Agência Fapesp
Crescimento excepcional da economia entre 1968 e 1973 teve origem em medidas tomadas no primeiro período do regime autoritário, de acordo com estudo publicado na Revista Brasileira de Economia.
O chamado “milagre econômico” brasileiro – período de excepcional crescimento da economia entre 1968 e 1973 – decorreu principalmente do efeito tardio das reformas associadas ao Programa de Ação Econômica do Governo (Paeg), durante o governo de Castello Branco (1964-1967). Essa é uma das principais conclusões de um estudo publicado na Revista Brasileira de Economia.
O trabalho, que recebeu em 2008 o prêmio Mario Henrique Simonsen, concedido ao melhor artigo publicado na revista editada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), destaca o fato de que, embora o “milagre” tenha sido amplamente estudado na literatura acadêmica, “não existe um consenso em relação aos seus determinantes”.
De acordo com Fernando Veloso – professor da Faculdade do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec) do Rio de Janeiro e coautor do artigo – o objetivo do trabalho era quantificar a importância de cada uma das vertentes de interpretação para o “milagre” brasileiro.
Os outros autores do estudo são André Villela, da Escola de Pós-Graduação em Economia da FGV, e Fabio Giambiagi, pesquisador do Instituto de Estudos de Trabalho e Sociedade e integrante do Departamento Econômico do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
“Verificamos, em particular, em que medida o milagre decorreu da situação externa favorável e do desempenho de variáveis de política econômica associadas à estabilidade macroeconômica, política fiscal, nível de desenvolvimento do sistema financeiro e grau de abertura ao exterior”, disse Veloso à Agência FAPESP
As interpretações para o milagre encontradas na literatura podem ser agrupadas em três grandes linhas, segundo o estudo. A primeira enfatiza a importância da política econômica do período 1968-1973, “com destaque para as políticas monetária e creditícia expansionistas e os incentivos às exportações”.
Uma segunda linha de interpretação atribui grande parte do “milagre” ao ambiente externo favorável, devido à grande expansão da economia internacional, melhoria dos termos de troca e crédito externo farto e barato.
Já uma terceira explicação credita grande parte do “milagre” às reformas institucionais do Paeg do governo Castello Branco, em particular às reformas fiscal, tributária e financeira, que teriam criado as condições para a aceleração subsequente do crescimento.
Segundo Veloso, a principal conclusão do artigo é que o “milagre” econômico brasileiro decorreu em grande medida do efeito defasado das reformas associadas ao Paeg. Dentre essas reformas incluem-se a criação do Banco Central, o desenvolvimento do mercado de capitais – incluindo o mercado acionário – e a criação do Sistema Financeiro da Habitação.
“Como em geral ocorre quando são feitas reformas de grande profundidade, as reformas do Paeg só tiveram efeito nas principais variáveis macroeconômicas, como crescimento econômico e inflação, alguns anos depois de sua implantação, especialmente a partir de 1968”, destaca.
Para o pesquisador, o estudo apresentou evidências empíricas de que o “milagre” brasileiro foi um milagre de produtividade. Isso significa, diz, que o crescimento econômico brasileiro na época foi impulsionado por ganhos de eficiência e progresso tecnológico, que permitiram que a economia produzisse mais com a mesma quantidade de fatores de produção, como capital e trabalho.
“O artigo sobre os determinantes do ‘milagre’ fornece uma explicação para essa evidência. Os resultados indicam que os ganhos de eficiência que proporcionaram o aumento da produtividade no período do ‘milagre’ decorreram das reformas institucionais do Paeg, principalmente a fiscal e tributária e a financeira”, diz.
Regressões de crescimento
Para a análise, o estudo utilizou a metodologia de regressões de crescimento com dados de painel. De acordo com Veloso, a estratégia empregada procura analisar, sob o ponto de vista estatístico, a relação entre o crescimento da renda per capita e um conjunto de variáveis explicativas postuladas pelas teorias de crescimento econômico, como renda inicial, nível de escolaridade, taxa de inflação, grau de abertura da economia, tamanho do sistema financeiro, dentre outras.
Segundo o professor, a expressão “dados de painel” significa que são utilizados dados de vários países em vários anos. No artigo foram utilizados dados de 62 países para o período 1962-1997, dividido em subperíodos de seis anos, um dos quais foi o período do “milagre” (1968-1973).
“Essa metodologia também permite que, uma vez estimados os coeficientes que relacionam o crescimento com as variáveis explicativas, o modelo seja utilizado para fazer previsões de crescimento que podem ser comparadas com as taxas de crescimento efetivamente observadas para verificar o grau de precisão das previsões”, explica.
O artigo mostra que não seria possível manter a linha evolutiva de crescimento nos anos seguintes após 1973. De acordo com Veloso, era inevitável que houvesse uma desaceleração econômica no período pós-1973.
“A razão é que, na medida em que a aceleração do crescimento associada ao milagre decorreu em grande parte do efeito defasado das reformas do Paeg, o crescimento tenderia a se reduzir quando este efeito se esgotasse, o que ocorreu em 1973”, afirma.
Além disso, acrescenta, em 1973 ocorreu o primeiro choque do petróleo e houve uma piora de diversas variáveis macroeconômicas, em particular um aumento da inflação e elevação da dívida externa, que contribuíram para uma redução ainda mais acentuada do crescimento.
Para ler o artigo Determinantes do "milagre" econômico brasileiro (1968-1973): uma análise empírica, de Fernando Veloso, André Villela e Fabio Giambiagi, disponível na biblioteca on-line SciELO (Bireme/FAPESP), acesse o http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71402008000200006&lng=en&nrm=iso&tlng=pt
(Envolverde/Agência Fapesp)