Se for bem-sucedido um projeto do Instituto de Química da USP em São Carlos, a cachaça brasileira terá pedigree, ou denominação de origem, à semelhança do que já ocorre com o vinho, o conhaque e o uísque. Equipe do Laboratório de Desenvolvimento de Química da Aguardente (LDQA), coordenada pelo professor Walter W. Franco, está coletando, até final de outubro, amostras de aguardentes produzidas num raio de 160 a 200 quilômetros em torno dos municípios de São Carlos e Araraquara, que no laboratório passarão por análises para identificar os principais componentes químicos. O projeto conta com parceria da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Unesp de Araraquara, colaboração das secretarias municipais de Ciência e Tecnologia e apoio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).
Walter Franco informa que a tipificação de uma bebida envolve aspectos do solo e do clima da região onde a matéria-prima é produzida, o processo de produção (fermentação, destilação e envelhecimento), sua composição química e propriedades organolépticas (que atuam sobre os sentidos, sensoriais). "A aguardente de cana, nossa bebida nacional, está em busca de suas origens, para que a sua tipificação possa ser efetuada com base em dados concretos e não subjetivos", diz Franco. Identificados os principais componentes nas amostras recolhidas na região delimitada, as características de cada produto serão associadas ao seu local de origem geográfica. "Assim, poderemos em princípio verificar a existência ou não de pequenas variações em sua composição que permitam diferenciar uma aguardente produzida em uma região das demais. Teríamos então a cachaça de qualidade produzida em regiões determinadas (CQPRD), por analogia com os vinhos franceses (vins de qualité produits dans des régions detenninées -VQPRD), ou com os vinhos italianos (Determinazione di origine controllata, D'oc). Teríamos a cachaça D'oc."
Aos produtores seria oferecida chance de ter um produto analisado, sem ônus financeiro e de forma confidencial. "Caso detectadas eventuais imperfeições" tranqüiliza o professor, "os produtores receberão, se assim desejarem e em uma segunda fase, acompanhamento técnico gratuito para o aprimoramento de seu produto. Os recursos para tanto seriam pleiteados junto à Fapesp". Dependendo dos resultados do projeto piloto, a proposta poderá ser ampliada a todo o Estado de São Paulo e até a outros Estados, permitindo melhor definição da cachaça brasileira.
Walter Franco insiste em que as informações dos produtores de cana serão sempre de caráter confidencial e cada produtor só terá acesso aos resultados referentes ao seu produto.
O Laboratório de Desenvolvimento de Química da Aguardente existe no IQSC há oito anos.
Nesse tempo formou quatro doutores, cinco mestres e seus pesquisadores publicaram dezenas de artigos científicos em periódicos do exterior e nacionais.
VARIAÇÕES DE CAIPIRINHA
O Estado de São Paulo é o maior produtor de cachaça do Brasil, com aproximadamente um bilhão de litros/ano: os outros Estados entram com mais 500 milhões, sendo famosas muitas marcas do Nordeste e de Minas Gerais. A exportação do produto expandiu-se muito nos últimos dois anos, mas não chega ainda a 1% do total produzido. O maior exportador é Pernambuco.
Além de pura, a aguardente é consumida na forma de caipirinha, que pode ser a tradicional, com limão galego (taiti) e agitada no preparo, ou a ximboca, preparada com Iimão-cavalo e chacoalhada: ou ainda batida com frutas como abacaxi, coco, carambola.
O Engenho dos Erasmos, fundado pelo governador Martím Afonso de Souza que veio para o Brasil em 1532 - foi o primeiro do Brasil a produzir açúcar, rapadura e cachaça em grande escala. A indústria funcionou até o início do século 18. Construído em terreno de 43 mil metros quadrados no sopé de um morro entre as cidades de Santos e São Vicente e abandonado durante dois séculos, o engenho virou ruínas. Doado parcialmente (3.250m2) à Faculdade de Filosofia. Letras e Ciências Humanas da USP em 1958 e tombado em 1974 pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico. Artístico. Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat), pode ser transformado em parque turístico e centro de pesquisas.
Para outras Informações entrar em contato com Cláudia, e-mail: claudiasn@qsc.sc.usp.br. Ou pelos telefones (16) 273-9976 e 273-9970.
Notícia
Jornal da USP