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Gazeta Mercantil

Grandes ondas tecnológicas (1 notícias)

Publicado em 01 de outubro de 1996

Por Pam Woodall - The Economist
Desde o tear mecânico ao último computador, novas tecnologias sempre despertam medo nos corações dos trabalhadores. Mas novos métodos de produção, novos produtos ou novas formas de organização industrial são a principal força motriz por trás do crescimento econômico e, portanto, do aumento do padrão de vida. As economias têm quantidades limitadas de capital e.trabalho. Sem progresso tecnológico, as oportunidades de crescimento, como tempo, se esgotarão. O crescimento só pode ser sustentado pela descoberta de novos e melhores modos de utilização dos recursos limitados do planeta. Durante os dois últimos séculos, o PIB real per capita das economias industrializadas ricas cresceu, em média, 1,6% ao ano, uma taxa à qual a renda per capita dobra a cada 44 anos. Entretanto, historicamente, tal crescimento tem sido a exceção, não a norma. É claramente difícil ser preciso a respeito das cifras, mas estimativas brutas sugerem que, nos 13 séculos até 1800, a produção real per capita na Europa Ocidental avançou uma média de não mais que 0,1-0,2% ao ano. Nesse ritmo, os padrões de vida não melhoram de modo perceptível durante a vida de uma pessoa, e as rendas reais dobram apenas a cada 500 anos. O que mudou nos tempos modernos foi o ritmo da inovação tecnológica. Na Idade Média apareceram apenas algumas invenções, tais como moinhos de vento e ferraduras para cavalos, mas o progresso tecnológico foi imperceptível em comparação com.o que acontece agora. Desde Adam Smith, os economistas têm reconhecido que, a longo prazo, a mudança tecnológica é importante para o crescimento, mas apenas nas últimas duas décadas eles vêm estudando o assunto com seriedade. Os tradicionais modelos "neoclássicos" de crescimento, desenvolvidos nos anos 1950, concentravam-se em trabalho e capital. Quando você acrescenta mais de cada insumo, diz a teoria a produção aumenta. Mas esses modelos tinham uma qualidade paradoxal: a longo prazo, a taxa de investimento não tem efeito sobre a taxa de crescimento da economia. No chamado estado constante, o crescimento per capita da produção está destinado a ser zero - a menos que ocorra progresso tecnológico na economia. Mas as mais simples variações do modelo não fizeram referência alguma a mudanças tecnológicas - a única coisa que, na análise do próprio modelo, realmente importava. A ÚLTIMA DAS GRANDES ONDAS TECNOLÓGICAS Por ser aplicável em todos os setores da economia, a tecnologia da informação (TI) tem conseqüências bem diferentes das que tiveram as tecnologias que a precederam. O progresso tecnológico era visto como algo que simplesmente caía do céu. Estudos mostram que, na maioria das economias, uma maior utilização de trabalho e capital mal foi responsável por metade do crescimento total da produção neste século. O imenso resíduo inexplicado foi denominado de "mudança tecnológica", mas na verdade na verdade se tratou de uma medida da ignorância dos economistas. Depois foi a vez da "nova" teoria do crescimento, elaborada em meados da década de 80 pelo trabalho inovador de Paul Romer, um economista da Universidade Stanford. A teoria tentou incorporar a tecnologia diretamente nos modelos de crescimento econômico, explicando como o conhecimento tanto na forma de tecnologia quanto na de capital humano é criado e difundido por meio da economia. Idéias, ao contrário de insumos materiais, não são escassas em si mesmas. Novas idéias para processos mais eficientes e novos produtos podem, portanto, tornar possível o crescimento contínuo. Nova Sensação Até esse trabalho recente, Joseph Schumpeter era um dos poucos economistas que haviam tentado explicar o crescimento sobretudo em termos de inovação tecnológica, e o interesse por sua teoria foi retomada nos últimos anos. Na década de 30, ele apresentou um modelo que postulava crescimento