Um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) identificou a presença de micotoxinas — substâncias tóxicas produzidas por fungos — em todas as amostras de ração e em parte das amostras de leite coletadas em 100 propriedades leiteiras da região Sudeste do Brasil. Embora os níveis detectados no leite estejam dentro dos limites permitidos pela legislação brasileira e não representem risco à saúde humana, os pesquisadores alertam para os potenciais prejuízos à saúde dos animais e à produção leiteira.
A pesquisa foi realizada por meio de uma parceria entre a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), em Piracicaba, e a Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA), em Pirassununga. O objetivo foi analisar a ocorrência de múltiplas micotoxinas — como aflatoxinas B1, B2, G1 e G2, fumonisinas, ocratoxinas, desoxinivalenol, toxinas HT-2 e T-2 e zearalenona — tanto na dieta fornecida às vacas quanto no leite extraído.
Nas 100 amostras de dieta analisadas, todas apresentaram ao menos uma micotoxina. As fumonisinas foram detectadas em 100% das amostras, e em 86% houve a presença simultânea de duas a quatro micotoxinas diferentes. As aflatoxinas, por sua vez, apareceram em apenas uma amostra de ração.
No leite, a pesquisa identificou que a aflatoxina M1 esteve presente em 14% das amostras, enquanto as fumonisinas e zearalenonas foram detectadas em cerca de metade delas. O desoxinivalenol foi encontrado em 42%. Ocratoxinas e DOM-1, no entanto, não foram detectadas.
Segundo o professor Carlos Humberto Corassin, coordenador do estudo, embora os níveis não ultrapassem os limites legais, os efeitos combinados dessas toxinas — chamadas de efeitos aditivos ou sinérgicos — ainda são pouco compreendidos e merecem atenção, especialmente por sua ação crônica sobre os animais. Ele alerta que, mesmo em concentrações baixas, essas toxinas podem comprometer os sistemas imunológico, reprodutivo, digestivo e neurológico dos bovinos, além de afetar diretamente a produtividade.
A zearalenona, por exemplo, tem impacto na fertilidade e na produção de leite, enquanto o desoxinivalenol pode provocar recusa alimentar, diarreia e maior vulnerabilidade a infecções. As fumonisinas prejudicam a função renal e hepática e podem causar lesões de pele e casco. Já as aflatoxinas são conhecidas pelos efeitos cancerígenos e imunossupressores.
Apesar da ausência de riscos diretos ao consumidor, os especialistas recomendam o monitoramento contínuo das rações e a adoção de aditivos antimicotoxinas para minimizar os danos à saúde dos animais e os impactos econômicos à cadeia leiteira. O trabalho, financiado pela FAPESP, CNPq e Capes, integra a tese de doutorado de Aline Moreira Borowsky, sob orientação de Corassin, e reforça a importância da vigilância sanitária na produção agropecuária.