveis de emprego são afetados por muitos outros fatores, tais como padrões de escolaridade e treinamento. Estes variam entre países e, assim, ninguém esperaria uma perfeita correlação entre desemprego e desigualdade. Um teste melhor do valor de mercados de trabalho flexíveis é como eles respondem a mudanças com o passar do tempo na demanda por, diferentes tipos de trabalho, como resultado de nova tecnologia, por exemplo. E nesse teste, países que permitiram que os salários relativos de trabalhadores não-qualificados caíssem, apresentaram menor aumento de desemprego, embora também neste caso a relação esteja longe de ser perfeita (ver gráfico) Talvez a melhor conclusão seja a de que a flexibilidade do salário seja uma condição necessária, porém insuficiente para se ter menor desemprego.
Ao Vencedor, Tudo
Além das crescentes diferenças salariais entre trabalhadores qualificados e não-qualificados, as diferenças de salários crescem também dentro de certas ocupações. Entre os operadores de títulos ou diretores executivos, por exemplo, pequenas diferenças em habilidade podem levar a astronômicas diferenças em pagamentos. O salário dos operadores ou diretores executivos de melhor renda parece desproporcional em relação ao do operador médio.
Pacotes desproporcionais de pagamentos há muito são familiares no mundo dos esportes e entretenimentos. Em 1981, Sherwin Rosen, economista da Universidade de Chicago, escreveu um estudo clássico, "A Economia dos Superstars", no qual ele explicou por que, em setores como esporte e cinema, algumas estrelas amealhavam grandes somas, enquanto os coadjuvantes ficavam bem atrás. Mais recentemente, dois economistas americanos, Robert Frank e Phillip Cook, popularizaram este argumento no livro "The Winner-Take-Society" (A Sociedade Onde o Vencedor Leva Tudo), publicado pela Free Press. Eles dizem que em parte devido à globalização da TI, o padrão de "o vencedor leva tudo" está se espalhando para cada vez mais profissões, como advogados, médicos, banqueiros, acadêmicos e diretores executivos.
Em tais empregos, os mercados pagam aos indivíduos não de acordo com seus desempenhos absolutos, mas de seu desempenho em relação ao dos outros. Enquanto a renda de um limpador de janelas depende de quantas janelas ele limpa, o salário de um operador de investimentos depende da classificação de seu desempenho. Um limpador de janelas um pouco mais talentoso fará apenas uma pequena diferença no estado das janelas do cliente, mas nos mercados de vendas de títulos ou onde a vida das pessoas está em jogo, essa pequena margem significa tudo. As compensações no topo são, portanto, desproporcionalmente altas.
O que mudou foi que a nova tecnologia e a globalização expandiram o mercado de qualificações de local para global, aumentando as oportunidades para os ricos ficarem ainda mais ricos. O evento esportivo, que antes podia ser assistido apenas por aqueles fisicamente presentes, agora pode ser acompanhado em telas em todo o mundo. O mais recente concerto de rock ou filme de horror rapidamente fica disponível a uma audiência mundial, e um enorme aumento da demanda pode ser satisfeito a um custo pequeno, uma vez que o custo marginal para produzir um CD ou vídeo extra é mínimo. Igualmente, o maior cirurgião cardíaco pode agora prestar assistência no diagnóstico e tratamento de pacientes a milhares de quilômetros de distância, através de redes de transmissão de dados em alta velocidade.
Em um mercado normal, essas fantásticas rendas de grandes estrelas atrairiam mais pretendentes ao setor onde estão em oferta, o que tenderia a trazer de volta os salários para níveis menos exóticos. Mas em mercados onde o vencedor-leva-tudo, este mecanismo de ajuste não consegue funcionar de forma adequada. Um banco de investimentos quer o melhor analista e operadores. O segundo melhor não serve. E o banco pode pagar por isso.
