Enquanto os estudos sobre drogas em potencial falham, crescem as evidências de que é possível reverter ou retardar sintomas do Alzheimer com estratégias não medicamentosas. Esse é o foco de um projeto liderado pela pesquisadora da Universidade de São Paulo (USP) Tânia Araújo Viel, que investiga, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), abordagens que promovam a qualidade de vida no envelhecimento. Agora, em um estudo publicado na revista Frontiers in Aging Neuroscience, ela revela que um ambiente enriquecido de atividades físicas e sociais reduziu em 69,2% as placas beta-amiloide de camundongos transgênicos, usados como modelo de Alzheimer. Essa “limpeza” no cérebro resultou na melhora da memória, um dos aspectos mais afetados pela doença.
No estudo, os animais modificados para apresentarem características da demência foram expostos a estímulos físicos e sociais, como rodas para se exercitarem, bolinhas, escadas e objetos de diferentes tamanhos, cores e textura, trocados a cada dois dias. Como controle, outro grupo de camundongos não transgênico foi colocado em uma gaiola que tinha o mesmo tipo de enriquecimento ambiental. Também para servir de comparação, os cientistas deixaram animais com e sem a alteração em recintos normais, sem estímulos.
Passados quatro meses, os animais passaram por testes cognitivos e de memória. Comparados aos camundongos transgênicos não estimulados física ou cognitivamente, aqueles que ficaram no ambiente enriquecido apresentaram performance 24,5% superior. Além disso, a análise dos tecidos cerebrais revelou densidade de placas beta-amiloide 69,2% menor no grupo exposto aos brinquedos. Outro destaque foi o aumento da produção de uma proteína ausente em pacientes de Alzheimer, implicada na degradação da proteína beta-amiloide.
Reservas cognitivas
“As atividades físicas e sociais ajudam a proteger o cérebro. Nossas avós sempre dizem que é preciso se alimentar bem, estudar, se movimentar. O que o estudo mostra é que isso não é só uma conversa”, diz Tânia Araújo Viel. Ela explica que, embora não se saiba exatamente como os estímulos físicos e cognitivos contribuem para enfrentar o envelhecimento cerebral, acredita-se que eles aumentem o fluxo sanguíneo e a oxigenação no cérebro. “Essas estratégias criam reservas cognitivas, funcionais e estruturais cerebrais”, diz.
Fazer exercícios físicos e manter a mente ativa podem não evitar o surgimento da doença. Porém, a pesquisadora destaca que esses estímulos podem retardar o desenvolvimento do Alzheimer, embora não seja possível provar essa teoria por enquanto. “As pessoas não têm ideia da grandeza e dos benefícios dessas atividades. Passear com o cachorro, fazer um curso de línguas, diversificar o dia a dia são grandes ferramentas para proteger o cérebro. É preciso tomar conta da própria saúde tentando sair o máximo possível da rotina. São coisas que vão construindo o envelhecimento saudável”, ensina. (PO)
69,2%
Redução de placas beta-amiloide, ligadas ao Alzheimer, em camundongos colocados em um ambiente rico em atividades físicas e sociais. O resultado é de uma pesquisa conduzida na Universidade de São Paulo
Fonte: Exame