A janela de oportunidade para o Brasil desenvolver tecnologias de inteligência artificial (IA) é curta e medidas precisam ser tomadas com urgência para evitar que o País fique para trás nesse campo do conhecimento. O alerta foi feito por um grupo de trabalho da Academia Brasileira de Ciências (ABC), composto por 16 acadêmicos e pesquisadores de diferentes universidades de Norte a Sul do País. Eles produziram um relatório com uma série de recomendações para acelerar o desenvolvimento da IA no Brasil, sem perder de vista preocupações éticas e sociais. O documento será enviado ao Conselho Nacional de Tecnologia (CCT) do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e foi apresentado ao público nesta quinta-feira, 9, na sede da ABC, no Rio de Janeiro.
“Sem investimentos adequados e políticas públicas duradouras e apropriadas, o quadro global de IA pode empurrar o Brasil para um declínio tecnológico sem precedentes. A lacuna entre os países que estão na vanguarda de PD&I em IA e os demais países cresce a taxas exponenciais”, alertam no relatório. E prosseguem: “É imperativo que o Brasil estabeleça políticas públicas e investimentos para reverter essa tendência sem demora. Se persistir a inércia, o impacto negativo será sentido a curto prazo na educação, nos demais índices sociais e na economia, com a consequente falta de competitividade empresarial em todas as áreas.”
Investimento, regulamentação, educação e política de acesso a dados
Entre as recomendações que constam no relatório, está a criação de uma agência de fomento da IA, nos moldes da Embrapii, e com orçamento compatível com aquele de outros países com protagonismo tecnológico, na casa de R$ 1 bilhão por ano ao longo dos próximos cinco anos.
Também é destacada a necessidade de se estabelecer uma política pública para acesso aos grandes bancos de dados de órgãos públicos, como SUS, Inep-MEC, IBGE etc. É sugerida a criação de uma rede nacional de centro de dados coordenada por alguma instituição do governo federal. Essas fontes de dados são importantes insumos para modelos de IA e despertam o interesse de atores nacionais e estrangeiros.
Os cientistas reconhecem a importância de se definir uma regulamentação para IA no Brasil, especialmente para minimizar riscos éticos e sociais. Porém, enfatizam a importância de a comunidade científica participar do processo de elaboração dessa regulamentação. Recomendam ainda que quaisquer regras não se sobreponham desnecessariamente a leis já existentes e que não limitem o trabalho de pesquisa e inovação. Além disso, defendem que haja um esforço de comunicação para que a sociedade compreenda a regulamentação.
A necessidade de se investir em educação é outro destaque do relatório. Os cientistas pedem que sejam criados centros de pesquisa e desenvolvimento, em parcerias que envolvam governo, universidades e a iniciativa privada, e de preferência focando na solução de problemas locais. E lembram da importância de o País formar profissionais especializados em IA e oferecer condições para que fiquem no Brasil, evitando a fuga de cérebros para o exterior.
“Temos perdido recursos humanos qualificados. Sem isso não tem como avançarmos. Precisamos de uma política para retê-los”, comentou Virgílio Almeida, diretor da ABC e coordenador do grupo de trabalho, durante a apresentação do relatório. Uma sugestão para melhorar a retenção de talentos é facilitar a fundação de startups dentro das universidades para que os pesquisadores nacionais possam comercializar os resultados das suas pesquisas.
O grupo de trabalho que elaborou o relatório contou com 16 pesquisadores de diferentes áreas, incluindo ciências da computação, ciências sociais, física, saúde, dentre outras. Compõem o grupo: Adalberto Fazzio (USP), Altigran Soares da Silva (UFAM), Anderson da Silva Soares (UFG), André Carlos Ponce de Leon Ferreira de Carvalho (USP), Edmundo Albuquerque de Souza e Silva (UFRJ), Elisa Reis (UFRJ), Fabio Gagliardi Cozman (USP), Helder Nakaya (Hospital Israelita Albert Einstein), José Roberto Boisson de Marca (PUC-Rio), Luís Lamb (UFRGS), Mário Veiga Ferraz Pereira (PSR), Nivio Ziviani (UFMG), Soraia Raupp Musse (PUC-RS), Teresa Bernarda Ludermir (UFPE), Virgílio Almeida (UFMG) e Wagner Meira Júnior (UFMG).