A imunização de toda a população adulta do município de Serrana, no interior paulista, com a vacina CoronaVac, do Instituto Butantan, fez os casos sintomáticos de Covid-19 despencarem 80%, as internações, 86%, e as mortes, 95% após a segunda vacinação do último grupo (veja os intervalos de confiança abaixo). Essa é a principal conclusão do Projeto S, estudo clínico de efetividade inédito no mundo realizado pelo instituto na cidade.
A redução foi constatada por meio da comparação dos dados desde o início do projeto – até completar a vacinação de todos os grupos – com o restante do trimestre avaliado (fevereiro, março e abril de 2021).
Os resultados também mostraram que a vacinação protege tanto os adultos que receberam as duas doses do imunizante quanto as crianças e adolescentes com menos de 18 anos, que não foram vacinados. “A redução de casos em pessoas que não receberam a vacina indica a queda da circulação do vírus. Isso reforça a vacinação como uma medida de saúde pública, e não somente individual”, explica o diretor de ensaios clínicos do Instituto Butantan, Ricardo Palacios, também diretor do estudo.
“O resultado mais importante foi entender que podemos controlar a pandemia mesmo sem vacinar toda a população. Quando atingida a cobertura de 70% a 75%, a queda na incidência foi percebida até no grupo que ainda não tinha completado o esquema vacinal”, concluiu Palacios.
Cinturão imunológico
Outra conclusão importante é a avaliação da incidência da doença em Serrana na comparação com as cidades vizinhas. Serrana tem cerca de 10 mil moradores que trabalham em Ribeirão Preto diariamente. Porém, enquanto Ribeirão Preto e cidades da região vêm apresentando alta nos casos de Covid-19, Serrana manteve taxas de incidência baixas graças à vacinação. Ou seja, além da queda das infecções, os moradores que transitam em outras cidades não trouxeram um incremento relevante nos casos.
O Projeto S criou um “cinturão imunológico” em Serrana, uma barreira coletiva contra o vírus, reduzindo drasticamente a transmissão no município.
“As importantes conclusões do estudo poderão embasar as estratégias de imunização no Brasil e no mundo, e oferecem uma esperança do controle da pandemia com vacinas como a CoronaVac”, afirma o presidente do Instituto Butantan, Dimas Covas. “Não precisamos criar ilhas para atingir a imunidade da população”, complementa Ricardo Palacios. “Nós conseguimos satisfazer a vontade das pessoas de retomarem suas vidas quando a vacina é ofertada. Isso nos gera uma luz de esperança”, completa.
A pesquisa, pioneira no mundo, foi desenvolvida pelo Butantan, aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP e avaliada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Foi realizada em parceria com a Secretaria de Saúde e a Prefeitura Municipal de Serrana. O objetivo do projeto é entender qual a efetividade da CoronaVac, ou seja, como a imunização de toda uma população pode afetar o curso da epidemia. Na prática, entender como a vacina se comporta no mundo real.
Imunização escalonada
O método utilizado para o ensaio clínico é chamado de implementação escalonada por conglomerados (stepped-wedge trial). Serrana foi dividida em 25 áreas, formando quatro grupos: verde, amarelo, cinza e azul – que receberam o imunizante seguindo esta ordem. A vacina foi ofertada a todos os maiores de 18 anos elegíveis para o estudo nestas áreas, de forma sequencial, em quatro etapas.
Entre 17 de fevereiro e abril deste ano, ao longo de oito semanas, cerca de 27 mil moradores do município receberam o esquema vacinal completo: duas doses da CoronaVac com intervalo de 28 dias entre a primeira e a segunda. Isso representou uma cobertura próxima a 95% da população adulta, segundo censo de saúde feito previamente pelo Butantan.
Ricardo Palacios explica que o método de escalonamento permitiu avaliar e comparar as quatro áreas vacinadas. “Percebemos que os fenômenos observados não acontecem aleatoriamente, mas se repetem nos quatro grupos em momentos diferentes”, afirma.
“A vacina é segura, eficaz, eficiente, de altíssima qualidade, e contribui para prevenir o desenvolvimento da doença, complicações e óbitos entre os infectados. Agora também sabemos que ela provoca efeito benéfico em uma população inteira, protegendo tanto os vacinados quanto os não vacinados e reduzindo a circulação viral de forma expressiva”, conclui Dimas Covas.
– Queda de 80% (IC95 76,9% – 82,7%)
– Queda de 86% (IC95 74,1% – 92,3%)
Mortes
– Queda de 95% (IC95 62,7% – 99,3%)
(Com informações do Instituto Butantan)