Uma lei que prevê redução de Imposto Sobre Serviços (ISS) e de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) para empresas de base tecnológica (EBTs) instaladas no município de Campinas, a cem quilômetros da capital de São Paulo, foi sancionada pelo prefeito Hélio de Oliveira Santos (PDT) no dia 10 de outubro e aguarda agora o decreto de regulamentação. A Lei 12.653 foi aprovada pela Câmara Municipal no dia 14 de setembro. A medida é parte das ações dos setores público e privado para atração e manutenção de empresas de alta tecnologia na cidade, e uma resposta aos incentivos que outros municípios na Região Metropolitana de Campinas estão criando nos últimos anos com o mesmo objetivo. A cidade está trabalhando no projeto urbanístico do Parque Tecnológico de Campinas, um dos cinco a integrar o Sistema Paulista de Parques Tecnológicos. A construção do parque depende do projeto de lei de revisão do Plano Diretor de Campinas, enviado em setembro para a Câmara Municipal pela prefeitura. O Instituto de Pesquisas Eldorado anunciou a construção de sua nova sede no parque e a Natura, de cosméticos, também divulgou que instalará seu centro de pesquisa e desenvolvimento no local.
A Lei de Incentivos
O projeto de lei para incentivos fiscais às empresas de base tecnológica foi aprovado no dia 14 de setembro, com três emendas. A lei prevê o abatimento de meio ponto a três pontos percentuais na alíquota do ISS e desconto de 30% a 50% no valor final do IPTU para as EBTs. Os incentivos podem ser usufruídos por seis anos, com possibilidade de prorrogação por igual período. Para que a empresa tenha direito aos benefícios, deve prestar serviços em uma das seguintes áreas: informática, pesquisa e desenvolvimento, biologia, biotecnologia, química, eletrônica, mecânica ou telecomunicações. Suas atividades devem ser concentradas em produtos e serviços tecnologicamente inovadores.
Além disso, a lei estabelece critérios que, preenchidos, valem pontos para a empresa. "Essas características vão determinar um número de pontos para a empresa e a soma de pontos determina o valor do abatimento", explica Kátia de Lara Fernandes, assessora do gabinete da Secretaria Municipal de Finanças. A empresa precisa atender a pelo menos um desses requisitos para ter direito aos benefícios. Quanto mais dessas características tiver, mais pontos e mais desconto no ISS e no IPTU conseguirá. Os pontos são determinados no anexo da lei. São eles: ter, no mínimo, 40% dos funcionários e sócios com nível superior ou 12% com nível de pós-graduação; ter recebido financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) ou de outros órgãos de fomento federais, estaduais ou internacionais até 36 meses antes da data do pedido do incentivo; ter recebido aporte de fundo de capital de risco regulado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) ou reconhecido pela Finep; ter patentes pedidas ou concedidas, Certificado de Proteção de Cultivar, registro de software ou de direito autoral, também no prazo de até 36 meses anteriores ao pedido de enquadramento junto à prefeitura; ser egressa ou residente de incubadoras.
De acordo com o texto da lei, se a empresa cumprir os índices de escolaridade determinados no primeiro parágrafo do artigo 2º, por exemplo, ela soma cinco pontos; se tiver registro de propriedade intelectual, soma dez pontos. Segundo Kátia, a prefeitura tem notícia de que já há uma empresa — cujo nome não revela — com projeto pronto para obter o benefício, assim que a lei entrar em vigor.
Pequena Empresa
A lei procura beneficiar, em especial, as pequenas empresas. Na tabela de pontuação, companhias com receita bruta anual de até R$ 500 mil recebem 20 pontos. Se for incubada ou tiver saído de incubadora, local que abriga tipicamente empresas de pequeno porte, recebe dez pontos. Também soma mais pontos a empresa que há mais tempo está instalada em Campinas — as que estão na cidade há mais de dez anos ganham 20 pontos. Empresas instaladas ou a se instalar nos pólos Ciatec I e II e na região industrial do aeroporto de Viracopos somam 15 pontos. De acordo com a lei, 50% do valor total do incentivo concedido será aproveitado imediatamente pela empresa. O restante será concedido sobre a forma de crédito tributário, para aproveitamento após 24 meses a partir do início da concessão do benefício.