Colher Conhecimentos
Então o que poderá acontecer aos salários relativos no futuro? A transformação tecnológica nem sempre favorece aqueles com a melhor qualificação. No início do século XIX, justamente os artesãos qualificados foram substituídos pelas máquinas. Paul Krugman especula se (eis aí um grande se) a inteligência artificial cumprir sua promessa, os computadores poderiam, no futuro, substituir mais facilmente o trabalho de rotina dos advogados e contadores do que o dos jardineiros, faxineiros, e outras atividades, cujas tarefas são mais difíceis de programar em computadores. Os computadores se provaram melhores para resolver complexos problemas de matemática do que para desempenhar tarefas mais comuns, como empilhar tijolos de brinquedo para formar uma torre.
Advogados e contadores, sugere Krugman, poderiam ser as modernas réplicas dos tecelões, cujos salários subiram vertiginosamente depois que a máquina de fiar foi mecanizada, e depois caíram na mesma proporção quando novas máquinas imitaram a habilidade deles. É uma visão interessante, mas improvável. Na medida em que as economias se tornam cada vez mais baseadas no conhecimento os mais escolarizados desfrutarão de uma vantagem cada vez maior. Tudo indica que colher conhecimentos sempre pagará mais do que colher repolhos.
(*) "Comércio Norte-Sul, Empregos e Desigualdade," de Adrian Wood. Clarendon Press, Oxford, 1994.
(**)(Do termo Luddites, que eram grupos de trabalhadores industriais ingleses que, no final do século 19 defendiam a destruição das máquinas que, segundo eles, lhes roubava empregos)
OS LUCROS DO DESTINO
"Nada contribui tanto para prosperidade e felicidade de um país quantos os lucros altos," proclamou David Ricardo, um economista do começo do século XIX. Poucos trabalhadores concordaram com isso. Os lucros nos Estados Unidos e Grã-Bretanha estão em sua maior alta em 20 anos, mas os trabalhadores se sentem mais inseguros do que nunca. Tais lucros, eles dizem, estão se elevando às custa dos salários. A maior parte da renda extra gerada pela TI e pela globalização está indo direto para donos do capital: os trabalhadores não estão recebendo sua justa parcela.
É verdade que durante os últimos três anos os lucros das empresas americanas se elevaram numa média anual de 13%, enquanto os salários aumentaram míseros 3% ao ano. A participação dos lucros empresariais na renda nacional duplicou durante a última década, tanto nos EUA quanto na Grã Bretanha, enquanto a participação do trabalho caiu. Em outros países, também, os lucros aumentaram drasticamente nos últimos anos. Os meios de comunicação criticaram severamente os gananciosos patrões capitalistas por pagar a si mesmos e aos seus acionistas imensas gratificações. Até mesmo os admiradores dos ganhos em produtividade a serem obtidos a partir da nova tecnologia e da desregulamentação estão fazendo uma pausa para reflexão. Por exemplo, Stephen Roach, principal economista no Morgan Stanley, um banco americano de investimentos, está agora manifestando sua preocupação com o fato de os trabalhadores não estarem participando dos ganhos.
É normal que a porção de lucros se eleve durante uma expansão de 'investimentos liderada pela tecnologia. É igualmente normal que tais lucros extras venham a ser eliminados, como conseqüência da criação de novos empregos por novas empresas. No começo ao século XIX, os donos do capital colheram a maior parte dos ganhos imediatos da revolução industrial, mas durante um certo período de tempo uma parcela da renda do trabalho se recuperou.
No entanto, apesar de tudo o que se diz a respeito de um deslocamento muito importante na renda, do trabalho para o capital, e apesar dos precedentes históricos para uma mudança no atual estágio do ciclo de tecnologia, isso na realidade não aconteceu. Deve-se levar em consideração as estatísticas que parecem mostrar que as empresas não conseguiram elevar os salários reais de acordo com a produtividade. Desde 1975, a produção por homem/hora no setor não-financeiro dos EUA aumentou em cerca de 40%, enquanto a compensação real horária (salário, mais pensão e benefícios médicos deflacionados pelo índice de preços ao consumidor) elevou-se em menos de 5%.
