Um fármaco desenvolvido por pesquisadores da Unesp para aliviar os sintomas da anemia falciforme une os benefícios da talidomida e do quimioterápico hidroxiureia, já usado no tratamento crônico da doença, sem apresentar os efeitos tóxicos das drogas originais.
A molécula, patenteada com o nome Lapdesf1, mostrou bons resultados em ensaios com camundongos na Unicamp. Os cientistas buscam agora parceria com a indústria farmacêutica para a realização de testes em humanos.
“A pesquisa representa um avanço para o tratamento da anemia falciforme, e ajudará a diminuir vários sintomas presentes nos pacientes, como dor e inflamação”, disse o pesquisador da Unesp de Araraquara Jean Leandro dos Santos, um dos idealizadores do novo medicamento.
Comum em afrodescendentes, a anemia falciforme é causada Glóbulo vermelho normal Glóbulo vermelho fluindo livremente no vaso sanguíneo Células doentes Células doentes bloqueando o fluxo sanguíneo Moléstia altera glóbulos vermelhos e dificulta circulação por uma alteração genética na hemoglobina, proteína presente nas hemácias, glóbulos vermelhos do sangue, que ajuda no transporte do oxigênio. A mutação faz com que as hemácias assumam a forma de foice. Em baixas tensões de oxigênio, as células tornam-se deformadas, rígidas e propensas a formar uma massa celular que dificulta a circulação sanguínea, distúrbio conhecido como vaso-oclusão. O processo pode causar inflamações crônicas, necroses e dor intensa, entre outros problemas.
A hidroxiureia é capaz de aumentar a produção de um outro tipo de hemoglobina, conhecida como hemoglobina fetal, que em altos níveis reduz o risco da obstrução dos vasos. Esse quimioterápico, porém, apresenta efeitos adversos, como náuseas, dores abdominais e de cabeça, além de diminuir a produção de células da medula óssea.
Já a talidomida, inicialmente usada como sedativo e antiemético (contra náuseas), foi retirada do mercado mundial nos anos 1960 depois de provocar malformações em recém-nascidos. Foi reintroduzida nos anos 1990 para tratamento de câncer, hanseníase, lúpus e aids.
“Nós aproveitamos da talidomida a subunidade responsável pelos efeitos anti-inflamatórios benéficos e acrescentamos à molécula o mecanismo de ação da hidroxiureia, relacionado à capacidade de doar óxido nítrico, mediador responsável pelo aumento da hemoglobina fetal”, disse Santos.
O desenho inicial da molécula foi realizado no mestrado de Santos, sob a orientação da professora Chung Man Chin, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da Unesp de Araraquara. Durante o doutorado, realizado com bolsa da Fapesp, o grupo aperfeiçoou a molécula.
Testes pré-clínicos
Depois que experimentos in vitro comprovaram o potencial terapêutico do Lapdesf1, o grupo da Unesp firmou parceria com os pesquisadores do Hemocentro da Unicamp para a realização de ensaios em camundongos modificados geneticamente, realizados pelas pesquisadoras Carolina Lanaro e Carla Penteado.
“Os ensaios foram feitos no laboratório da Georgia Regents University, nos Estados Unidos, pois os pesquisadores de lá tinham o modelo animal mais adequado para esse tipo de teste”, diz Carla.