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NOVAS TECNOLOGIAS DE SEPARAÇÃO PODEM IMPULSIONAR PRODUÇÃO DE GÁS NATURAL EM CAMPOS DO PRÉ-SAL (1 notícias)

Publicado em 25 de junho de 2016

Enquanto a indústria caminha ainda sobre incertezas do futuro, o pré-sal segue impulsionando a inovação tecnológica no Brasil e traz novos horizontes em meio à crise. A produção de gás natural na região, ainda limitada pelas dificuldades de escoamento, está hoje no foco do mercado e estimula o desenvolvimento de técnicas que permitam o aproveitamento das reservas – sem a logística necessária, atualmente cerca de 35 milhões de m³ de gás são reinjetados por dia nos poços do pré-sal. O aprimoramento dessas operações, que podem render ao país os primeiros passos de autossuficiência no mercado interno de gás natural, vem sendo estudado pelo Research Center for Gas Innovation (RCGI), instituto criado em parceria da FAPESP com a britânica BG, em funcionamento desde janeiro no campus da Universidade de São Paulo (USP). Com programas de pesquisas voltados a diversos segmentos e quase R$ 60 milhões em recursos, o centro tem como principal foco a expansão do mercado de gás natural no Brasil e avança na criação de novas tecnologias que permitam o aumento da produção do insumo nos campos do pré-sal. De acordo com o coordenador do RCGI, Júlio Meneghini, o instituto desenvolve hoje técnicas com síntese de membranas e bocais supersônicos para a separação do gás, que enfrenta dificuldades na região devido ao alto teor de gás carbônico (CO2) associado.  A expectativa é de que os primeiros protótipos das tecnologias sejam concluídos já no ano que vem. “A separação é um ponto crucial para o desenvolvimento do pré-sal e a expansão do mercado de gás natural. Se estivéssemos aproveitando e utilizando as reservas, não precisaríamos importar gás da Bolívia.”

 

Qual vem sendo o principal foco do centro desde que iniciou suas operações, em janeiro?

 

Nós temos três grandes programas: um é de engenharia, com 10 projetos, um de físico-química, também com 10 projetos, e outro de política energética e economia, que conta com oito projetos. Nós estamos situados em uma linha da FAPESP que vem sendo chamada de CPE – Centro de Pesquisa e Engenharia –. O mais importante para a pesquisa é ter visão de longo prazo, então o investimento inicial para esses projetos é de cinco anos, podendo renovar por mais seis.

 

Como é feito esse investimento?

 

É feito entre a FAPESP e a empresa. Ela faz o convênio inicial, e depois pode aprovar um novo orçamento para estender por mais seis anos, totalizando 11 anos no projeto. O centro tem como objetivo principal trabalhar em diferentes áreas. Já estamos olhando novos projetos, que abrangem o uso do gás natural e biogás para produção de energia, assim como a transformação do gás em produtos voltados à indústria, como para o setor petroquímico. O gás tem papel fundamental na transição para uma economia sustentável, sendo o mais limpo dos combustíveis fósseis, com baixa emissão de poluentes.

 

Que projetos estão sendo desenvolvidos nessas linhas principais?

 

Em engenharia, nós temos um laboratório avançado de diagnóstico de combustão, que vem sendo usado para três projetos dessa área. Uma das questões é o enriquecimento da mistura para motores com oxigênio para substituir poluentes. Também temos um projeto envolvendo o que podemos chamar de “navio verde”, que pode usar gás natural como combustível alternativo. Temos também os navios híbridos, com motor de combustão que gera eletricidade e tem propulsão usando motor elétrico, essencialmente. Além disso, temos a modelagem numérica, que será usada para fazer simulações visando dar suporte a outros projetos. E também desenvolvemos um projeto para mitigar as emissões de metano em vazamentos fugitivos.

 

Em físico-química, temos projetos que envolvem a transformação do gás natural utilizando rotas químicas, assim como gás natural em outros produtos usando rotas biológicas. Estamos desenvolvendo a utilização de CO2 (gás carbônico) na produção de metanol, e também o uso de biogás para criação de outros bioprodutos. Além disso, temos um projeto que estuda a separação do CH4 (metano) e do CO2, o que é um problema sério no pré-sal. Separar isso é um ponto crucial para o desenvolvimento do pré-sal e a expansão do mercado de gás natural.

