Políticas de inovação foram discutidas em evento com apresentação de dados, avaliações e propostas de melhorias
Representantes de cinco diferentes instituições, todas com grande protagonismo nas políticas de financiamento da inovação no Brasil, reuniram-se com dirigentes da Universidade na última sexta-feira, 27 de outubro, na sala do Conselho Universitário (Co) para apresentar e debater cenários, propostas e prospecções.
O reitor Carlos Gilberto Carlotti Júnior explicou que o objetivo da reunião foi trazer os principais agentes externos que trabalham com inovação no sentido amplo da palavra, da legislação ao financiamento. “Vamos escutar, discutir e trocar experiências para melhorar, pois queremos aumentar o poder de inovação da USP. Um poder que já temos, e sabemos que muito já tem sido feito, mas é possível avançar ainda mais”, ressaltou. O reitor mencionou as melhorias que a Universidade está promovendo em sua estrutura física, como é o caso da construção do novo
Distrito de Inovação em um edifício de 36 mil metros quadrados, já em andamento. “O Brasil tem muito a avançar em comparação com outros países e a USP precisa contribuir. Sabemos que muitas vezes a USP é vista como modelo para outras instituições, então temos a responsabilidade de fazer muito bem”, completou Carlotti.
Futuro Distrito de Inovação da USP ocupará edifício de 36 mil metros quadrados – Foto: Marcos Santos/USP Imagens
O encontro foi aberto pelo secretário secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado de São Paulo, Vahan Agopyan, que frisou a importância de não deixar o assunto restrito aos pesquisadores e comentou que, apesar de esta ser uma tarefa da universidade, não está restrita a ela, e nem mesmo a setores específicos de pesquisa: “Na última reunião dos governos dos estados do Sul e Sudeste (Cosud ), os secretários de sete Unidades Federativas decidiram que temos que aumentar nossa interação com as áreas de desenvolvimento econômico, desenvolvimento social e a sociedade em geral”.
Contexto da inovação no Brasil As apresentações do dia começaram com Ricardo Galvão, presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico ( CNPq). Ao entrar no Co, disse estar estar emocionado por estar novamente neste local, que trazia uma forte recordação do episódio em que foi demitido do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe): “Naquele momento, com a exposição do embate, senti dúvidas se tinha feito o correto, e ao ser imediatamente convidado pela USP e ser recebido aqui nesta sala daquela forma, restaurei meu sentimento de ânimo e dignidade”.
No que diz respeito ao atual cenário, Galvão relembrou o papel do CNPq de fomentar a pesquisa para contribuir com o desenvolvimento científico e tecnológico e a inovação no País: “Articular pesquisadores e redes de pesquisa, estimular e apoiar alianças estratégicas e projetos de cooperação. Esse tipo de ação proporciona o transbordamento do conhecimento da pesquisa para o desenvolvimento”, afirmou. Galvão relatou que, ao assumir a presidência do órgão, assustou-se não só com a grande queda do orçamento, mas principalmente com o fato de 90% estarem comprometidos com bolsas, em detrimento de maiores valores destinados ao fomento. Para ele, é importante que as bolsas estejam mais concentradas em outros órgãos, em especial a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
Galvão apontou que apesar de o número total de mestres e doutores ter crescido, eles ainda representam uma parcela muito pequena da força de trabalho fora de universidades ou entidades públicas: “Ao contrário de países como China, Alemanha, Coreia ou Japão, o Brasil tem um índice muito baixo de pesquisadores atuando em empresas, e eles são essenciais para a capacidade das nações de transformar e produzir conhecimentos, gerando inovações”, explicou, acrescentando que o papel da universidade inclui estimular os estudantes a uma mentalidade mais empreendedora.
(Da esq. p/ dir.) Ricardo Galvão, Vahan Agopyan, Carlos Gilberto Carlotti Junior, Marco Antonio Zago, Francisco Saboya e José Luís Gordon – Foto: Marcos Santos/USP Imagens
Já o presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), Celso Pansera, destacou a recomposição integral dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), principal fonte nacional de financiamento à inovação, e o lançamento, nos próximos meses, de novos editais, em várias áreas e em um volume inédito tanto de chamadas como de recursos financeiros. “É visível o fato de que as universidades estão com bastante demanda represada e precisamos buscar nelas o que há de inovação, inclusive para servir a políticas públicas, por exemplo na saúde, em sistemas e equipamentos de defesa ou tecnologias de gestão para contas públicas. O Brasil está caminhando para ser a 9a economia mundial e já é a 12a em produção científica, mas está em apenas 49o lugar em em inovação. A USP pode ajudar a reduzir essa enorme distância”. Pansera comemorou a nova metodologia que está sendo aplicada nos editais da Finep, que facilita a inscrição de projetos, reduzindo a burocracia e trazendo velocidade com a exigência da maior parte dos documentos somente após a aprovação.
