Para presidente da Fapesp, "essa interação não vai resolver os problemas relacionados à verbas dentro das universidades e institutos, muito menos diminuirá a falha no acesso ao conhecimento por parte das empresas"
Londrina, PR - A importância da interação entre universidades ou institutos de pesquisa com as empresas no Brasil não promoverá, sozinha, uma compatibilização maior entre a capacidade de se produzir conhecimento e aplicá-lo no setor produtivo, afirmou hoje Carlos Henrique de Brito Cruz, reitor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Ele participou do Fórum Gestão da Interação Ciência, Tecnologia e Sociedade, promovido pelo instituto Agronômico do Paraná (lapar), que se encerra amanhã em Londrina.
Para o pesquisador, a distorção principal no Brasil é a pouca atividade de pesquisa e desenvolvimento (P&D) em empresas. "Quando se fala em aplicar o conhecimento há um papel importantíssimo, que é o das empresas. Mas a interação universidade-empresa apresenta limites importantes, não é a galinha dos ovos de ouro", afirmou. Segundo ele, também não é possível pensar que essa interação vá resolver os problemas relacionados à verbas dentro das universidades e institutos, muito menos diminuirá a falha no acesso ao conhecimento por parte das empresas.
Para ele, há um mito em que se destaca como significativo o investimento privado na universidade. O governo dos Estados Unidos, por exemplo, é quem investe em pesquisa e desenvolvimento nas universidades. "Menos de 7% é investimento de empresa em universidades nos EUA", apontou.
Brito Cruz também ressaltou as diferentes culturas e missões tanto da empresa quanto das universidades. O sigilo é algo importante para a empresa, enquanto na universidade busca-se a disseminação do conhecimento. O tempo disponível para a pesquisa dentro do ambiente empresarial é menor, por causa da competitividade, das regras de mercado.
MAIS INCENTIVO
As empresas no Brasil precisam de mais incentivos para poderem investir em pesquisa e desenvolvimento (P&D), o que hoje é uma necessidade na economia globalizada, segundo Carlos Henrique de Brito Cruz. Ele também defendeu uma maior participação de outras entidades para que o Brasil transforme ciência e tecnologia em algo estratégico no plano de desenvolvimento nacional.
"Esse é um assunto que não pode ser só do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), que é um bom líder, entende a estratégia para organizar" completou. "Só vamos conseguir sair dessa situação de desequilíbrio em ciência e tecnologia quando o assunto conhecimento for não só do MCT, mas dos ministério da Indústria, Desenvolvimento e Comércio, da Saúde, da Educação, do Meio Ambiente, da Fazenda, do Banco Central, enfim, do Brasil", destacou.
Para o pesquisador, os empresários têm razão em pedir incentivos, até porque o Estado dar incentivos financeiros para reduzir o risco da atividade de pesquisa na empresa é normal. "É tão normal que no acordo da Organização Mundial do Comércio (OMC), que o Brasil subscreve, dois subsídios ficaram permitidos, um para preservação do meio ambiente e outra para subsidiar atividades de pesquisa nas empresas", lembrou. Isso ficou, segundo ele, porque era de interesse de países como os Estados Unidos e Alemanha manter esses subsídios, que são praticados pelas nações mais ricas. "O Estado brasileiro precisa fazer mais isso", comentou.
As empresas não vão sobreviver na atual economia se não investirem em P&D, mas ao mesmo tempo enfrentam problemas, como altas taxas de juros e ondas de instabilidade econômica, que as impede de investir nessa área. "Fazer pesquisa não é barato, mas você pode fazer a pergunta ao contrário: e se não fizer, quanto custará em termos de perda de competitividade, de acesso a mercados externos mais exigentes" refletiu. "Não é uma opção, é uma necessidade dos tempos modernos"" completou.
Instrumentos mais ágeis e flexíveis para apoio à essas atividades dentro das empresas deveriam ser criados, de acordo com Brito. Ele lembrou que o governo já teve programas de bolsas para pesquisadores em empresas e isso precisa ser retomado. "A própria Fapesp apóia atividades de pesquisa desenvolvidas em mais de 200 pequenas empresas em São Paulo. Precisava ter um programa desses em nível nacional", destacou. Outro exemplo de boa iniciativa é a lei que permitiu que a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), agência do MCT que financia pesquisa, equalizasse os juros para poder financiar projetos de pesquisa.
Brito vê com otimismo o fato de que a indústria instalada no País, incluindo as multinacionais, estão reconhecendo o valor da pesquisa e que capacidade brasileira em formar recursos em P&D é atrativa para empresas se instalarem aqui. Ele contou que ainda tem mais facilidade para falar com as multinacionais sobre a necessidade de se investir em pesquisa.
O governo, no entanto, tem um papel fundamental no processo. "Precisa ter apoio à pesquisa na pequena empresa, empréstimo com juro subsidiado, bolsista pago pelo governo para trabalhar na empresa, a lei de incentivo fiscal, pagar menos imposto quando fizer atividade de pesquisa, desenvolver no Brasil essa política de poder de compra do Estado, viabilizar desenvolvimento tecnológico na empresa", enumerou.
Brito disse também que a desigualdade, e por conseqüência, a pobreza, faz com que o mercado interno fique pequeno, menos viabilizador do que poderia ser de desenvolvimentos locais. "Altos salários sempre foram propulsores do desenvolvimento tecnológico", lembrou. Esse problema estrutural também impede que o Brasil dê um salto tecnológico, ressaltou.
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Agência Estado