O litoral capixaba é a região com maior impacto, com aumento da frequência das ondas de calor e de frio, dos últimos 40 anos. Nesse tempo, a ocorrência de eventos extremos de temperatura quase dobrou no litoral de São Paulo (84%), dobrou no Rio Grande do Sul (100%) e quase triplicou no Espírito Santo (188%).
É o que revela o estudo inédito , feito pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e publicado nesta terça-feira (24) na revista Scientific Reports do grupo Nature, uma das mais prestigiosas revistas científicas no mundo, a quinta revista mais citada mundialmente em 2021.
O estudo avaliou uma série histórica com dados de temperatura do ar observados a cada hora do dia ao longo dos últimos 40 anos em cinco regiões costeiras do país: Espírito Santo (São Mateus), Maranhão (São Luís), Rio Grande do Norte (Natal), São Paulo (Iguape) e Rio Grande do Sul (Rio Grande).
A partir destes dados, quatro pesquisadores do Instituto do Mar (IMar/Unifesp) envolvidos utilizaram modelos matemáticos para definir o que seriam extremos de temperatura para cada uma das regiões.
Isso porque, em um país tão grande quanto o Brasil e com clima tão diverso, uma determinada temperatura pode ser extrema em uma região e normal em outra. Além disso, diferentes temperaturas podem ser consideradas extremas dependendo do mês do ano em cada local.
Com esta pesquisa detalhada, foi possível observar como a frequência e a intensidade dos valores de temperaturas máxima e mínima, a variação da amplitude térmica ao longo do dia e as mudanças abruptas de temperatura entre dias consecutivos variam em cada região e época do ano.
O estudo mostrou que toda a costa brasileira já está sofrendo algum impacto das mudanças climáticas em relação à temperatura do ar, com os litorais das regiões Sudeste e Sul sendo mais impactadas do que das regiões Norte e Nordeste onde, apesar de existirem extremos de temperatura ao longo de todo ano, eles não estão aumentando em frequência ou intensidade.
Porém, no Sudeste e Sul do país, o cenário é diferente. Nos litorais do Espírito Santo, São Paulo e Rio Grande do Sul, a frequência de ocorrências diárias de extremos máximos de temperatura e das ondas de calor, caracterizada por dias consecutivos de extremos máximos de temperatura, tem aumentado ao longo dos anos.
Além disso, a frequência de ocorrências diárias e de eventos de ondas de frio no Espírito Santo tem aumentado. “Estes dados mostram como as regiões Sudeste e Sul do Brasil já se encontram com impactos da temperatura do ar e que irão afetar a biodiversidade e até a economia”, destaca Fábio Sanches, autor da pesquisa e pós-doutorando pelo IMar/Unifesp.
“Identificamos o litoral do Espírito Santo como a região mais afetada dentre as que estudamos, pois, além das ondas de calor, foi a única região onde a frequência de ondas de frio é cada vez maior”, explica Sanches.
Além da frequência de eventos no Sudeste e Sul, um dado sobre a intensidade das temperaturas mínimas extremas chamou a atenção dos pesquisadores: no litoral do Rio Grande do Sul, a temperatura mais baixa (frio extremo) é cada vez maior.
“Isso significa que está ficando cada vez menos frio no sul do país, o que pode ter impactos na produção agrícola e até no turismo”, analisa Ronaldo Christofoletti, coordenador da pesquisa, bolsista produtividade do CNPq e professor do IMar/Unifesp.
Eventos extremos
O número de eventos por ano é variável, dependendo de condições específicas como pelos fenômenos El Niño e La Niña, mas, considerando uma média, no Espírito Santo, a taxa de aumento de eventos extremos é, em média, de 4,7% ao ano, enquanto em São Paulo é, em média, de 2,1% e, no Rio Grande do Sul, de 2,5% ao ano.
“As mudanças dos padrões de eventos extremos na costa brasileira são um sinal importante de alerta para a vulnerabilidade climática do Brasil como um todo. Este estudo confirma que a emergência climática não é futurologia e sim parte de uma realidade que temos que enfrentar, combatendo suas causas com ações concretas de mitigação e com políticas públicas eficazes de adaptação”, alerta Ana Toni, secretária nacional de Mudança do Clima do Ministério de Meio Ambiente e Mudanças Climáticas (MMA).