Um inventário que será divulgado na revista Biota Neotropica no dia 8 de maio reúne informações sobre 219 patógenos capazes de infectar plantas no Brasil, inclusive muitas espécies de relevância agrícola. Trata-se da maior compilação sobre vírus de planta já feita no país e, além da descrição dos microrganismos, reúne dados sobre as doenças por eles causadas e sua ocorrência em vegetações nativas, cultivadas, ornamentais e até em ervas daninhas.
“Desde o começo da minha carreira criei o hábito de reunir publicações sobre vírus de planta no Brasil. É um trabalho de décadas, com cerca de 8 mil referências registradas até agora. O problema é que, se alguém me perguntasse quantos vírus registrados existem no Brasil, eu não saberia responder. Por isso, resolvi organizar uma lista, em ordem alfabética, das diferentes espécies de plantas e dos vírus capazes de infectar cada uma delas naturalmente. Também foi elaborada uma listagem reversa, com a relação dos vírus e viroides [pequenos fragmentos de RNA sem capa proteica que se autorreplicam no interior das células vegetais podendo causar doenças] e a indicação das plantas que cada um deles infecta”, conta Elliot Watanabe Kitajima, pesquisador do Departamento de Fitopatologia e Nematologia da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP).
Engenheiro agrônomo formado na Esalq em 1958, Kitajima concluiu o doutorado em 1967, na mesma instituição. Foi pesquisador no Instituto Agronômico (IAC), professor na Universidade de Brasília (UnB) e voltou para a Esalq como professor visitante. Lá se aposentou (2006) e, atualmente, atua como pesquisador colaborador. O inventário é resultado de projetos desenvolvidos no âmbito do Programa BIOTA-FAPESP.
“A revisão de registros de vírus, que vai de 1926 até 2018, resume basicamente tudo o que se conhece sobre vírus de plantas no Brasil, tanto de vegetação espontânea quanto cultivada. Trata-se, portanto, de um banco de dados importantíssimo, que será útil tanto para os pesquisadores quanto para a formulação de políticas de prevenção de pragas”, avalia Carlos Joly, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenador do Programa BIOTA-FAPESP.
Joly destaca também a importância do novo inventário para a atividade econômica. “A lista inclui 346 espécies de plantas, pertencentes a 74 famílias diferentes, que são naturalmente infectadas por vírus. Plantas cultivadas, como as do grupo citros, por exemplo, têm vários tipos de vírus relacionados. Muitos deles são conhecidos e outros não. De qualquer forma, a ocorrência desses patógenos afeta a produção ou a qualidade do fruto. Conhecê-los e saber identificá-los rapidamente pode evitar prejuízos”, diz.
A maioria dos vírus e viroides que integram o inventário é reconhecida pelo International Committee on Taxonomy of Viruses (ICTV) – entidade que regulariza e organiza a classificação taxonômica dos vírus. Alguns dos microrganismos listados ainda aguardam a oficialização. A análise dessa listagem permite acompanhar a história de ocorrência de patógenos na agricultura brasileira e a evolução da virologia vegetal no Brasil, bem como mapear os principais centros de pesquisa na área.
Um dos exemplos é a tristeza da laranjeira, virose que, na década de 1940, destruiu cerca de 10 milhões de laranjeiras e provocou sérios prejuízos econômicos. O problema foi resolvido com base em pesquisas científicas e o Estado de São Paulo tornou-se o maior produtor de suco de laranja industrializado do mundo.
Outra virose importante, que emergiu na década de 1970, ficou conhecida como mosaico dourado do feijoeiro. Nesse período, o Brasil era um dos maiores produtores de feijão do mundo e teve sua produção seriamente afetada, precisando inclusive importar grãos do México.