O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços Ecológicos (ICMS-E), incentivo tributário à conservação de áreas nativas, vem estimulando a criação de reservas na Mata Atlântica nos últimos anos, mas com impactos de alcance limitado. A maior parte é formada pelas áreas de proteção ambiental (APAs), que impõem menos restrições ao uso da terra. Além disso, o incentivo financeiro perde atratividade ao longo do tempo. Essas são algumas conclusões de pesquisadores da USP em artigo na revista científica Ecological Economics, em setembro.
O ICMS Ecológico é a transferência fiscal de verbas com base em critérios ambientais. Em outras palavras, os governos estaduais transferem dinheiro para as cidades para compensar, por exemplo, custos com conservação da biodiversidade. A proporção de unidades de conservação em cada município tem sido o principal critério para os repasses do imposto, que vem sendo implementado em 16 Estados brasileiros desde 1996.
O estudo da USP ganha ainda mais relevância às vésperas da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP-26, que reunirá 197 nações em novembro, em Glasgow e discutirá, entre outros assuntos, o financiamento para combater e se adaptar às mudanças do clima.
MODELO SEGUIDO. Concebido no Brasil, mais precisamente no Paraná, em 1991, e considerado altamente inovador, o ICMS Ecológico é seguido por países como Portugal, França, China e Índia. Alemanha e Polônia têm propostas parecidas, ainda não implementadas.
Pioneiro, o estudo da USP analisa os efeitos do ICMS Ecológico no aumento dos diferentes tipos de unidades de conservação. As APAS analisadas foram as preferencialmente criadas por municípios, onde o processo legal é o menos custoso e não requer desapropriação. Além disso, têm poucas restrições quanto ao uso da terra. Permitem agricultura de subsistência, plantio e retirada de algumas espécies e moradia, segundo os planos de manejo de cada área. Um exemplo é a APA Água Santa de Minas, em Tombos (MG). A área de 15.680 hectares abriga importantes remanescentes de Floresta Estacional Semidecidual e 252 nascentes. Seu plano de manejo, feito pelo Centro Brasileiro para a Conservação da Natureza e a Universidade Federal de Viçosa, foi considerado consistente pelo Ministério do Meio Ambiente.
As áreas de proteção integral, como o Parque Estadual da Serra do Mar, não permitem moradia e exigem a aquisição das terras pelo Estado. Só são permitidos pesquisa e turismo em algumas. Já as estações ecológicas só liberam pesquisa. Mas o efeito do ICMS-E na criação de APAs é quase sete vezes maior do que para outros tipos de reservas. “As APAS são menos potentes do que as áreas de proteção integral”, explica Jean Paul Metzger, professor do Instituto de Biociências da USP e um dos coautores do estudo.
Os pesquisadores também argumentam que o sistema é autolimitado, pois o incentivo fiscal diminui à medida que aumentam as áreas protegidas. “Quando os municípios criam novas Unidades de Conservação, a fatia do bolo, que é o porcentual do ICMS destinado a estas áreas, é dividido entre mais áreas, e a proporção que cada um recebe diminui”, explica Patricia Ruggiero, primeira autora do artigo e pós-doutoranda no Departamento de Economia da Faculdade de Economia, Administração e Ciências Contábeis da USP.
Para identificar o impacto do sistema fiscal na criação de áreas protegidas, o estudo analisou 1.467 municípios em seis Estados (Paraná, Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Espírito Santo) na região da Mata Atlântica entre 1987 e 2016. A conclusão é de que o ICMS-E pode ser aperfeiçoado. “É uma ferramenta importante, mas não podemos achar que resolverá os problemas ambientais sozinha”, afirma Ruggiero.
No Estado de São Paulo, o ICMS-E teve alterações no primeiro semestre. O porcentual passou de 1% para 2%, e a estimativa é de que sejam transferidos mais de R$ 5 bilhões pelos próximos dez anos aos municípios, com a expectativa de recuperar 700 mil hectares de vegetação nativa até 2050. O foco são áreas que não são de restauração obrigatória e não se distinguem por atividades econômicas. “Cidades de regiões menos desenvolvidas serão as mais beneficiadas, como as do Vale do Ribeira, no sul do Estado”, explica Marco Vinholi, secretário de Desenvolvimento Regional.