por meio da interação de surtos de desenvolvimento tecnológico e competição entre empresas. Schumpeter via o capitalismo se movendo em longas ondas: a cada 50 anos, aproximadamente, revoluções tecnológicas podiam causar " vendavais de destruição criativa", durante os quais velhas indústrias seriam varridas e substituídas por outras novas. Cada onda de tecnologia alimentaria um aumento súbito dos investimentos e forneceria uma porção de empregos novos em novas indústrias. Como evidência, os adeptos de Schumpeter apontam a história moderna. A primeira grande onda, dos anos 1780 aos anos 1840, trouxeram a energia a vapor, que conduziu a revolução industrial; a segunda, dos anos 1840 aos anos 1890, introduziu as ferrovias; a terceira, da década de 1890 à década de 1930, produziu a energia elétrica; e a quarta, da década de 1930 à de 1980, foi alimentada por petróleo barato (e pelo automóvel). Agora, argumenta-se, a quinta longa onda está sendo alimentada pela tecnologia da informação (TI). Prever as conseqüências de uma nova tecnologia é extraordinariamente difícil. A história está repleta de exemplos de pessoas aparentemente sensíveis e organizações respeitáveis que se tornam desvairadamente iníquas. Em 1876, a Western Union, uma companhia telegráfica, recebeu uma oferta para comprar a patente do telefone de Graham Bell. A empresa rejeitou a oferta porque "o aparelho é inerentemente sem valor para nós". Em 1899 o Comissário da Agência de Patentes dos EUA recomendou que seu organismo fosse extinto, porque "tudo que podia ser inventado já foi inventado". E, na década de 1940, Thomas Watson, então "chairman" da IBM, previu um mercado mundial para talvez cinco computadores; ele não foi capaz de prever quaisquer possibilidades comerciais para eles. A Tecnologia da Informação (TI), por sua vez, já atraiu sua parte de previsões que provaram estar bem afastadas do alvo. Vinte anos atrás, falava-se muito mais sobre o escritório sem papéis e a sociedade sem dinheiro que a nova tecnologia traria. Mas papel e dinheiro ainda estão conosco - no caso do papel, ainda mais que antes. Ainda assim os sábios persistem em argumentar que a TI é diferente, em gênero, das tecnologias anteriores e, portanto, terá conseqüências econômicas vastamente diferentes. Sua primeira característica peculiar é sua difusão absoluta. Ela não apenas pode ser aplicada por todos os setores da economia (o que também foi verdadeiro no caso da eletricidade), como também pode afetar cada função dentro de uma empresa. Para citar apenas alguns exemplos, a TI pode melhorar o desempenho de um trator numa fazenda, o projeto, a fabricação e a comercialização de um carro; também melhora o diagnóstico e a ministração de assistência médica. Ao contrário da energia a vapor ou da eletricidade, a TI pode ser tanto um insumo quanto um produto final; é capaz d revolucionar a produção e distribuição de outras indústrias e serviços, mas também oferece uma vasta faixa de novos produtos e serviços próprios. Uma segunda característica importante é o vertiginoso declínio dos preços do poder do processamento do computador, que caiu, em média de 30% ao ano em termos reais durante as duas últimas décadas. Segundo uma estimativa, o trabalho do computador custa agora apenas um centésimo de 1% do que custava no início da década de 70. Muitos especialistas esperam que os preços continuem a cair rapidamente durante pelo menos os próximos dez anos. Se os automóveis tivessem se desenvolvido no mesmo ritmo dos microprocessadores durante as duas últimas décadas, um carro comum custaria, hoje, menos de US$5 e teria rendimento de cerca de 105 mil quilômetros por litro de combustível. Jamais o mundo viu uma queda tão significativa no preço de um insumo industrial. Quando a energia a vapor foi aplicada pela primeira vez, não era tão barata quanto a força hidráulica, e seu preço real quase não mudou desde a década de 1790 até meados da década de 1830. Foi necessário esperar até 1850 para que