A Comissão de Análise de Incentivos da Secretaria de Finanças fará a avaliação dos projetos. A lei determina que os projetos sejam avaliados em 90 dias a partir da chegada de todos os documentos necessários à prefeitura. Além disso, o Comitê Assessor de Desenvolvimento das Empresas de Tecnologia de Campinas (Cadetec), criado pela lei, funcionará como assessor técnico da comissão. O comitê é formado por 12 pessoas: duas do Ciatec, duas da Secretaria de Comércio, Indústria, Serviços e Turismo, duas da Fundação Fórum Campinas, duas do Núcleo Softex Campinas, duas da Agência de Inovação da Unicamp (Inova), uma da Associação Brasileira de Empresas de Biotecnologia (Abrabi) e uma do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp) Regional Campinas, representando o grupo das empresas do setor eletroeletrônico.
Lei é resultado da articulação de empresários da região
O projeto de lei foi resultado da articulação de um grupo de cem empresas da cidade com o setor acadêmico, representados pela Unicamp e pelo Softex. O grupo foi liderado por José Luiz Guazelli, diretor responsável pelo Techno Park Campinas, e as discussões começaram em novembro de 2005. Apenas no Techno Park estão instaladas 40 empresas, tais como a Alellyx e a CanaVialis, do setor de biotecnologia, e a Scylla, de bioinformática, financiadas pela Votorantim Ventures, a Nanocore, também de biotecnologia, a GMReis, que trabalha com biomateriais, e empresas de logística e transportes, como Trans Lovato, Mercocamp International e DHL, entre outras.
"Campinas vinha perdendo competitividade na atração de empresas, especialmente das empresas de base tecnológica, para outros municípios, que vinham oferecendo incentivos", explica Guazelli. Ele lembra oportunidades que Campinas perdeu na atração de novos investimentos, como a Dell Computadores, que se decidiu pela vizinha Hortolândia; o centro de desenvolvimento da Volks, que foi para Valinhos; a Comsat, que saiu de Campinas e também foi para Hortolândia em busca de espaço físico para instalação de seus equipamentos e observando a política industrial estabelecida pelo município; e a Motorola, que ficou em Jaguariúna.
Recursos humanos qualificados e boa infra-estrutura não bastam para atrair empresas, em especial as pequenas e de base tecnológica, caracterizadas por ter baixa rentabilidade e necessidade de altos investimentos, diz Guazelli. "A cidade não estava atraindo mais investimentos e perdia empresas que aqui nasceram para outros municípios. A proposta de incentivos fiscais que fizemos nasceu desse diagnóstico e da necessidade de mantermos nossa vocação como pólo de tecnologia", completa. Essa posição e a idéia de se criar incentivos específicos para as EBTs foi levada ao interlocutor do grupo dentro da prefeitura, o então secretário de Finanças do município, Francisco Esquelf — atualmente Paulo Mallmann ocupa a pasta — e aceita. Foram seis meses para a preparação do projeto de lei, elaborado conjuntamente. "O projeto começou com os empresários, mas o resultado final é um trabalho feito a três mãos", destaca, referindo-se à participação de empresários, do setor acadêmico e do poder público, representado pela prefeitura e pela Câmara Municipal. O mesmo grupo auxilia a prefeitura agora na elaboração do decreto de regulamentação da lei.
"A lei é enxuta, direta, não vemos grandes dificuldades no seu uso", analisa, ao ser questionado sobre se as empresas não terão problemas em usar o novo instrumento. "Não será uma discussão entre a empresa e o técnico da prefeitura, já que um dos papéis do Cedetec é ser o interlocutor entre as empresas e o poder público", completa. Ele diz que a apresentação do projeto é simples. "Trata-se de uma nova visão da política tributária, que não deve mais ser vista como uma simples política de arrecadação, mas de desenvolvimento", acrescenta. "Com esse tipo de incentivo o município deixará de perder empresas, atrairá novos investimentos e conseguirá aumentar o número de empregos qualificados, fomentar cadeias produtivas", enumera.
