Na vanguarda da segurança digital, pesquisadores brasileiros estão desenvolvendo dispositivos que prometem revolucionar os sistemas de criptografia.
Na vanguarda da segurança digital, pesquisadores brasileiros estão desenvolvendo dispositivos que prometem revolucionar os sistemas de criptografia. Diferente dos métodos tradicionais, que dependem de complexos algoritmos matemáticos, os novos sistemas quânticos baseiam-se em princípios físicos para garantir a segurança. Qualquer tentativa de espionagem ou interferência é imediatamente detectada devido às alterações inevitáveis nos estados quânticos envolvidos.
Paulo Henrique Dias Ferreira, pesquisador do Departamento de Física da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), destaca a urgência em implementar protocolos de segurança quântica. “Supercomputadores clássicos podem levar milhares de anos para quebrar códigos criptográficos robustos, mas computadores quânticos suficientemente poderosos podem fazer isso em segundos. Isso destaca a necessidade de desenvolver e implementar protocolos de segurança quântica imunes a essas capacidades.”
Durante seu pós-doutorado no Politecnico di Milano, na Itália, Ferreira integrou a equipe do professor Roberto Osellame. Juntos, fizeram avanços significativos na geração e caracterização de estados entrelaçados GHZ (Greenberg-Horne-Zeilinger) de quatro fótons em um chip fotônico, trabalho publicado no periódico Quantum Information , do grupo Nature
“Este trabalho, que combina a tecnologia de pontos quânticos com circuitos fotônicos de vidro, representa um marco na comunicação quântica segura e eficiente”, afirma Ferreira. Os estados GHZ são um tipo especial de estado emaranhado, estudado pela primeira vez no final da década de 1980 por Daniel Greenberger, Michael Horne e Anton Zeilinger. No estudo, circuitos foram escritos em um chip de vidro usando laser de femtossegundos, criando guias de onda tridimensionais que permitem a manipulação precisa dos fótons.
“A produção usando matriz vítrea foi escolhida por ser de fácil prototipagem. Ela permite, com um único estágio de fabricação, produzir guias tridimensionais, ao contrário de processos tradicionais de litografia ou por feixe de elétrons. A reconfigurabilidade dos circuitos, obtida por meio de deslocadores térmicos, permite ajustes finos nas fases ópticas dos fótons, essenciais para a formação da superposição desejada”, explica Ferreira.
Ele compara a função do dispositivo em criptografia com uma analogia simples: “Imagine que você tenha quatro moedas. No estado entrelaçado GHZ, todas as moedas estarão em cara ou coroa quando observadas, nunca em uma combinação mista. Esse estado pode ser descrito como uma superposição quântica, onde cada fóton está emaranhado com os outros três. A ligação é tão forte que, ao verificar um fóton, você sabe instantaneamente o estado dos outros três, independentemente da distância entre eles.”
Este fenômeno pode ser utilizado para sistemas de compartilhamento secreto quântico. Qualquer tentativa de acesso não autorizado altera as correlações quânticas, permitindo a detecção imediata. “Se um intruso tentar medir o estado de uma das partículas, essa medição fará colapsar o estado quântico daquela partícula, alterando a correlação quântica original entre todas as partículas envolvidas. Quando os participantes legítimos do protocolo comparam uma parte de seus dados, conseguem detectar discrepâncias causadas por essa interferência”, destaca Ferreira.
Ferreira argumenta que a aplicação de estados GHZ em transações comerciais não apenas fortalecerá a segurança das comunicações, mas também oferecerá um mecanismo robusto de detecção de intrusos, essencial para proteger dados sensíveis em um mundo cada vez mais digital e interconectado. “Os sistemas quânticos, utilizando estados GHZ e outros protocolos de entrelaçamento, oferecem uma solução que não pode ser quebrada nem mesmo pelos computadores quânticos mais avançados. Qualquer tentativa de interferência em um canal quântico altera os estados das partículas envolvidas, permitindo a detecção imediata de qualquer intruso.”
A pesquisa demonstrou a viabilidade de gerar estados entrelaçados GHZ de alta fidelidade em um chip fotônico, abrindo caminho para a produção de dispositivos quânticos em escala. “Com avanços contínuos, podemos esperar a integração desses sistemas em infraestruturas de comunicação e computação, proporcionando uma nova era de segurança e eficiência”, conclui Ferreira.
O estudo foi apoiado pela FAPESP, com bolsa de pesquisa no exterior concedida ao projeto “Produção de dispositivos para fotônica quântica integrada e sensores através de microfabricação com laser de femtossegundos”. O artigo High-fidelity four-photon GHZ states on chip pode ser acessado em: www.nature.com/articles/s41534-024-00830-z