 

Em política energética e economia, temos uma série de projetos para aumentar a penetração do gás natural na matriz energética brasileira. Atualmente, 35 milhões de m³ por dia estão sendo reinjetados no pré-sal. Isso é um pouco mais do que importamos da Bolívia. Estamos reinjetando no poço porque não temos a logística desenvolvida.

 

Em que estágio estão esses projetos de pesquisa?

 

Os projetos ainda estão no início, porque começamos a operar há quatro meses. Mas alguns já estão surtindo efeito. Na questão das células a combustível, por exemplo, estamos avançados porque não é um trabalho só da Poli, mas também do IPEN – Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares -, portanto contamos com a experiência pregressa deles.

 

O centro está aberto ao investimento de outras empresas?

 

Sim, está aberto a outras empresas. Os fundadores são FAPESP e BG, mas já temos participantes e eventualmente outras empresas irão patrocinar pesquisas. Hoje temos propostas em negociação com a Comgás, a Vale e a Raízen.

 

As negociações já estão avançadas?

 

Todas as três estão em estágio avançado. O objetivo do centro é ter os laboratórios mais modernos na parte de óleo e gás, combustíveis e processos químicos. A FAPESP está patrocinando com cerca de R$ 28 milhões em equipamentos, e a BG com R$ 29,5 milhões. Em recursos financeiros, temos um total de R$ 60 milhões. A USP soma indiretamente a esse valor, com R$ 40 milhões em pessoal, instalações, gestor em tempo integral e técnicos.

 

Esses novos projetos devem ser fechados até o final do ano?

 

Eu acredito que sim, um ou outro deve ser fechado.

 

Quais são hoje os principais desafios para o crescimento do mercado de gás natural no Brasil?

 

A primeira coisa é o problema tecnológico seríssimo. Estamos com uma produção muito grande no pré-sal, mas o gás vem associado a petróleo, água e CO2. O conteúdo de CO2 é elevado, então temos que desenvolver novas técnicas de separação. Nosso centro está focado exatamente nesse problema, e estamos desenvolvendo uma solução para separar os dois. O segundo ponto de que estamos tratando é a logística. Temos o laboratório de prova de tanque numérico, tanto para a parte de fazer a concepção de plataformas, que eventualmente têm uma planta de liquefação junto, quanto a tecnologia para navios que façam transporte de metano, os “metaneiros”. O objetivo é fazer com que esse gás chegue à região consumidora, que hoje é o Sudeste, essencialmente.

 

Qual é a solução que vem sendo desenvolvida para a separação de gás do pré-sal?

 

O gás natural que vem do pré-sal varia entre 20% a 50% de CO2 na sua mistura, o que é uma quantidade enorme. Então nós temos um estudo que trabalha com membranas, material cerâmico, que é uma das formas de fazer separação e pode ser muito vantajoso. E temos também outro estudo recente que são os bocais supersônicos. Isso é uma técnica nova: você tem um bocal, então acelera o fluido a uma condição supersônica e consegue separar o gás carbônico do metano.

 

Quando esse estudo deve ser concluído?

 

Acredito que no ano que vem já tenhamos um resultado que nos permita ter a unidade piloto de separador, tanto o cerâmico quanto o bocal supersônico. Esperamos que até meados de 2017 tenhamos um piloto funcionando para podermos otimizá-lo.

 

Embora tenham causado ânimo quando foram descobertas, as reservas de gás do pré-sal vinham perdendo sua atratividade nos últimos tempos devido ao alto custo tecnológico. Como o senhor avalia o potencial para produção de gás na região?

 

Eu vejo um enorme potencial, porque, se estivéssemos aproveitando e utilizando as reservas, não precisaríamos importar gás natural da Bolívia. O volume que temos agora é grande, mas com as próximas unidades do pré-sal tende a aumentar mais ainda. Eventualmente isso poderá levar o Brasil a suprir todo seu mercado interno e exportar gás natural.

 

Como avalia os impactos que o plano de desinvestimentos da Petrobrás pode ter sobre esse mercado?

 

Isso é difícil falar. Independentemente de a Petrobrás sair, sempre existe outros players que acabam entrando e desenvolvendo projetos. Existe já a parceria público-privada (PPP) para o Rota 4, por exemplo, gasoduto submarino ligando o pré-sal ao estado de São Paulo. Esse projeto transportaria 15 milhões de m³ por dia.