seu preço caísse para a meta e de seu nível em 1790. Da mesma forma, entre 1890 e 1930, o preço da eletricidade caiu cerca de 65%, um declínio de apenas 2 a 3% ao ano. Preços em queda, uma das melhores medidas da rapidez do progresso tecnológico, confirmam a impressão de que o ritmo da mudança se acelerou. O rápido declínio dos preços também encoraja mais pessoas a comprar computadores, permitindo a difusão acelerada da tecnologia. Em comparação, o alto custo do telégrafo inibiu seu uso por décadas: nos anos 1860, a uma libra a palavra, um telegrama transatlântico (equivalente a 40 ou 60 libras, US$ 62 a US$ 93 hoje), poucas empresas poderiam se dar ao luxo de usá-lo. Ciclos de produtos contam a mesma história de mudança mais acelerada: 70% das receitas do setor de computadores são geradas por produtos que não existiam há dois anos. Um Mundo Encolhido Uma vantagem especial da TI é que ela reduz os custos das comunicações e das transações, ajudando os mercados a funcionar com mais eficiência. Uma chamada telefônica de três minutos entre Nova York e Londres custa, atualmente, cerca de US$ 2. Em 1930, teria custado mais de cem vezes os preços de hoje. A queda dos custos deverá se acelerar na próxima década, graças a enormes avanços técnicos, maciço aumento na capacidade de transmissão e concorrência crescente competição. Alguns prevêem que os custos marginais das telecomunicações cairão para algo próximo a zero, para chamadas internacionais e também para chamadas locais. Simon Forge, da consultoria Cambridge Strategic Management Group, prevê, no estudo "As Conseqüências das Tendências das Telecomunicações para a Competitividade dos Países em Desenvolvimento", feito para o Banco Mundial em 1995, que até o ano 2005 uma chamada de videofone custará apenas alguns centavos por hora. Talvez uma das mais importantes características da TI é que ela lida com o conhecimento. Mais e mais conhecimentos agora podem ser codificados: informações, na forma de números ou voz, podem ser reduzidas à forma digital e armazenadas em computadores, como uma série de zeros e números 1. Isso permite que o conhecimento seja difundido mais rapidamente, e fica mais fácil para os países em desenvolvimento alcançarem os outros. A codificação do conhecimento e os baixos custos e transmissão também facilitam as transações dos serviços, pela eliminação da necessidade de contato direto entre produtores e consumidores, e também liberam a produção, permitindo que as empresas sediem diferentes partes de seus negócios em países diferentes e façam a conexão entre eles por redes de computadores. Os entusiastas da TI citam outro ponto a seu favor: ela exige menos recursos do que as tecnologias anteriores e é potencialmente mais favorável ao ambiente. Enquanto os automóveis, ferrovias e motores a vapor usavam matérias-primas e energia em grande escala, a TI acelera a mudança para uma economia "sem peso", na qual uma parcela crescente da produção toma a forma de bens intangíveis. A TI oferece também, enorme potencial para reduzir a poluição e os congestionamentos, por meio do "teletrabalho" e das "telecompras", que tornarão muitas viagens desnecessárias. Forge afirma, com otimismo, que por volta de 2005 um quinto de todos os trabalhadores dos países ricos estará "teletrabalhando", seja em horário parcial, seja integral. Mas vale a pena lembrar que, quando surgiu o automóvel, foi visto como uma alternativa mais favorável ao ambiente do que os veículos puxados a cavalo, que, no final do século XIX causavam sérios engarrafamentos de tráfego em Londres, e inundavam as ruas com esterco. Os carros pareciam reduzir drasticamente a poluição, embora hoje sejam vistos como inimigos do planeta. Neste ano, coincidentemente, completa-se tanto o centenário do primeiro automóvel produzido em massa quanto o cinqüentenário do primeiro computador. Como a história julgará a revolução da TI daqui a 50 anos? O que a TI pode fazer pela produtividade - e por que ainda não fez mais?