Agência FAPESP
Estima-se que na Amazônia brasileira, cuja avifauna é uma das mais ricas e complexas do planeta, existam cerca de mil espécies de aves, sendo pelo menos 30 delas endêmicas da região. O número, que é subestimado por conta dos poucos estudos existentes com esse enfoque, corresponde a cerca de 10% do total de aves existentes no mundo.
Mas até que ponto essa enorme diversidade de aves pode ajudar os cientistas a entender a formação do território da região amazônica? A questão foi discutida por Joel Cracraft, do Museu Americano de História Nacional, em Nova York, durante o simpósio internacional “Biologia evolutiva e conservação da biodiversidade: aspectos científicos e sociais”, que teve início nesta segunda-feira (10/11), na sede da FAPESP.
“Tenho muito interesse em entender a história evolutiva da Amazônia e, para isso, conto com vários colaboradores aqui no Brasil. Para isso, precisamos responder a várias perguntas, entre as quais como a biota da Amazônia foi formada com o passar dos séculos do ponto de vista taxonômico”, apontou.
Cracraft citou, como uma de suas parcerias no Brasil, a bióloga Camila Ribas, do Laboratório de Genética e Evolução Molecular de Aves da Universidade de São Paulo. Ele foi orientador de pós-doutorado de Camila, que reconstruiu a história evolutiva dos papagaios do gênero Pionus com o auxilio de métodos de biogeografia.
Com base em seus estudos sobre as aves da Floresta Amazônica, Cracraft falou sobre a dificuldade de se entender os padrões da biogeografia – especialidade que analisa a distribuição geográfica da diversidade biológica – na região.
“Esses padrões na Amazônia são muito complexos e variam muito de um grupo de aves para outro. Por isso, muitas páginas já foram escritas para tentar revelar a origem das espécies da floresta, que para mim é um grande laboratório para o estudo da evolução das aves pelo mundo”, afirmou.
Outra lacuna no processo de entendimento da história evolutiva da Amazônia é a falta de registros fósseis dos organismos que se deseja analisar. “Mesmo assim, acredita-se que alguns gêneros de aves chegaram durante o período Mioceno e, por isso, elas talvez já existissem na bacia Amazônica entre 30 milhões e 50 milhões de anos atrás”, disse.
Esses estudos sugerem, de acordo com ele, que várias linhagens de aves que hoje são endêmicas possivelmente já habitavam a região nesse período. “Por isso, será que já não houve extinção de espécies de pássaros na região?”, questionou.
Por outro lado, apontou Cracraft, não é preciso ir muito longe, até o Mioceno, uma vez que muitos estudos sobre a região amazônica remontam ao Paleolítico, que vai de, aproximadamente, 2 milhões de anos até 10 mil anos antes de Cristo.
“A história da Amazônia no Paleolítico é extremamente complexa. Além de não sabermos o suficiente sobre essa história, o que sabemos tem mudado muito rapidamente nas últimas décadas”, apontou.
Há muita controvérsia sobre o assunto, mas outros estudos com base em análises biogeográficas da avifauna da região sugerem que a formação do território da Amazônia pode ter ocorrido há menos tempo do que se imagina.
“Uma das hipóteses aceitas hoje é a de que a Amazônia teria sido formada entre 2 milhões e 2,5 milhões de anos atrás”, disse o cientista. Os rios Negro e Madeira, segundo ele, teriam se formado há cerca de 800 mil e 1 milhão de anos, respectivamente.
“Grande parte da biodiversidade amazônica pode ser muito mais jovem do que se possa supor. Além de mais estudos filogenéticos, precisamos de melhores métodos biogeográficos para entender toda a complexidade da região amazônica, que está muito além da capacidade de qualquer metodologia conhecida atualmente”, disse.