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Pesquisadores identificaram no Nordeste brasileiro o fóssil da formiga mais antiga já descoberta. A Vulcanidris cratensis, um inseto alado de mandíbulas semelhantes a foices, viveu há cerca de 113 milhões de anos, durante o período dos dinossauros. O fóssil foi preservado em camadas de calcário da formação geológica do Crato, no Ceará.
A espécie pertence a uma linhagem extinta chamada formigas-do-inferno, assim batizadas por suas mandíbulas de aparência incomum. Esses insetos prosperaram durante o Cretáceo em diversas regiões do planeta, mas não deixaram descendentes vivos. Outro exemplo do grupo, a Haidomyrmex, já havia sido descoberta em âmbar em Mianmar, recebendo nome inspirado em Hades, o deus grego do submundo.
Com aproximadamente 1,35 centímetro de comprimento, a Vulcanidris exibia mandíbulas especializadas para capturar ou perfurar presas. Assim como algumas formigas atuais, possuía asas e era capaz de voar. Também apresentava um ferrão desenvolvido, semelhante ao das vespas.
“ Provavelmente seria confundida com uma vespa por olhos não treinados ”, afirmou Anderson Lepeco, entomologista do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo e autor principal do estudo publicado na revista *Current Biology*.
Segundo Lepeco, as mandíbulas da Vulcanidris moviam-se verticalmente, diferente das formigas modernas, cujos movimentos são horizontais. “Hoje em dia encontramos mandíbulas de formas exóticas entre as formigas, mas a articulação geralmente é lateral”, explicou o cientista.
O fóssil da Vulcanidris antecede em 13 milhões de anos os registros anteriores mais antigos de formigas, provenientes da França e de Mianmar, encontrados em âmbar fossilizado. A preservação no calcário, datada de escavações realizadas nas décadas de 1980 e 1990, revela detalhes impressionantes da anatomia do inseto.
Segundo Lepeco, o exemplar estava em uma coleção particular antes de ser doado ao Museu de Zoologia de São Paulo há cerca de cinco anos. “ Eu buscava fósseis de vespas na coleção quando, de repente, reconheci que aquela espécime tinha características muito próximas às da formiga-do-inferno descoberta em âmbar birmanês”, relatou.
A descoberta reforça a hipótese de que as formigas surgiram muitos milhões de anos antes da Vulcanidris. Estimativas baseadas em dados moleculares indicam que o grupo teria se originado entre 168 milhões e 120 milhões de anos atrás. “Essa nova evidência sustenta uma origem mais antiga para as formigas dentro desses limites” , destacou Lepeco.
As formigas, segundo os cientistas, evoluíram a partir de ancestrais comuns às vespas. Seus parentes vivos mais próximos são, justamente, as vespas e as abelhas.
No ambiente em que a Vulcanidris viveu, conviviam diversos outros organismos: insetos variados, aranhas, milípedes, crustáceos, répteis voadores como pterossauros, pássaros e dinossauros como o Ubirajara. A cadeia alimentar era dinâmica, e os predadores das formigas incluíam sapos, aves e insetos maiores.
Hoje, as formigas estão distribuídas por praticamente todos os ambientes do planeta. Uma pesquisa publicada em 2022 estimou que existam cerca de 20 quatrilhões de formigas no mundo, em comparação com uma população humana de aproximadamente 8 bilhões.
“Elas são um dos grupos mais numerosos na maioria dos ecossistemas terrestres” , afirmou Lepeco. Segundo o pesquisador, as formigas desempenham funções ecológicas essenciais, como a predação e o controle de populações de outros organismos. Além disso, mantêm relações simbióticas com plantas e outros insetos, contribuem para a saúde do solo e atuam como importantes agentes de decomposição.
A descoberta da Vulcanidris cratensis, além de expandir o conhecimento sobre a história evolutiva das formigas, destaca a relevância paleontológica do Brasil no entendimento da biodiversidade pré-histórica.
Foto: Anderson Lepeco