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Mesmo com dificuldades, pesquisas prosseguem no País

Publicado em 14 maio 2003

Mesmo com os parcos recursos para pesquisa no Brasil, além de dificuldades legais que emperram vários trabalhos científicos, os mais importantes centros de pesquisa do Sudeste brasileiro desenvolvem estudos - com base na biotecnologia - no sentido de encontrar soluções comerciais para alimentos melhorados geneticamente. A referência no País continua sendo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que faz parte do Ministério da Agricultura. O braço da entidade responsável pelo setor de biotecnologia, um dos 39 centros de pesquisa e serviços especiais do órgão, é o Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (Cenargen). A missão do Cenargen (ver texto abaixo) é encontrar soluções tecnológicas para o desenvolvimento sustentável do agronegócio brasileiro e, com isso, assegurar a conservação, a valoração e o uso dos recursos genéticos ao gerar, adaptar e transferir conhecimentos e tecnologias. Na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP), as pesquisas em biotecnologia para melhorar os alimentos encontram-se literalmente em ebulição. O pós-doutorando Wellington Luiz de Araújo, do Departamento de Genética, dá dois exemplos. Um deles é o estudo sobre a interação de um microrganismo endofítico que vive dentro das plantas com a bactéria Xylella fastidiosa, causadora da doença conhecida como amarelinho — ou clorose variegada de citros (CVC) -, que atinge os laranjais. Araújo conta que está sendo feita a clonagem do gene da bactéria Bacillus do ambiente, responsável pela degradação do exopolissacarídeo da Xylella, uma das causas de doenças em citros. No momento, os pesquisadores, que estão na última fase de avaliação, estudam o efeito dessa bactéria sobre a Xylella. "Esperamos que ela consiga degradar o exopolissacarídeo e controlar a doença no campo", diz Araújo. Em outra pesquisa feita na Esalq, espera-se encontrar a bactéria endofítica que acelera o crescimento das plantas. Há duas espécies sendo estudadas: o eucalipto e a soja. O resultado concreto será o ganho de 20% de crescimento nas espécies em que a biotecnologia tiver sido empregada. Outro importante centro de estudos brasileiros está localizado na Universidade de Mogi das Cruzes (UMC). Segundo o professor João Lúcio Azevedo, coordenador do Núcleo Integrado de Biotecnologia da universidade, a entidade participa parcialmente do famoso Projeto Genoma Humano, patrocinado pela Fundação de Amparo à Pesquisa Científica do Estado de São Paulo (Fapesp), que seqüenciou a Xylella. Na USP, em São Paulo, o pesquisador sênior Crodowaldo Pavan, do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biomédicas, estuda há anos diversos processos que envolvem a biotecnologia. O mais importante deles diz respeito às bactérias fixadoras de nitrogênio e sua utilização nos processos de adubação do solo. Um outro estudo, em fase inicial na USP, tem como objetivo aumentar a quantidade de proteínas e vitaminas no feijão, elevando, conseqüentemente, sua qualidade nutricional. A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Rio de Janeiro, igualmente mantém técnicos dedicados à biotecnologia. A área tecnológica da entidade monitora os projetos de pesquisa em andamento e detecta os produtos que podem ser lançados no mercado - não sem antes contar com a devida proteção legal. De acordo com Maria Celeste Emerick, coordenadora dessa área da Fiocruz, um dos projetos atuais é o de um reagente para o diagnóstico da leishmaniose, desenvolvido em parceria; com a iniciativa privada. Da mesma' forma, há um outro trabalho no qual a Fiocruz oferece às empresas os antígenos de doenças como dengue, Chagas e leptospirose, recebendo em troca a tecnologia de diagnóstico rápido..-"Também estão sendo avaliados produtos com base em plantas para o desenvolvimento de fitoterápicos, entre outros importantes trabalhos", enfatiza Celeste Emerick. CENARGEN CONTINUA NA VANGUARDA O chefe do Cenargen, Luiz Antonio Barreto de Castro, explica que o braço biotecnológico da Embrapa lida com a engenharia genética de plantas há 23 anos. "Até as leguminosas, mais difíceis de se trabalhar, foram contempladas nos projetos da entidade", diz. Há vários programas em andamento: estuda-se criar uma soja geneticamente modificada para resistir a herbicidas e um feijão que consiga fazer frente ao vírus do mosaico dourado. Acabam de ser concluídos também os estudos sobre a utilização da engenharia genética no controle da sigatoka negra em bananas. Outro vilão da produção de feijão, o caruncho, que afeta os grãos armazenados, principalmente no Nordeste, está sendo analisado, assim como o bicudo, que ataca as plantações de algodão. A maioria dos projetos para resistência a insetos utiliza genes específicos obtidos de bactérias, que são transferidos para o genoma das diferentes plantas. Como resultado, o próprio vegetal passa a desenvolver toxinas prejudiciais ao inseto. Ou seja, a engenharia genética, em tais casos, cria mecanismos naturais de defesa. Para conferir resistência a um vírus, o processo é diferente. Tira-se o gene que codifica determinada proteína do vírus para colocá-lo na planta. Com isso, o microrganismo deixa de infectá-la. Hoje, um dos problemas enfrentados pela Embrapa está no fato de as plantas resistentes a fungos, insetos e vírus serem consideradas biocidas, ou seja, agro-tóxicos biológicos. A legislação vigente dificulta, ou impede, os experimentos de campo com essas variedades, razão pela qual existem pesquisas paradas há três anos à espera de uma autorização.