Fórum realizado na quarta-feira (5/6) direcionado a especialistas em pesquisa, desenvolvimento e inovação investiu na aproximação entre indústria e academia
A fim de ampliar o diálogo entre a academia e a cadeia produtiva, a Fiesp, através do ComSaude – Comitê da Cadeia Produtiva da Saúde e Biotecnologia, realizou na quarta-feira (5/6), o Fórum Saúde: Cooperação Universidade – Empresa. Foram recebidos representantes da Universidade de São Paulo (USP), Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HCFMUSP), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Universidade Estadual PauFlista (Unesp). O encontro, que foi moderado por Eduardo Giacomazzi, diretor-adjunto do Comitê, também contou com o presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), Marco Antonio Zago.
“Mais do que mostrar o que as universidades estão fazendo em prol da inovação em saúde, é necessário abrirmos esse espaço para discutir como essas instituições tão importantes para a economia do país podem e devem trabalhar juntas”, disse Giacomazzi ao abrir o evento que recebeu mais de 60 pessoas na sala executiva da Fiesp, entre elas diversos especialistas em pesquisa, desenvolvimento e inovação em atuação na indústria de saúde brasileira.
Após relatar que com o passar das décadas a desconfiança existente entre os membros da academia e os profissionais da indústria diminuiu, Zago apontou o que é preciso trabalhar para o desenvolvimento da inovação no país. Para tal, listou três iniciativas importantes que devem ser tomadas após a realização do fórum. “A universidade deve unificar a oferta das informações e auxiliar na localização do pesquisador; a indústria precisa incorporar pessoas da academia em seus planejamentos; e ambas, em conjunto, devem desdobrar as discussões desse encontro em novas atividades”, declarou.
Para o presidente da Fapesp, encontros como o promovido pelo ComSaude contribuem para a resolução de um dos entraves dessa relação: a falta de conhecimento dos aspectos práticos. “Precisamos conversar e descobrir mecanismos de diálogo permanente”, enfatizou. Na sequência, o acadêmico apresentou a Fundação como uma financiadora de pesquisa que, em 2017, investiu R$ 1 bilhão em 10 mil projetos de pesquisa, 7% deles realizados em parceria com empresas.
Agências de inovação nas universidades
Durante o fórum, representantes de algumas das principais universidades do país apresentaram suas agências de inovação e trouxeram ao público detalhes sobre a atuação delas junto à indústria, incluindo alguns cases de sucesso.
Rangel Arthur, docente e assessor da Inova (Agência de Inovação da Unicamp), declarou que a instituição está sempre atuando para estimular a união da academia com a indústria a fim de desenvolver projetos de pesquisa capazes de sanar os atuais problemas das empresas. Com 1.177 patentes ativas, a Unicamp atua em parceria com o setor empresarial alinhada, inclusive, ao Decreto n. 62.817, o qual permite que docentes da instituição colaborem com empresas privadas sem o risco de essa atuação implicar perda de sua remuneração.
“O afastamento de um docente da universidade para contribuir para uma empresa de base tecnológica seria visto como perda pela velha guarda da academia. Já nós temos consciência do grande benefício dessa atitude para a sociedade”, mencionou Arthur, que convidou todos os presentes a conhecerem o portfólio da instituição. “Muitas vezes temos docentes envolvidos justamente com os assuntos que integram suas necessidades”, disse.
Na sequência, Rita Costoya, gerente de Transferência de Tecnologia da Agência Unesp de Inovação (Auin), falou sobre as formas de atuação da agência para aproximação com a indústria. “Temos núcleos de inovação, parques tecnológicos parceiros com excelentes resultados, uma vitrine com todas as 103 tecnologias desenvolvidas para visualização das empresas e um banco de conhecimento para iniciar pesquisas junto com a indústria”, pontuou. E declarou ser preciso cultivar esse ambiente que tem, dentro da universidade, um olhar diferenciado que enxerga as startups como ótimos modelos de negócio. Para ela, a indústria detém o poder. “Estamos interessados em nos adequar às demandas da indústria. Então aproveitem esse poder para conduzir esses processos”, disse.
