Pesquisadoras da Unesp de Araraquara (SP) desenvolveram uma material que pode revolucionar o tratamento de efluentes, resíduos gerados pelas atividades humanas que são tratados antes de serem lançados nos rios.
Elas usaram o lodo gerado por Estações de Tratamento de Esgoto (ETEs), que normalmente é descartado em aterros sanitários, para ganhar a nova e nobre função: auxiliar na limpeza dos efluentes.
No estudo realizado pelas pesquisadoras do Instituto de Química (IQ) da Unesp, o lodo foi reaproveitado para produzir um novo material, com propriedades magnéticas, que se mostrou capaz, em conjunto com peróxido de hidrogênio (água oxigenada) e luz solar, de degradar no laboratório resquícios de antibióticos presentes no efluente da cidade, além de desinfetá-lo removendo coliformes, bactérias e outros compostos orgânicos.
A técnica, testada em pequena escala, foi desenvolvida com a colaboração do Departamento Autônomo de Água e Esgotos de Araraquara (Daae), que cedeu amostras de lodo e efluente para o estudo. A expectativa das cientistas é de que, futuramente, o novo sistema possa ser implementado nas estações de tratamento do município.
Como funciona
Após ser coletado, o lodo passa por alguns procedimentos de secagem e tratamento térmico até virar um pó alaranjado, que é colocado em um recipiente com o efluente. Uma pequena quantidade de água oxigenada é adicionada à mistura, que fica em agitação enquanto é mantida sob irradiação solar por três horas.
Depois dessa etapa, o pó magnético é removido e o efluente é analisado. Em testes realizados no laboratório com amostras de efluente e dos antibióticos Sulfametoxazol e Trimetoprim, foi possível degradar 100% dos medicamentos, além de remover completamente os coliformes e bactérias presentes, entre elas, como a Escherichia coli, que pode causar uma série de infecções.
“Desenvolvemos uma estratégia ambientalmente amigável que recicla o lodo gerado na própria estação de tratamento, um resíduo rico em ferro, para produzir um material magnético que pode ser usado na degradação de antibióticos e de outros componentes orgânicos do efluente”, disse a autora da pesquisa Jany Hellen Ferreira de Jesus.
Segundo Jany Hellen, que também é pós-doutoranda do IQ, as estações de tratamento de esgoto não conseguem remover completamente os restos de antibióticos dos efluentes que são tratados. Com isso, ao serem lançadas nos ambientes aquáticos após passarem pelas estações de tratamento de esgoto, essas pequenas concentrações de medicamentos podem facilitar o surgimento de superbactérias que se adaptam ao contato frequente com os antibióticos, podendo desencadear um problema de saúde pública.
A ideia, segundo a cientista, é de que o novo método seja implementado como uma etapa extra no tratamento de efluentes realizado atualmente.
“Além de agregar valor a um resíduo, o trabalho permitiu utilizá-lo para melhorar os parâmetros de qualidade do efluente da própria estação, abrindo caminho para que ele seja lançado em corpos d'água já desinfectado, o que não acontece hoje em dia”, explicou Jany, que durante a pesquisa teve supervisão da professora Raquel Fernandes Pupo Nogueira do IQ e colaboração da doutoranda Karla Virginia Leite Lima.
Próximos passos
O trabalho foi premiado durante um congresso internacional de química realizado em Turim, na Itália, no mês de junho.
O próximo passo da pesquisa visa ampliar a escala dos testes com quantidades maiores de efluente e medicamentos para validar o método e acelerar sua implementação. Um artigo científico que descreve o novo tratamento está sendo finalizado para ser submetido à publicação. A pesquisa conta com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).