Em 1958, a Harvard Business Review previu que os computadores levariam a uma maior concentração de poder nas empresas americanas, porque permitiriam aos chefes acompanhar melhor as informações dentro das grandes corporações. Com o tempo, seguia a previsão, a economia seria dominada por algumas poucas empresas gigantescas. Em 1967, o economista J.K. Galbraith afirmou que a nova tecnologia conduziria, inevitavelmente, ao domínio crescente pelas grandes empresas, imunes às forças de mercado. Essas previsões, até agora, não se confirmaram: o porte das empresas, em média, tem diminuído e a concorrência aumentou desde os anos 60. Agora, porém, as cassandras estão de volta. De acordo com um artigo publicado recentemente na revista Wired, "a economia da competição monopolista é a economia da era da tecnologia".
Brian Arthur, um economista da Universidade Stanford, é o principal proponente da chamada teoria de lucros crescentes ("Increasing Returns and the Two Worlds of Business", por Brian Arthur, Harvard Business Press, julho de 1996). Ele diz que, em um número cada vez maior de setores existe uma tendência natural para o líder de mercado avançar ainda mais, causando uma concentração monopolista de negócios.
Segundo Arthur, a economia, tradicional, por sua vez, funciona na suposição de retornos decrescentes. A medida que uma empresa se expande, sugere a teoria, em determinado ponto ela atinge um limite, no qual os custos por unidade de produção começam a subir e os lucros unitários a cair. Por exemplo, um agricultor utiliza sua melhor terra primeiro; se ele quiser aumentar a produção, terá de usar cada vez menos terra produtiva, de maneira que seus ganhos diminuirão. Da mesma maneira, à medida que uma empresa industrial se expandir, ela chegará a algum limite, como a capacidade de sua administração ou o porte de seu mercado regional, além do qual os custos unitários crescerão. Cada produtor ampliará sua produção até atingir custos unitários crescentes. Nenhuma empresa consegue controlar o mercado, de modo que a concorrência prospera. Arthur admite que setores tradicionais, como produção de trigo e aço, são sujeitos a retornos decrescentes, mas insiste que os novos setores, baseados em conhecimento, são diferentes.
Segundo Arthur, essas empresas tendem a ter três coisas em comum. Primeiro, têm custos fixos elevados, como os de pesquisa e desenvolvimento (P&D), mas baixos custos variáveis. Por exemplo, o custo para criar um programa de computador é o mesmo, não importa o número de cópias vendidas, de modo que, quanto maiores as vendas, maior é a margem de lucro. O mesmo acontece com muitos outros setores que dependem intensamente de know-how e pouco de recursos materiais, desde a indústria farmacêutica até a bélica. Uma segunda característica comum é o que Arthur chama de "externalidades de rede". Na indústria de software, por exemplo, isso significa que, quanto mais amplamente um sistema operacional é usado, maiores as probabilidades de o sistema se tornar um padrão para o setor e mais pessoas quererão usá-lo para garantir que seu software seja compatível com o de outros usuários de rede. Isto dificulta a concorrência das empresas rivais.
O terceiro fator que fortalece o controle de um líder sobre um mercado é o efeito de vinculação do cliente. Muitos produtos de alta tecnologia são de utilização difícil e, por isso, uma vez que o cliente aprenda a usar um programa de computador, por exemplo ele relutará em trocá-lo por outro. Se todos os três fatores estiverem presentes, afirma Arthur, os retornos crescentes ampliarão a vantagem do líder de mercado. Ao reduzir seu preço, o líder consegue capturar uma parcela maior do mercado, obter lucros maiores e gastar mais em pesquisa do que seus concorrentes, acentuando ainda mais sua vantagem.
