Como grãos de areia que lentamente se amontoam até formarem dunas, as mortes por câncer no Brasil crescem num ritmo gradual e discreto de 3% ao ano. Essa proporção acumulada ao longo de décadas, entretanto, traz perspectivas sombrias, com o impacto de avalanches. Basta olhar para trás para imaginar o futuro: em 1930, as mortes por câncer representavam 3% de todos os óbitos; em 1989, essa proporção subiu para 12% e, para 1996, espera-se uma taxa de 18%. Esses dados fazem parte da Estimativa da incidência e mortalidade por câncer no Brasil, elaborada pelo Instituto Nacional do Câncer (INCa) e apresentada ontem à imprensa.
"O número de casos está crescendo porque a expectativa de vida também aumentou. Hoje a população vive duas décadas a mais do que nos anos 40, ficando exposta durante mais tempo a fatores de risco, como fumo, bebidas alcoólicas e hábitos dietéticos e comportamentais inadequados", compara o cirurgião oncológico Marcos Moraes, diretor-geral do INCa. "As estimativas para este ano são de 268.500 novos casos de câncer, com 94.150 mortes (51.100 de homens e 43.050 de mulheres)."
Os tumores responsáveis pelas mais altas taxas de incidência e mortalidade no país são os de pulmão, estômago e próstata para os homens, e mama, estômago e colo uterino para as mulheres.
Fumo - "A primeira medida para reduzir essas estatísticas é largar o fumo", adverte Moraes. "Se a população parasse de fumar hoje, em 20 anos, a incidência geral de todos os tipos de tumores cairia em 30% e a o câncer de pulmão diminuiria em 90%", exemplifica. "O que se verifica no país é que a população de baixa renda fuma cada vez mais enquanto a classe de maior poder aquisitivo está fumando menos."
Para os não-fumantes que sofrem em locais esfumaçados, o diretor do INCa adianta uma boa notícia: a Organização Mundial da Saúde conseguiu aprovar uma medida que proíbe o fumo, a partir de 1º de julho, em vôos internacionais de quaisquer empresa aérea e procedência.
O Rio Grande do Sul é o estado de maior incidência de câncer de pulmão e - coincidentemente - o que consome mais cigarros. A Região Sul tem o maior número de casos de câncer de mama, enquanto os estados do Norte e Nordeste apresentam mais câncer de colo uterino. "Este último é facilmente diagnosticável em fase precoce", lembra Moraes. "Se o Brasil conseguisse fazer exames preventivos (papanicolau) em 85% de sua população feminina, reduziria em 90% a mortalidade por câncer de colo de útero."
Prevenção - Moraes disse que o INCa está levantando a infra-estrutura existente no país para a realização desses exames preventivos. "Não adianta lançar campanhas de prevenção se não temos condições de atender e tratar a população", destaca. "Precisamos ter segurança nos exames e fazer o acompanhamento das mulheres atendidas." Entre os fatores de risco para o câncer de colo uterino, o médico aponta uma vida sexual precoce, múltiplos parceiros, doenças sexualmente transmissíveis como o papilomavírus e más condições de higiene pessoal.
O câncer de próstata também preocupa as autoridades sanitárias: esperam-se 4.350 casos para este ano. A incidência é alta sobretudo em homens idosos. "Após os 40 anos, todos os homens devem fazer um exame de toque retal uma vez por ano. Em alguns casos, pode ser feito também o diagnóstico a partir de um exame de sangue", avisa Moraes.
Estômago - Números surpreendentes são os do câncer de estômago que ocupa o primeiro lugar em mortalidade para ambos os sexos. Segundo o diretor do INCa, a causa para esse tipo de tumor ainda não está bem definida. Acredita-se que haja fatores genéticos e dietéticos envolvidos.
O Ministério da Saúde realizou um estudo há quatro anos que mostrava que o número de casos de câncer de estômago é inversamente proporcional ao de geladeiras. "A má conservação dos alimentos é um fator de risco. A proliferação de microorganismos em carnes que ficam fora da geladeira, por exemplo, está associada a uma maior proporção de casos da doença", explica Moraes.
Notícia
Jornal do Brasil