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Jornal da Cidade (Bauru, SP) online

Necessidade motiva ação empreendedora (1 notícias)

Publicado em 11 de maio de 2008

Por Thiago Romero

 

Agência FAPESP – De cada cem brasileiros com idades entre 18 e 64 anos, cerca de 13 desenvolvem alguma atividade empreendedora, seja no comércio ou no setor de serviços. Isso faz com que o Brasil ocupe a nona posição entre os países com maior número de pessoas que abrem negócios. A principal motivação do fenômeno, no entanto, não é a inovação, mas a necessidade.

Os dados são da pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM) e foram divulgados na manhã desta quarta-feira (19/3) no Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec), na capital paulista, pelo Instituto Brasileiro de Qualidade e Produtividade (IBQP) e pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae Nacional). A pesquisa GEM no país tem apoio do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).

De acordo com o levantamento, que mediu o empreendedorismo em 42 países, a taxa de empresas em estágio inicial no Brasil, que engloba desde negócios em fase de implantação até os que têm 42 meses de mercado, subiu de 11,6%, em 2006, para 12,72% em 2007, totalizando cerca de 15 milhões de empreendimentos em atividade no último ano.

Nessa mesma categoria de empreendedores iniciais, os países que estão à frente do Brasil no ranking são: Tailândia (27%), Peru (26%), Colômbia (23%), Venezuela (20%), República Dominicana (17%), China (16%), Argentina (14%) e Chile (13%).

Esses resultados confirmam a vocação empreendedora dos brasileiros e representam um avanço no que diz respeito ao número de novos empresários nesses países. No entanto, há um preocupante paradoxo entre as duas motivações que levam à abertura de um novo negócio no Brasil: a oportunidade, quando os indivíduos realmente identificam um novo nicho de mercado, e a necessidade, relacionada à falta de opções de trabalho.

“Um trabalhador ambulante também é considerado um empreendedor. Ele compra sua mercadoria em outra empresa e a revende. Trata-se de uma atividade empresarial, precária, sem dúvida. Sua relação de parentesco é a de um primo pobre de outros empreendedores mais bem-sucedidos”, disse Marcelo Néri, chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que participou da elaboração dos dados da pesquisa.

“O empreendedorismo por necessidade está relacionado à pobreza e à sobrevivência dos indivíduos. Esse tipo de empreendedor também é um capitalista, muitas vezes sem capital ou que emprega todos os seus recursos em atividades de risco”, afirmou Néri. A pesquisa GEM mostra que, em 2007, 57% dos empreendedores iniciais tinham uma renda familiar de menos de três salários mínimos.

O estudo aponta um crescimento acentuado no Brasil, de 2001 a 2007, da atividade empreendedora motivada pela necessidade, fazendo com que o contingente de empresários que abriram novos negócios de oportunidade, com mais planejamento, organização e foco no mercado, caísse de 60% para 39% no período.

Em comparação com os 12,72% dos empreendimentos brasileiros em estágio inicial no ano passado, em países como Estados Unidos, Inglaterra e Japão, em que os novos negócios são abertos quase que em sua totalidade motivados pela oportunidade, essa taxa foi de 9,61%, 5,53% e 4,34%, respectivamente. Em média, para cada cidadão dos países desenvolvidos com algum negócio em fase inicial, existem mais de dois brasileiros realizando atividades na mesma fase.

“A grande diferença, no entanto, está nos recursos investidos para o início do negócio. Os brasileiros empreendem cerca de US$ 5,5 mil, um capital considerado limitado para o sucesso dos empreendimentos, enquanto a média mundial é de US$ 68,7 mil. Os empresários chineses e norte-americanos investem cerca de US$ 41 mil e US$ 67 mil, respectivamente”, apontou Paulo Alberto Bastos, pesquisador sênior do Instituto Brasileiro de Qualidade e Produtividade (IBQP).

“Além disso, 62% dos empreendedores brasileiros recorrem a familiares como fonte de recursos para compor o capital necessário para iniciar o negócio. Menos de 10% desses empreendedores se voltam a instituições financeiras em busca de crédito”, afirmou Bastos.

Mulheres lideram investimentos no Brasil

O levantamento revela que, pela primeira vez desde que a pesquisa GEM começou a ser feita no Brasil, em 2001, o nível de empreendedorismo entre as mulheres ultrapassou o dos homens: em 2007 as brasileiras representavam 52% dos empreendedores adultos, entre 18 e 64 anos, contra 29% em 2001.

De acordo com os pesquisadores que apresentaram o estudo em São Paulo, esses dados confirmam a tendência apresentada pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad 2006) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que indica que as mulheres buscam novos negócios para complementar a renda familiar e por estarem cada vez mais assumindo, nos últimos anos, o sustento do lar como chefe de família.

E a necessidade também é fator marcante de motivação para a mulher iniciar o empreendimento: em 2007, enquanto 38% dos homens empreenderam por necessidade, essa proporção aumenta para 63% entre as mulheres.

“O Brasil está observando uma revolução feminina em meio à pobreza nacional. Nas regiões Norte e Nordeste, por exemplo, apesar de serem minoria no mercado de trabalho, elas são as que mais se beneficiam com os programas de microcrédito ao pequeno empresário”, observou Marcelo Néri, da FGV.

O empreendedorismo feminino se destaca no comércio varejista, principalmente em artigos de vestuário e complementos (37%), na indústria de transformação, sobretudo na elaboração de produtos alimentícios e artefatos para viagem como malas e bolsas (27%), e na atividade de alojamento e revenda de alimentos (14%).

“Apesar do aumento observado nos últimos anos na taxa de sobrevivência das empresas brasileiras, hoje, dos cerca de 500 mil novos negócios abertos por ano no Brasil, cerca de 110 mil desaparecem nos dois primeiros anos”, disse o diretor técnico do Sebrae Nacional, Luiz Carlos Barboza.

“Os resultados da pesquisa GEM nos levam a reavaliar as ferramentas de apoio às micro e pequenas empresas do Sebrae, de modo a buscar mais eficiência no uso dos recursos a nós confiados pela sociedade, levando em conta questões importantes como a maior participação empreendedora das mulheres no mercado”, sinalizou.

Origem

Criado em 1999, o Global Entrepreneurship Monitor (GEM), coordenado pela London Business School (Inglaterra) e pelo Babson College (Estados Unidos), é um dos maiores estudos no mundo sobre a atividade empreendedora, cobrindo mais de 50 países consorciados, que representam 95% do PIB e dois terços da população mundial.

No Brasil, o GEM vem se consolidando desde 2000 como uma importante referência nacional para as iniciativas relacionadas ao tema. O projeto nacional é liderado pelo IBQP, em parceria com o Sebrae, a Federação das Indústrias do Estado do Paraná, Pontifícia Universidade Católica do Paraná e Centro Universitário Positivo.

Para a pesquisa brasileira de 2007 foram entrevistados dois mil indivíduos entre 18 e 64 anos, de todas as regiões brasileiras, selecionados por meio de amostra probabilística. O trabalho conta ainda com opiniões de 36 especialistas brasileiros. Entre os anos de 2000 e 2007 a pesquisa GEM entrevistou no país 17,9 mil indivíduos.

O estudo completo estará disponível em breve no site do IBQP, em www.ibqp.org.br.