Os economistas têm estado há muito tempo cientes da possibilidade de retornos crescentes, mas acreditavam que, na prática, essa possibilidade era rara. Entretanto, a tecnologia da informação (TI) e a mudança geral das economias, de processamento de produtos tangíveis para o processamento de informações e idéias, estão fazendo com que um número cada vez maior de setores tenha ganhos crescentes, segundo Arthur. Em empresas de alta tecnologia, os elevados custos em P&D, as redes e os efeitos de vinculação são comuns. A TI e a globalização também permitem que as empresas vendam a baixo custo em um mercado mundial maior e, dessa maneira, explorem maiores economias de escala. Arthur calcula que os setores bancário e de seguros estão ficando sujeitos a retornos crescentes brandos. À medida que os bancos adotarem computadores de baixo custo e redes on-line para processar as operações dos clientes, explica, ele, os custos variáveis despencarão.
PODER LIMITADO
O banco com a maior base de clientes conseguirá distribuir seus custos fixos mais amplamente do que seus concorrentes e, portanto, oferecer as melhores taxas de juros, o que lhe permitirá atrair ainda mais clientes.
Em um mundo de rendimentos cada vez maiores, as empresas poderiam, teoricamente, crescer sem limite, acumulando enorme poder monopolista. A falta de concorrência poderia elevar os preços e obstruir o desenvolvimento tecnológico. Felizmente, a realidade não se iguala ao modelo. É verdade que uma empresa como a Microsoft consegue conquistar um mercado — pelo menos por algum tempo — ao explorar retornos crescentes, mas sua capacidade de abusar de sue poder é limitada.
Embora o porte de empresas com retornos decrescentes possa ter aumentado em alguns setores, há bons motivos para se questionar a idéia de que os retornos crescentes estão se generalizando. Um dos motivos é que a vantagem do efeito de vinculação do cliente é abrandado pelo ritmo acelerado da inovação, que favorece o surgimento de novos produtos e, conseqüentemente, abre as portas para novos concorrentes. Se um líder de mercado se torna complacente e eleva seus preços ou negligencia a P&D, ele corre o risco de ser ultrapassado por concorrentes com melhores produtos. Além disso, a concentração da produção não precisa ser nociva, desde que as barreiras ao ingresso no mercado sejam baixas: a mera ameaça de concorrência pode levar uma empresa a se comportar de maneira competitiva. A Microsoft tem um virtual monopólio em softwares para computadores pessoais, mas continua inovadora porque seus mercados são disputados. A redução dos custos das comunicações e a Internet estão ajudando a baixar as barreiras ao ingresso em muitos mercados. No passado, somente grandes empresas podiam ter condições para instalar grandes redes de dados e uma presença mundial de marketing; agora, empresas pequenas podem ter o mesmo acesso.
Outro fator que favorece as pequenas empresas é que as novas tecnologias tendem a ser menos complexas do que as antigas. Ao contrário das fábricas de automóveis e das siderúrgicas, novas empresas industriais baseadas em conhecimento podem freqüentemente ser instaladas com custo mínimo de capital: apenas um computador pessoal e uma linha telefônica. A TI também reduz o porte mínimo que uma companhia precisa ter para funcionar com rentabilidade, tornando os custos administrativos mais divisíveis. Conhecimentos legais e contábeis, por exemplo, estão hoje disponíveis online a custo relativamente baixo.
PORTE DIMINUIU
Um estudo dos economistas Erik Brynjolfsson e Thomas Malone, do MIT, concluiu que o tamanho da empresa americana média, seja em termos de número de funcionários, de faturamento, seja no valor agregado, tenha diminuído desde á década de 70, e que as empresas que mais investiram em TI tenderam a ser menores do que as outras. Durante as duas últimas décadas, o número médio de funcionários por empresa, nos EUA, declinou em 20%. Uma análise da OCDE mostra que, na maioria dos países industrializados ricos, o porte da empresa média diminuiu na maioria dos setores, exceto os de serviços de computação, medicamentos e supermercados. Isso não se deve ao fato de os trabalhadores terem sido substituídos por computadores, mas porque as empresas estreitaram seus objetivos. Os computadores fizeram com que se tornasse mais barato o envio de trabalhos a especialistas externos do que se tudo fosse feito no mesmo lugar.
