A medicina tradicional indígena foi mais eficaz do que remédios convencionais no tratamento da dor entre membros das tribos do Vale do Javari, no oeste do Amazonas. É o que revela pesquisa realizada pela mestra em enfermagem Elaine Barbosa de Moraes, com apoio da Fundação de Apoio à Pesquisa do estado de São Paulo (Fapesp).
A pesquisadora ouviu 45 índios das etnias marubo, canamari e matis, dos quais 80% recorreram à medicina tradicional indígena para o tratamento da dor e 64,5% confirmaram a eficácia desse método. Entre os 87,7% que usaram a medicina convencional, tomando o chamado “remédio de branco”, 22,2% disseram que o tratamento foi eficaz.
“Fica bem evidente que, mesmo utilizando mais a medicina convencional, o alívio da dor vem mais com o uso do remédio da medicina tradicional indígena”, concluiu Elaine.
Os tratamentos indígenas mais usados são os chamados “remédios do mato”, feitos com plantas e que são responsáveis pelo alívio da dor de 40% dos entrevistados. Existem ainda outras formas de tratamento, como o uso de gordura animal, de enzimas, de banhos e de rituais de cura, conhecidos como pajelança.
Para Elaine, uma das causas da eficácia do tratamento indígena é o conhecimento deles sobre o uso de tudo que a floresta oferece. “A medicina tradicional indígena é um conhecimento que tem muito a acrescentar para a saúde da nossa população e poderia, tranquilamente, ser incluída entre as terapias complementares de saúde, assim como já foram incluídas outras terapias.”
Ministério da Saúde
Questionado sobre os resultados da pesquisa, o Ministério das Saúde destaca que são vários os fatores que permeiam as questões relacionadas à eficácia de “remédios de branco” e das práticas da medicina tradicional indígena. Um dos fatores é o acesso e conhecimento construído em torno desses saberes. “A orientação é para que os profissionais de saúde atuem em diálogo permanente com os saberes indígenas.”
Segundo o ministério, a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas reconhece a eficácia da medicina tradicional e estabelece sua articulação com o sistema oficial de saúde. “O Ministério da Saúde também empreende ações de educação permanente em saúde, com foco nas especificidades da saúde indígena.” Atualmente, são oferecidos três cursos, e dois contam com participação de trabalhadores do Distrito Sanitário Especial Indígena do Vale do Javari”, informou a pasta.
Sistematização
A sistematização dos conhecimentos da medicina tradicional indígena pode beneficiar a população em geral, afirma a orientadora da pesquisa, Eliseth Ribeiro Leão, professora da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein. “É preciso sistematizar esse conhecimento, hoje confinado nas aldeias e com os pajés. Nossa preocupação é que se vá perdendo esse conhecimento ancestral e que, daqui a pouco, ele deixe de existir.”
A professora defende uma confluência de interesse de pesquisadores e políticas públicas. “Na etnia dos marubos, por exemplo, eles mostraram para a gente o breu branco misturado com urucum com que fazem uma aplicação tópica [para dor].” Eliseth destaca que o breu branco e o urucum têm propriedades anti-inflamatórias. “Eles usam extratos vegetais que têm propriedades, uma série de medicamentos nossos vem desses extratos vegetais. Eles usam e a dor melhora.”
Eliseth reforça que o Sistema Único de Saúde poderia se beneficiar da medicina tradicional indígena. “Teríamos uma nova fonte de conhecimento e ampliação nas terapias complementares que hoje estão instituídas no SUS.”
Por Agência Brasil