Até o momento, foram confirmados três casos do novo coronavírus no Brasil. Porém, apesar de ser a mesma doença, estamos falando de dois genomas diferentes. Análises recentes comprovaram que o genoma do coronavírus (COVID-19), isolado no segundo paciente brasileiro, é diferente do encontrado no primeiro.
“O primeiro isolado se mostrou geneticamente mais parecido com o vírus sequenciado na Alemanha. Já este segundo genoma assemelha-se mais ao sequenciado na Inglaterra. E ambos são diferentes das sequências chinesas. Tal fato sugere que a epidemia de coronavírus está ficando madura na Europa. Ou seja, já está ocorrendo transmissão interna nos países europeus. Para uma análise mais precisa, porém, precisamos dos dados da Itália, que ainda não foram sequenciados”, afirmou Ester Sabino, diretora do Instituto de Medicina Tropical (IMT) da Universidade de São Paulo (USP).
O sequenciamento do segundo caso isolado viral foi concluído em apenas um dia, por pesquisadores do Instituto Adolfo Lutz e da USP. No entanto, os dados do novo estudo, que contam com o apoio da FAPESP, devem ser divulgados nos próximos dias.
O sequenciamento
Os isolados virais de dois dos pacientes brasileiros, que foram diagnosticados com o COVID-19, foram sequenciados por um grupo de pesquisadores do Laboratório Estratégico do Instituto Adolfo Lutz (LEIAL) e da Faculdade de Medicina da USP.
O trabalho de pesquisa conta com o apoio do Centro Conjunto Brasil-Reino Unido para Descoberta, Diagnóstico, Genômica e Epidemiologia de Arbovírus (CADDE), que é uma rede de pesquisadores dedicados a responder e analisar dados de epidemias em tempo real. O programa conta com a coordenação de Sabino e Nuno Faria, da Universidade de Oxford, no Reino Unido.
“Nosso objetivo inicial era treinar a equipe do Adolfo Lutz e implementar a tecnologia necessária para o monitoramento em tempo real da epidemia de dengue em curso no Brasil. Quando foram divulgados os casos de coronavírus na China em janeiro, começamos a nos preparam para também monitorar em tempo real essa nova doença”, revelou Sabino.
Os pesquisadores utilizam um equipamento portátil chamado de MinION, usado pela primeira vez no Brasil em 2016. Na ocasião, ele foi usado para traçar retrospectivamente a disseminação e a evolução do vírus Zika nas Américas.
“Essa agilidade só está sendo possível agora graças ao financiamento contínuo que nosso grupo no IMT-USP recebeu desde 2016. Os protocolos para sequenciamento foram desenvolvidos por uma aluna durante estágio de pesquisa em Birmingham. Conseguimos baixar o custo do teste molecular de US$ 500 para US$ 20. É um ganho tecnológico enorme para o país”, disse Sabino.
Importância da descoberta
De acordo com a líder do estudo, a principal vantagem desse monitoramento em tempo real, de uma epidemia como essa, é a possibilidade de identificar exatamente a origem do vírus. Essa informação pode ser útil para orientar ações de contenção e ajudar a reduzir a disseminação da doença.
“É uma nova ferramenta para vigilância epidemiológica, que, por enquanto, só foi testada na África, durante a epidemia de ebola”, explica Sabino. “Queremos divulgar logo esta segunda sequência para ajudar o pessoal da Itália a analisar seus dados. Compartilhamos com os italianos o protocolo usado por nossa equipe e os colocamos em contato com o grupo do CADDE na Inglaterra”.
Segundo o coordenador do laboratório, Claudio Tavares Sacchi, enquanto houver apenas casos esporádicos de coronavírus em São Paulo, todos os genomas serão sequenciados. E se casos positivos se multiplicarem em grande escala, esse trabalho será passado para outros pesquisadores. No caso, cientistas do Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE) da Secretaria De Estado de Saúde.