Em teoria, os computadores poderiam eliminar de vez a necessidade de empresas no sentido tradicional. Em 1937, Ronald Coase, um economista ganhador do Prêmio Nobel, perguntou por que os trabalhadores foram organizados em empresas, em vez de agir como compradores e vendedores independentes de produtos e serviços em cada estágio de produção. Ele concluiu que as empresas eram necessárias devido à falta de informações e à necessidade de se minimizar os custos das transações. Um mundo sem empresas, em que a produção fosse totalmente organizada por meio de mercados, exigiria informações completas e nenhum custo de transação; mas no mundo real exige-se tempo dinheiro para se descobrir dados sobre o produto a ser comprado ou vendido. Uma empresa resolve esses problemas. Coase sustentou que o tamanho das empresas é determinado pelos custos relativos de compra de serviços de terceiros e o custo administrativo de seu fornecimento no interior da empresa.
Por exemplo, uma indústria de automóveis pode fabricar ela própria pneus, ou comprá-los de um fornecedor. Os pneus provavelmente custarão menos se forem comprados no mercado competitivo, mas parte dessa economia pode ser anulada pelos custos mais elevados de transação e coordenação. Quanto mais altos forem esses custos, maior a probabilidade de as empresas julgarem mais rentável fornecer serviços internamente, o que aumentará seu porte. Entretanto, a TI - na forma de e-mail, Internet, fax e faturamento computadorizado - reduz esses custos e, assim, aumenta a atração pela compra de produtos e serviços de fora da empresa.
À medida que esses custos declinam, afirma Peter Huber, um especialista americano em telecomunicações, a lógica tradicional da empresa fica menos convincente. Todos os tipos de produtos e serviços podem ser adquiridos de terceiros, e muitos empregados substituídos por pessoas de fora, ligadas por redes eletrônicas. Desta maneira, a TI estimula empresas gigantescas verticalmente integradas (como a AT&T) a se fragmentarem em firmas menores e mais eficientes, conectadas sem muita rigidez por redes.
Duas forças opositoras, portanto, estão em funcionamento. Em setores como software e entretenimento, em que "extemalidades de rede" são poderosas, a TI promove uma maior concentração de negócios para explorar maiores economias de escala, de modo que as empresas tendem a expandir seu porte. Em outras áreas, a queda dos custos das comunicações incentivará a descentralização.
FUTURO ON-LINE
Uma previsão correlata sobre a nova tecnologia é que esta possibilitará o "capitalismo sem atritos": os intermediários (empresas ou indivíduos que são a ponte entre produtores e consumidores) serão desnecessários. Esta opinião é forte mente defendida por Bill Gates, da Microsoft, em seu livro "A Estrada do Futuro". Através da Internet, os consumidores terão acesso direto a informações sobre produtos e serviços sem ter de pagar a intermediários. Agentes de viagens, corretores imobiliários, corretores de seguros, varejistas e até agências de namoro, estão condenados. A Internet tornará mais fácil às empresas fazerem suas próprias reservas para viagens e encontrar seus próprios imóveis. As empresas de seguros poderão vender diretamente aos clientes e não por meio de um corretor. As lojas serão eliminadas, porque os fabricantes poderão vender através de lojas eletrônicas na Internet, com clientes que farão suas escolhas on-line, em casa.
Sem dúvida, muitos intermediários serão pressionados pela Internet, mas a espécie não deverá desaparecer completamente. A redução dos custos de comunicação e transação na Internet também facilitará aos intermediários instalarem seus negócios, fornecerem serviços de informação ou boletins sob medida, por exemplo. Para ter sucesso nesse mundo mais competitivo, entretanto, os intermediários terão de ficar mais eficientes e encontrar novos meios de fornecer benefícios adicionais. Não será mais suficiente a um agente de viagens, por exemplo, vender apenas passagens e pacotes de férias. À medida que os serviços melhoram e os custos de transação despencam, os consumidores só têm a ganhar.
Notícia
Gazeta Mercantil