Isso parece sugerir que os trabalhadores tenham sofrido uma enorme injustiça. No entanto, o salário deflacionado pelo índice de preços ao consumidor está em uma medida inadequada para avaliar se as empresas estão dando aos trabalhadores uma "justa" parcela dos ganhos em produtividade. O que realmente importa é como os salários se comportaram em relação ao valor da produção dos trabalhadores. O deflator correto de preços para isso são os preços da produção das empresas. A parte de cima do gráfico, baseado em números calculados pelo Bank Credit Analyst, um grupo de pesquisas do Canadá, mostra que, se os salários forem deflacionados pelos preços do produtor, então os salários reais durante as duas últimas décadas se elevaram na mesma medida da produtividade. As empresas enfim, não estão "pagando mal" aos trabalhadores. Os dois índices de preços divergem principalmente porque os preços de muitos bens de capital têm caído em relação aos preços de bens e serviços que os trabalhadores consomem.
Do ponto de vista dos trabalhadores, essa explicação traz muito pouco ânimo: o que importa para eles é sua real capacidade de compra. Mas como existe uma boa razão para se acreditar que a inflação dos preços ao consumidor está cada vez mais sendo exagerada, o salário líquido real, corretamente medido, provavelmente está crescendo muito mais rapidamente do que sugerem os números oficiais.
Da mesma forma, a aparente alta repentina na parcela de lucros na renda nacional precisa ser colocada em perspectiva. Jill Jacobs, economista no Goldman Sachs, um banco americano de investimentos calcula que os lucros empresariais nos EUA subiram de 4,8% da renda nacional, em 1982, para 8,4%, no ano passado. No entanto, isso aconteceu depois de um período em que os lucros foram atacados ferozmente pela inflação e pelos poderosos sindicatos de trabalhadores. Em comparação com a década de 60, diz Jacobs, a parcela dos lucros ainda está baixa. Na verdade, ela continua mais baixa do que em todos os anos, menos um, durante o período de 1940 a 1970, quando os lucros ficaram numa média de mais de 10% da renda nacional.
É preciso lembrar, também, que um número crescente de trabalhadores agora possui ações, seja diretamente, seja por intermédio dos fundos de pensão, que irão, mais cedo ou mais tarde, dar a eles uma fatia dos lucros. Cerca de 55 milhões de trabalhadores nos EUA possuem algum tipo de ações, 24 milhões a mais do que em 1970. Também em outros países, a antiga divisão entre "eles" e "nós" está ficando vaga.
GLOBALIZAÇÃO É IMPLACÁVEL COM AS DINASTIAS EMPRESARIAIS
Estes são tempos difíceis para as dinastias empresariais do Canadá. Uma após a outra, as famílias que dominaram durante anos - às vezes, durante gerações - grandes setores do comércio e da indústria do país lutam neste momento para se ajustar a um novo mundo implacável, em que o acesso ao capital e uma ágil administração são mais importantes do que orar na igreja certa ou praticar esqui no clube certo. Peter Newman, um jornalista mais conhecido como cronista do "establishment" empresarial, pode mencionar uma lista de cerca de uma dúzia de proeminentes famílias cuja influência desapareceu na última década passada.
O ano passado foi particularmente humilhante. A família Southam perdeu seus vínculos remanescentes com a cadeia de jornais que controlara durante; quatro gerações e que ainda tem seu nome. Conrad Black, um magnata local, presidente de um grupo internacional que opera na área editorial de jornais, adquiriu em maio o controle da Southarn, uma empresa notoriamente meio adormecida. Ele tratou de sacudi-la despedindo cinco diretores da era Southam do conselho de administração; vários executivos de alto escalão, "publishers" e diretores de redação também tiveram de sair.