"Esse projeto é um complemento da lei de incentivos fiscais de Campinas [a Lei 12.471, de 10 de janeiro de 2006] que entrou em vigor em janeiro deste ano", destaca Eduardo Grizendi, Diretor de Apoio a Incubadoras e Parques Tecnológicos da Agência de Inovação da Unicamp, que participou do grupo que elaborou o projeto de lei encaminhado pela Secretaria de Finanças para a Câmara Municipal. "A lei de incentivos fiscais do começo do ano é positiva, mas atende grandes empresas e não tem mecanismos voltados para as necessidades das empresas de base tecnológica", completa. A Lei 12.471 também adota um sistema de pontuação, levando em conta a geração de empregos e renda, o valor agregado e o desenvolvimento de atividade no ramo de alta tecnologia. Determina, ainda, metas a atingir para ter redução na alíquota do ISS, IPTU e do Imposto sobre Transmissão de Bens Inter-Vivos (ITBI).
A Inova coordenou o grupo que tratou dos aspectos formais da proposta de projeto de lei para as EBTs que foi encaminhada para a prefeitura. "Na lei para as EBTs, a pontuação privilegia características que a lei de incentivos fiscais para grandes empresas não premia", destaca Grizendi. É o caso, por exemplo, de dar mais pontos para empresas que já receberam financiamento público para pesquisa e desenvolvimento. Os pontos pretendem valorizar a empresa que faz P&D.
O parque tecnológico de Campinas
O Instituto de Pesquisas Eldorado e a Natura divulgaram suas intenções de se instalar no Parque Tecnológico de Campinas, que está
O Instituto Eldorado já se encontra na área destinada ao parque, pois está instalado dentro do CPqD, no Ciatec II. A Natura vai levar para Campinas suas atividades de pesquisa, hoje localizadas na sede da companhia, em Cajamar, na Grande São Paulo. Segundo o superintendente do Instituto Eldorado, Arthur Catto, a nova sede terá cerca de 9 mil metros quadrados e ficará em um terreno de 25 mil metros quadrados situado ao lado da Unicamp, entre os terrenos da Fundação da Unicamp (Funcamp) e do Softex. "O Eldorado vem crescendo desde o início de sua operação, em 1999. No ano passado, crescemos mais de 80% com uma série de novos projetos que demandam mais espaço para desenvolvedores e laboratórios", justifica. O instituto espera apenas a aprovação da prefeitura para dar início às obras, que deverão ser concluídas em 12 meses. A entidade procurou o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e estuda outras fontes de financiamento para a obra, calculada em R$ 12 milhões. "Estamos também iniciando contatos com bancos privados, procurando analisar a possibilidade de doações amparadas na legislação para entidades com fins não econômicos, como é o caso do Eldorado", completa.
O Eldorado deixará a área que ocupa hoje no CPqD após a conclusão total das obras. "No entanto, nosso laboratório de ensaios de compatibilidade eletromagnética continuará no CPqD", afirma. Isso acontecerá porque o instituto quer manter sua parceria com o CPqD e a desmontagem e remontagem desses equipamentos custaria quase o preço de um novo laboratório. A obra permitirá a ampliação dos laboratórios existentes na área de hardware, software e serviços. "Porém, no decorrer do próximo ano, poderemos ter novas aquisições dependendo dos projetos contratados", acrescenta. Com a nova sede, haverá um aumento do quadro de funcionários em torno de 15%, principalmente para projetos de desenvolvimento de hardware e software. Todos os funcionários são contratados pelo regime da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), inclusive os pesquisadores; 90% deles têm nível superior e um terço destes tem pós-graduação.
O Instituto Eldorado trabalha com projetos incentivados pela Lei de Informática. "Há um grande empenho em ampliar essa área de atuação também para projetos não incentivados, já pensando no término dos incentivos da lei, previsto para 2019", explica Catto. Essa ampliação, segundo ele, já está sendo posta em prática, com a participação do instituto no Projeto CI Brasil, que integra o Programa Nacional de Microeletrônica e tem por objetivo instalar no País uma série de design houses, os centros de desenho de circuitos integrados, uma das etapas da fabricação de chips. Contudo, essa ampliação de nichos buscando a sustentabilidade do instituto no longo prazo não tem relação com a mudança para nova sede.
A Natura não divulga detalhes do que fará no seu novo centro de pesquisa