Marco Antonio Zago, presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), lembrou que a entidade acaba de completar 60 anos, período em que mudou muito, mantendo o apoio irrestrito à ciência básica, chamada de ciência “desinteressada”, mas ao mesmo tempo passando a ter um novo olhar para a vida do cidadão, trazendo uma mudança de perspectiva que fortaleceu o apoio à inovação sem prejuízo das demais áreas, o que é possível graças ao modelo estável de gestão e financiamento da instituição. “Temos a convicção de que a inovação disruptiva, aquela que traz mudanças reais, ocorre nas empresas, de preferência em cooperação com universidades, e, por isso, a Fapesp mantém o diálogo muito próximo das companhias”. Zago lembrou que duas das maiores revoluções científicas que aconteceram no País nas últimas décadas foram germinados na Fundação: “no final da década de 90 a revolução genômica foi originada por um projeto altamente inovador, o Genoma Fapesp, que mudou as histórias da medicina e da ciência biológica brasileiras. Em outra frente, o nascimento da internet comercial do Brasil também ocorreu na Fapesp, que foi inclusive responsável pela gestão do registro de domínios, o que até hoje rende recursos que são aplicados em fomento”.
Zago apresentou dados a respeito do ambiente de inovação de São Paulo que colocam o estado em situação diferente dos demais, já que é o único ente federativo com um índice de mais da metade do investimento em ciência e tecnologia vindo das organizações privadas, algo que coincide com o que ocorre em nações mais desenvolvidas.
Defendeu, ainda, uma mudança nos padrões formativos dos pesquisadores, já que, segundo ele, há uma perspectiva de queda do interesse e da procura dos jovens pela universidade e, consequentemente, pela ciência e pelo trabalho em inovação.
No evento foi apresentado também o trabalho realizado pela Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii). O presidente da entidade, Francisco Saboya, explicou que a própria Embrapii é uma inovação de arquitetura institucional, constituída como uma Organização Social que mantém contratos de gestão com diversos órgãos, governamentais ou não, o que flexibiliza a captação e cria novas possibilidades de financiamento. O modelo adotado pela instituição é tripartite, sendo que a Embrapii aporta um terço, indústria beneficiária outro terço e a unidade Emprapii – instituição parceira – o terço final.
“Este é um modelo virtuoso que tem trazido resultados, pois a comunidade acadêmica e a indústria podem trabalhar na recuperação da competitividade em um cenário de muitos anos de desindustrialização no Brasil”, avaliou Saboya, lembrando que a USP tem nove unidades Emprapii. Para ele, os números mostram a dimensão dos resultados da instituição: “Após dez anos de Emprapii, hoje temos 2.206 projetos apoiados, 1.315 projetos concluídos, 1.500 empresas parceiras e 676 pedidos de propriedade intelectuais. Já temos R$ 3,24 bilhões aportados em projetos, sendo 33,7% de participação Embrapii, 49,4% de participação das empresas e 16,9% de participação das unidades Embrapii”. Saboya destacou, como um indicativo de melhora no ambiente empreendedor brasileiro, a inversão no perfil de empreendimentos que ocorreu neste período: “Hoje, dois terços são micro e pequenos empreendedores, ao contrário de 2013, quando a imensa maioria era de grandes companhias”.
Por fim, José Luis Pinho Leite Gordon, diretor de Desenvolvimento Produtivo, Inovação e Comércio Exterior do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), lembrou que inovação é uma atividade chave, que puxa todas as demais. Gordon relatou que nos últimos anos houve uma queda muito grande na inovação como desembolso do banco e a atual gestão trabalha para retomar este assunto como prioridade de desenvolvimento econômico e que certamente a USP terá um papel de grande relevância. Foram apresentados três eixos do governo federal para o desenvolvimento: transição ecológica, novo PAC e Política Industrial, todos eles altamente dependentes de pesquisa, desenvolvimento e inovação em um ambiente coordenado.
Encerrando a apresentação, Gordon listou uma série de ações e programas do Banco e rebateu a imagem muitas vezes difundida de que o BNDES aportaria recursos financeiros com diretrizes ideológicas ou apenas em determinadas localidades, afirmando que que isso não é uma realidade e esclarecendo: “O BNDES não coloca dinheiro em nenhum país, mas sim em empresas, e o que buscamos são justamente aquelas mais inovadoras, que exportam para os mais diversos destinos buscando a competitividade”.