Os Southam não estarão sozinhos quando desaparecerem no esquecimento. Os Bronfman de Toronto (primos da família no controle do grupo Seagram que opera nas áreas de bebidas e de entretenimento) entregaram o controle de seu vasto império a um grupo de administradores, chefiados por Jack Cockwell, um contador nascido na África do Sul. Há apenas cinco anos, os Bronfman estavam no topo de um conglomerado industrial e de serviços financeiros cujo patrimônio representa mais de 5% do valor das ações da Bolsa de Toronto. Mas os problemas financeiros os obrigaram a vender alguns de seus ativos mais famosos, como a John Labatt (cerveja e entretenimento), MacMillan Bloedel (produtos derivados de madeira), Trizec (imóveis) e Royal Trust (serviços financeiros).
Outras famílias continuam na direção, mas enfrentam grandes dificuldades. Os Molson, mais conhecidos por sua cerveja, desfizeram-se de uma deficitária companhia internacional de serviços de limpeza, no início do ano, e perderam o principal executivo de sua holding. A família Bata reduziu seu império calçadista internacional em um quinto, e reestruturaram algumas das subsidiárias deficitárias restantes. O grupo Bata também perdeu seis dos sete executivos contratados fora do conglomerado em 1994 e 1995 para melhorar sua competitividade. A maioria deles saiu por não tolerar a incessante interferência de Tom Bata, o patriarca de 82 anos.
Durante muitos anos, o capital familiar predominou, Os acionistas de fora, como os fundos de pensão, eram figuras passivas. Muitas empresas eram rigidamente controladas, perpetuando, os feudos familiares, em setores como emissoras, bebidas alcoólicas e, mais recentemente, televisão a cabo. Os membros do "establishment" (na grande maioria brancos, anglo-saxões e protestantes) se conheciam e se ajudavam entre si. Tudo isto agora mudou em grande parte.
Várias famílias fracassaram ao pretender passar o bastão de uma geração para outra. Velhos patriarcas dominadores tentaram permanecer no poder por um tempo excessivo; os jovens revelaram-se menos talentosos do que seus progenitores. As brigas quase acabaram desmembrando o império de alimentos congelados da família McCain, sediada em New Brunswick. Os Irving, outro rico clã de New Brunswick que construiu sua fortuna operando com petróleo e madeira, amargam uma escassez de talentos entre os netos do fundador, agora na maior parte entre os 30 e 40 anos de idade.
Outras famílias não dispõem do capital para associar-se a poderosos concorrentes muitos deles atraídos pela liberalização. Os Richardson de Winnipeg, que acumularam sua fortuna como comércio de trigo das planícies e os transportes, venderam uma grande corretora em agosto, depois que se deram contas de que não tinham atrás de si o prestígio dos bancos nacionais, os quais começaram a dominar o setor de valores mobiliários desde o fim das restrições à propriedade neste setor, há nove anos.
As dinastias que aparentemente têm maiores probabilidades de sobreviver tendem a ser aquelas em que o "pater famílias" quis trazer para o grupo acionistas de fora e entregar as rédeas dos negócios a administradores competentes. O segundo Lord Thompson, que prefere ser conhecido simplesmente como Keh Thompson, tem uma pequena função rotineira em seu enorme império que atua em áreas tão variadas quanto a editorial, viagens, lojas de departamentos e imóveis. Thomson mora em Toronto, mas o grupo editorial e de turismo que tem seu nome, mas a sede da administração fica em Stamford, Connecticut. Galen Weston também tem uma função pouco conhecida em seu próspero império que inclui supermercados e fábricas de papel e celulose.
Empresas que se separaram de suas dinastias fundadoras em geral passaram por um processo de rejuvenescimento, graças a uma nova administração, ou adquirindo mais capital externo. Quanto às famílias, em geral gozam de uma posição que lhes garantirá um confortável estilo de vida por muitos e muitos anos. As vítimas, segundo Newman, são as comunidades que dependiam dos empreendimentos familiares locais para seus empregos, amenidades culturais e deveres cívicos. Tais benefícios não costumam ser oferecidos com tanta freqüência pelos gigantes estrangeiros e pelos administradores locais do dinheiro, que agora expressam seus pontos de vista na maioria dos conselhos de direção canadenses.
Notícia
Gazeta Mercantil