A economia mundial está passando por uma revolução com três componentes fundamentais: um tecnológico, um de comércio e um social/administrativo. O componente tecnológico se caracteriza pela introdução de tecnologia de base microeletrônica, que muda os processos de produção, tornando-os mais ágeis e mais rápidos. Aumenta a produtividade do trabalho e abre novas possibilidades de produção. O componente comercial, a globalização da economia, gera um rápido aumento dos fluxos de comércio entre países e força uma redução das barreiras ao comércio internacional, aumentando a especialização e a competitividade. O componente social/administrativo muda as relações entre patrões e trabalhadores, induz um maior envolvimento e disciplina no processo de produção e ganhos de produtividade.
Como em todo processo revolucionário, é impossível saber qual sua origem e qual será seu resultado. Entretanto, alguns pontos podem ajudar a entendê-lo melhor. A revolução da tecnologia é o resultado da acumulação de conhecimentos que, em determinado momento, se transforma em tecnologia aplicável aos processo produtivos. Porém, dificilmente isto se daria se as condições econômicas e sociais não gerassem o impulso necessário para a adoção das novas tecnologias.
A globalização da economia é o resultado do crescimento acelerado da capacidade de produção mundial e da necessidade de crescimento concomitante dos mercados para convalidar este processo. O esgotamento dos mercados internos dos diferentes países produz forças que impulsionam as empresas para os mercados externos gerando uma persistente demanda por maior abertura e redução da proteção comercial.
Finalmente, a combinação de trabalho assalariado com um sistema de bem-estar social que tem na proteção ao não empregado seu principal pilar de sustentação gera incentivos perversos reduzindo ou até mesmo eliminando a pressão para que os trabalhadores dediquem uma parte substancial de seu tempo à geração de renda através da produção. Com isso, torna-se necessário o desenvolvimento de formas alternativas de inserção do trabalhador no processo produtivo e de mudanças institucionais que façam com que seu trabalho volte a ser o veículo através do qual os trabalhadores obtêm seu sustento.
Provavelmente, foi a redução do incentivo ao trabalho assalariado que, ao tornar necessárias as mudanças nas relações de trabalho, gerou as condições para a introdução da tecnologia microeletrônica, viabilizando formas alternativas de inserção do trabalhador no processo produtivo. O aumento de produtividade daí decorrente induziu a revolução da globalização como condição básica para a continuação do processo de crescimento das economias, de mercado.
Porém, como em qualquer revolução, também esta gera deslocamentos importantes de mão-de-obra e problemas sociais de difícil solução. No curto prazo, aumenta o desemprego e/ou trabalhadores são deslocados para empregos de menor qualidade e menores salários, criando um ambiente de insegurança e perplexidade. A revolução industrial de meados do século 19 é uma caso similar ao que está ocorrendo hoje. Naquele momento, o aumento do desemprego gerou tal perplexidade que a quebra de máquinas parecia a solução dos problemas.
No longo prazo, estas experiências históricas têm mostrado que os ganhos de produtividade são, pelo menos em parte, absorvidos pela massa dos trabalhadores como ganhos de renda e, portanto, como melhoria de seu bem-estar. Porém, a transição entre os sofrimentos do curto prazo e os ganhos de longo prazo são de difícil assimilação, principalmente porque os perdedores no curto prazo não serão os ganhadores no longo prazo. Daí o aparecimento de propostas de soluções para os problemas de curto prazo que, na verdade, se constituem em mitos cujos resultados são, na melhor das hipóteses, duvidosos.
Um primeiro mito é a idéia de que o problema de curto prazo pode ser resolvido através de retreinamento. Retreinar trabalhadores é importante e poderá reduzir os custos sociais do ajuste, mas não conseguirá resolver os problemas sociais gerados pelos deslocamentos originados pela revolução em andamento. Simplesmente porque estes trabalhadores dificilmente conseguirão competir em igualdade de condições com os novos, que estão entrando no mercado de trabalho, com uma formação totalmente já direcionada para o novo processo produtivo.
Um segundo mito é que aumentar a proteção pode resolver o problema. O retardamento da introdução de novas tecnologias, o aumento da proteção ao não empregado, a introdução de barreiras ao comércio, etc. são tentativas nesta direção. Entretanto, tais mecanismos, principalmente se mal desenhados, apenas reduzirão os incentivos a ganhos de produtividade e competitividade, diminuindo a geração de empregos no longo prazo, tornando ainda mais difícil a transição.
Um terceiro mito é que a redução da jornada de trabalho poderia gerar mais empregos e, portanto, reduzir o desemprego. Porém uma redução da jornada sem o correspondente aumento da produtividade aumenta os custos de produção e reduz a competitividade da economia. Em uma economia globalizada isso terá o efeito de reduzir a produção e o nível de empregos.
Os deslocamentos gerados pela atual revolução econômica continuarão a se manifestar através de aumento do desemprego e/ou através da redução da qualidade dos empregos, dependendo do grau de flexibilidade dos mercados de trabalho. Quanto mais flexível, mais o ajuste se dará sobre a qualidade dos empregos e menos sobre a taxa de desemprego e vice-versa. A solução definitiva para estes problemas está na criação de um ambiente institucional condutor de ganhos de produtividade e de competitividade que permitirá.às economias se incorporar ao processo revolucionário em andamento com o mínimo de deslocamentos. Porém, é um engano acreditar que é possível não haver perdedores neste processo. Afinal, revoluções se fazem sempre com ganhadores e perdedores.
Notícia
Jornal do Brasil