Nildo e Rony são personagens principais e dão nome a uma história em quadrinhos (HQ) especial, que busca orientar pacientes que sofreram uma lesão traumática do plexo braquial e seus familiares. O nome parece complicado, mas as lesões são familiares para quem se envolveu em acidentes de trânsito, principalmente em motos – mais de 80% dos traumas são decorrentes desse tipo de acidente.
O plexo braquial é o conjunto de nervos que faz a comunicação entre os membros superiores e o cérebro. Tudo que se passa com os nossos braços, ou seja, as sensações e os movimentos dos ombros, cotovelos, antebraços, punhos e mãos, depende da saúde e da integridade do plexo braquial. A lesão nessa região traz um comprometimento desse conjunto de nervos e, consequentemente, dessas habilidades.
Para esclarecer sobre o trauma, a Abraço – Ação Neuromat para a Lesão do Plexo Braquial – decidiu criar a história em quadrinhos Os braços de Nildo e Rony. A Abraço é uma rede de apoio e acolhimento para pacientes e seus familiares, que sofrem com o problema.
Ela é uma iniciativa do Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão em Neuromatemática (Cepid Neuromat) – sediado na USP, em São Paulo, com apoio da Fapesp, em parceria com o Núcleo de Pesquisas em Neurociências e Reabilitação (NPNR) do Instituto de Neurologia Deolindo Couto (INDC) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
“Originalmente, a HQ surgiu como uma cartilha, queríamos poder contar para o paciente de maneira clara e cientificamente correta o que é lesão do plexo braquial, os tipos de cirurgia, atendimento fisioterápico e divulgar a plataforma Abraço”, explica a neurocientista Claudia Domingues Vargas, coordenadora da Abraço e pesquisadora do Cepid Neuromat.
De acordo com a cientista, há graus variados de lesões do plexo braquial, desde leve, com pouco comprometimento da função do membro superior, a extenso rompimento dos nervos. “Nesse caso, é necessário fazer reconstrução cirúrgica utilizando enervação remanescente que foi menos comprometida. Essa é a abordagem principal hoje disponível, além do acompanhamento fisioterápico para devolver sensibilidade e força desses pacientes com ou sem cirurgia.”
A HQ foi roteirizada por Antonio Galves, professor do Instituto de Matemática e Estatística (IME) da USP e coordenador do Cepid Neuromat, e conta com ilustrações de João Magara.
A história relata um encontro de duas personagens antagônicas: Josenildo da Silva, ou Nildo, que trabalhava como motoboy quando sofreu um acidente, e Ronaldo Andrade de Alencar, Rony, médico que levou um tiro em assalto à mão armada.
Apesar do abismo social entre os dois, a casualidade os une após o acidente, que promove algo em comum além da já existente paixão pelo Corinthians: a lesão dos nervos que ligam o braço ao cérebro, causando a perda de movimentos.
Galves conta que o personagem Rony existe de fato e que, na HQ, apenas seu nome foi trocado. “Dos dois personagens, um deles é real. É um médico que realmente levou um tiro. A história é um esforço para dizer que são duas pessoas muito diferentes, mas que estão no mesmo drama em saber o que será da vida deles.”
Para ler a história em quadrinhos é só acessar este link.
A história em quadrinhos é apenas uma das formas das quais a Abraço se utiliza para a difusão de conhecimento. Além dela, são produzidos vídeos e outros conteúdos para a plataforma on-line. Essas informações são baseadas em pesquisas científicas que estão sendo realizadas no Neuromat sobre as lesões do plexo braquial.
“Como o cérebro reage após uma lesão do plexo braquial? Já existe muita evidencia científica de que existe modificações na rede cerebral que codifica o membro, no caso de uma lesão periférica e de uma reconstrução cirúrgica. Como o cérebro vai ler essa nova situação e quais são os limites para isso? A nossa meta é entender e contribuir para esses fenômenos”, explica Claudia.
O centro de pesquisa Neuromat, que agrega a Abraço e outras iniciativas, está localizado no campus Cidade Universitária da USP, em São Paulo. Ele foi criado em 2013 com apoio da Fapesp e conta com uma equipe interdisciplinar composta de jornalistas, neurocientistas, físicos, biólogos, matemáticos, estatísticos e profissionais da ciência da computação de diversas universidades do Brasil, Estados Unidos, Argentina, Itália, França, Uruguai e Holanda.
Possui como missão a contribuição para o desenvolvimento de uma nova teoria do cérebro – a neuromatemática – abordando questões centrais da neurobiologia através do uso da modelagem matemática e neurociência teórica.
“Estamos convencidos de que o conjunto de fenômenos observados em laboratório de neurobiologia, de dados que foram coletados, levam a perguntas que não poderão ser formuladas de maneira clara se não se usar linguagem adequada. Essa linguagem é a matemática e essa matemática ainda está em boa parte por ser feita”, segundo o coordenador do Cepid.
A neuromatemática é baseada na construção de modelos probabilísticos para o desenvolvimento de dados, e se propõe a entender a codificação e o processo de estímulos externos pelo cérebro. “Lutamos para modelar e perceber as regularidades que não são perceptíveis a olho nu”, conta Galves.