A pandemia de COVID-19 tornou mais evidente a necessidade dos chamados sistemas de sentinela, que monitoram agentes patológicos a fim de evitar surtos ou mesmo prever futuras epidemias. Além de vírus como o SARS-CoV-2, porém, é fundamental monitorar também fungos e bactérias que ainda não possuem tratamentos eficazes e podem se espalhar. Esse foi o tema da 4ª Conferência FAPESP 60 anos, "Desafios à Saúde Global", realizada esta semana. (assista clicando aqui)
O evento teve como mediadora Helena Nader, professora da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp) e integrante do Conselho Superior da FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).
"É muito importante termos sistemas de sentinela que permitam que uma pandemia, no início do seu surgimento, seja rapidamente detectada e combatida. Mas tudo isso requer uma interação, uma cooperação, que nem sempre são naturais", destacou Luiz Eugênio Mello, diretor científico da FAPESP, durante a abertura do evento.
Andrea Dessen, pesquisadora do Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS), da França, alertou para o fato de que, historicamente, não são apenas vírus que causam pandemias, mas também bactérias. Desde os anos 1960, no entanto, poucos novos antibióticos foram descobertos e hoje há um conjunto de bactérias conhecido pela grande capacidade de escapar aos tratamentos existentes.
"A Organização das Nações Unidas calcula que hoje são 700 mil mortos por ano por conta da resistência aos antibióticos, mas se não fizermos nada, em 2050 serão 10 milhões por ano", afirmou a pesquisadora, que coordena um projeto apoiado pela FAPESP no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), no âmbito do Programa São Paulo Excellence Chair (SPEC).
A pesquisadora lembrou que são seis as razões apontadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para a resistência aos antibióticos: prescrição excessiva, tratamentos não finalizados, utilização excessiva na pecuária (que consome 80% do volume mundial desses medicamentos), controle insuficiente das infecções em ambientes hospitalares, falta de higiene e saneamento e ausência de antibióticos no mercado
Vírus monitorados
Ester Sabino, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP) e pesquisadora do Instituto de Medicina Tropical (IMT-USP), lembrou que o Centro Conjunto Brasil-Reino Unido para Descoberta, Diagnóstico, Genômica e Epidemiologia de Arbovírus (CADDE), apoiado pela FAPESP e coordenado por ela, foi criado com a ideia de monitorar novos arbovírus (patógenos transmitidos por artrópodes). A emergência da COVID-19, porém, ampliou o escopo do projeto.
O trabalho de sentinela realizado pelo centro passa desde o monitoramento dos bancos de sangue para verificar a presença de vírus e, no caso dos SARS-CoV-2, das taxas de anticorpos da população e do sequenciamento do vírus isolado de pessoas que procuraram os serviços de saúde. A ideia é verificar a ocorrência de determinadas variantes, com a Delta, que já chegou a 100% no município de São Paulo.
"Esperávamos uma epidemia de dengue no ano passado e ela não veio. A dengue talvez seja uma doença sensível à mobilidade. Observamos uma queda nos casos quando a mobilidade caiu por conta da [restrição impostas para conter a] COVID-19. Mas este ano o mais preocupante é chikungunya, que pode vir quando voltar a movimentação de pessoas. Já houve casos em Santos e outros lugares", disse a pesquisadora.
"Precisamos do SUS [Sistema Único de Saúde], das universidades e do poder público entendendo o que se está falando para poder conseguir definir melhor as políticas. E isso tem de ser feito antes que as epidemias aconteçam para que possamos fazer algo em tempo de melhorar nossa resposta", afirmou. (Com informações do Governo de SP)