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IPBES aprova plano de trabalho e orçamento para os próximos 5 anos

Publicado em 02 janeiro 2014

Por Karina Toledo, da Agência FAPESP

A elaboração de diagnósticos sobre os agentes polinizadores e sua relação com a produção de alimentos, sobre o problema das espécies invasoras e sobre os processos de degradação da terra e de restauração são algumas das metas previstas no programa de trabalho aprovado no dia 14 de dezembro, na Turquia, pelos membros da Plataforma Intergovernamental de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES).

Batizado de “Consenso de Antalya”, o documento deverá orientar as atividades do grupo entre os anos de 2014 e 2018. Na mesma ocasião, representantes de 100 dos 115 países membros do IPBES votaram um orçamento de US$ 43,5 milhões para o período e já se comprometeram a doar US$ 25,4 milhões para custear as atividades dos próximos dois anos. O Brasil ofereceu uma contribuição de US$ 233 mil.

Ainda durante a reunião plenária realizada em Antalya entre 9 e 14 de dezembro, foi anunciada a ecologista francesa Anne Larigaudele, diretora científica do Conselho Internacional para a Ciência (ICSU), como chefe da Secretaria Executiva do IPBES em Bonn, na Alemanha. Também foi aprovado o marco conceitual da plataforma, documento que fornecerá a referência teórica para o trabalho a ser desenvolvido pelos especialistas nos próximos anos.

“É um marco conceitual inovador e muito moderno, pois foi escrito em três diferentes linguagens: a linguagem científica consolidada (usando termos como ‘biodiversidade’, ‘ecossistemas’ e ‘evolução’), a linguagem dos povos tradicionais e andinos (‘mãe terra’, ‘sistemas de vida’ e ‘vivendo em harmonia com a mãe terra’) e a linguagem transcultural consolidada na interface entre ciência e política dos acordos internacionais (com termos como ‘qualidade de vida’ e ‘benefícios da natureza para as pessoas’). O maior foco está na ação humana – raiz tanto da crise pela qual passa a biodiversidade atualmente quanto de suas possíveis soluções”, afirmou Carlos Alfredo Joly, coordenador do Programa de Pesquisas em Caracterização, Conservação, Recuperação e Uso Sustentável da Biodiversidade do Estado de São Paulo (BIOTA), da FAPESP, e representante da América Latina e Caribe no Painel Multidisciplinar de Especialistas (MEP, na sigla em inglês) do IPBES.

Instituído em abril de 2012, após quase dez anos de negociações internacionais, o IPBES tem a função de sistematizar o conhecimento científico acumulado sobre biodiversidade para subsidiar decisões políticas em âmbito internacional – trabalho semelhante ao que tem sido feito nos últimos 20 anos pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês). (Leia mais em http://agencia.fapesp.br/17398).

O programa de trabalho aprovado para 2014-1018 prevê a realização de um conjunto de avaliações globais e para cada uma das cinco regiões representadas no MEP: América Latina e Caribe; África; Leste Europeu; Sudeste Asiático; e Estados Unidos, Canadá, Europa e Austrália.

Em dezembro de 2015, o grupo deverá divulgar um primeiro relatório sobre polinização e produção de alimentos. Um segundo relatório está previsto para dezembro de 2016, com foco nos processos de degradação da terra e de restauração, bem como seus impactos sobre a biodiversidade, os serviços ecossistêmicos e o bem-estar humano.

No ano seguinte, serão divulgados diagnósticos regionais sobre todas as questões relacionadas à biodiversidade e aos ecossistemas – uma espécie de panorama de cada uma das cinco áreas. Por último, em dezembro de 2018, será divulgado o diagnóstico global do status da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos – relatório que deverá orientar a tomada de decisão em todas as convenções da área.

“Esperamos que esses primeiros diagnósticos regionais sirvam também para o estabelecimento dos mecanismos de participação da comunidade científica de todos os países membros”, contou Joly.

De acordo com o coordenador do BIOTA-FAPESP, foi aprovada a criação de uma força-tarefa para definir, em 2014, os mecanismos necessários para capacitar, onde for necessário, pessoas e instituições para que possam atender as demandas da plataforma.

“Muitos países não têm nem os inventários locais de biodiversidade porque não têm pessoal qualificado para o trabalho. Esses mecanismos de capacitação vão envolver cursos de treinamento, bolsas de estudo, intercâmbio de técnicos e de pesquisadores. O objetivo é que, até 2018, todos tenham pessoas treinadas para trabalhar nos diagnósticos. O Brasil em muitos aspectos pode oferecer treinamento para colegas da América Latina. Mas em algumas áreas, como modelagem de biodiversidade, nós ainda precisamos nos capacitar”, contou Joly.

Ao contrário do IPCC – que em suas avaliações considera apenas artigos publicados em revistas científicas e em inglês – o IPBES pretende valorizar a pesquisa local e estimular a integração do conhecimento indígena nos processos científicos e na avaliação e contabilização de biodiversidade e serviços ecossistêmicos.

Na avaliação de Joly, as atividades previstas no programa de trabalho vão exigir contribuições de milhares de cientistas de todo o mundo nas áreas de ciências naturais e sociais. Ao longo de 2014, o programa BIOTA-FAPESP, em parceria com os Ministérios de Relações Exteriores (MRE), Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e Meio Ambiente (MMA), organizará uma série de eventos para promover a participação da comunidade científica brasileira.

“É uma oportunidade singular para os pesquisadores do programa BIOTA-FAPESP se engajarem em projetos de escala global que vão auxiliar na definição de políticas públicas de qualidade, nos moldes do que temos feito no Estado de São Paulo”, afirmou Joly.

Apoio da ONU

Também durante a reunião plenária, o secretariado do IPBES assinou memorandos de entendimento com quatro agências da Organização das Nações Unidas (ONU): o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO).

“Queremos que cada uma dessas agências contribua com a sua especialidade. O Pnuma, por ser a mais ligada a questões ambientais, seria nossa casa natural. A Unesco tem um trabalho forte na parte de capacitação profissional e no trabalho com conhecimentos indígenas e tradicionais. A FAO está envolvida com a questão da produção de alimentos, que também é relacionada à conservação da biodiversidade. E o Pnud é forte na capacitação de instituições”, explicou Joly.

Representando o governo brasileiro no evento estiveram presentes Saulo Arantes Ceolin, chefe da Divisão do Meio Ambiente (Dema) do MRE; Larissa Maria Lima Costa, subchefe da Dema-MRE; e Carlos Alberto Scaramuzza, diretor do Departamento de Conservação da Biodiversidade (DCBio) do MMA.

“Finalmente, em Antalya, foram negociados os detalhes sobre o funcionamento da plataforma e se conseguiu aprovar um plano de trabalho sem grandes contestações. Não houve questionamento das ideias, o que demonstra um espírito de colaboração entre membros. É excepcional ter os países falando a mesma língua e realmente determinados a ter resultados”, avaliou Ceolin.

O chefe da Dema afirmou ainda que o marco conceitual do IPBES é resultado de um enorme esforço realizado para incluir visões além das científicas tradicionais. “Tentou-se incorporar demandas de países que têm comunidades indígenas, como a Bolívia e o Brasil. São povos que muitas vezes dependem da biodiversidade, lidam há milênios com essas espécies e têm conhecimentos práticos que podem também ser muito importantes para a conservação”, disse.

Fonte: Agência FAPESP