Vice-coordenadora da Agência USP de Inovação (Auspin), Geciane Porto fez sua apresentação enfatizando a importância que a universidade dá ao empreendedorismo. “Temos uma série de ações voltadas ao fomento do empreendedorismo como, por exemplo, o Conexão USP, que recebe a demanda da empresa e busca um pesquisador capaz de atendê-la”, explicou. Segundo a executiva, em 2019 a instituição tem 1.200 startups cadastradas. “A ideia da USP é estar mais aberta, literalmente disponível para desenvolver tecnologia e transformar conhecimento em riqueza para a sociedade”, disse.
Complementando a apresentação de Geciane, Luiz Henrique Catalani, coordenador do Inova USP, falou sobre a quebra desse paradigma que afirma haver uma barreira entre a universidade e a indústria. Apresentando aos espectadores a possibilidade de uma atuação consorciada entre os parceiros da universidade, falou sobre a importância do trabalho em conjunto. “Não devemos encarar como competição quando podemos dividir os custos. Podemos trabalhar de forma conjunta até determinado ponto do investimento e temos, dentro da universidade, toda a expertise para esse tipo de proposta”, mostrou.
Para Catalani, esse movimento em prol da parceria é mundial. “As grandes corporações estão se voltando às universidades em todo o mundo. Esse desenvolvimento da inovação dentro da academia é algo que está na ordem do dia”, declarou.
Diretor do INOVAHC, instituição responsável por incentivar a inovação dentro e fora do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, Marco Bego enfatizou que “inovar é não concordar com o status quo”. Segundo ele, o INOVAHC começa a atuar quando a pesquisa – já muito bem realizada pela universidade e pelo hospital – apresenta boas oportunidades de virar produto ou solução.
A fim de facilitar esse diálogo, o INOVAHC investe em preparo dos pesquisadores para as tratativas diretas com a indústria. “Fizemos alguns testes e verificamos que a linguagem do pesquisador é muito diferente e, por isso, a conversa não flui muito bem. Então trabalhamos para preparar esse pesquisador para que ele tenha segurança para atuar com o empresariado”, afirmou.
Fórum da Saúde, promovido pelo ComSaude, tratou da cooperação entre universidades e empresas. Foto: Everton Amaro/Fiesp
A fim de comprovar que a união entre a academia e a indústria gera produtos e soluções muito bem aceitos pelo mercado e capazes de suprir reais demandas da sociedade, os representantes das agências de inovação apresentaram alguns cases de sucesso.
Marco Antonio Zago, da Fapesp, citou um projeto de tecnologia assistiva com cadeiras de rodas motorizadas controladas por movimentos tanto faciais quanto da íris que já está em fase de testes nos EUA e, em breve, deve estar disponível também no Brasil.
Em sua apresentação, Rangel Arthur, da Unicamp, falou sobre uma parceria responsável pelo desenvolvimento de um conector uretral que, além de proporcionar maior comodidade ao paciente, também diminui consideravelmente o risco de infecções por possibilitar a medição do aumento da pressão da bexiga de forma minimamente invasiva. O especialista também mencionou a criação de uma tecnologia que, por meio de um colírio, ajuda a evitar a retinopatia diabética, doença que pode causar cegueira em cerca de 400 milhões de pessoas no mundo.
Outro case apresentado por Arthur diz respeito à elaboração de um software de gestão hospitalar desenvolvido dentro do Hospital das Clínicas da Unicamp que está disponível para todos os hospitais.
Já Rita Costoya, da Unesp, tratou de apresentar o desenvolvimento do selante de fibrina pelo Centro de Estudos de Venenos e Animais Peçonhentos (Cevap). O produto pode ser utilizado como agente hemostático em cirurgias, no tratamento de úlceras crônicas e em procedimentos com células-tronco, além de oferecer diversas vantagens, por exemplo, não causar reação alérgica no paciente evitando inclusive doenças infecciosas por não utilizar, em sua composição, sangue humano. Uma tecnologia 100% nacional.
Encerrando o evento, Giacomazzi agradeceu a todos os participantes que promoveram um debate bastante ativo sobre o tema e enfatizou a importância de o setor dar sequência às iniciativas que foram apresentadas. “A construção de uma saúde mais assertiva e capaz de levar eficiência e segurança aos pacientes depende do investimento em inovação. Nesta manhã, tivemos a oportunidade de conhecer alguns caminhos interessantes para unir a indústria de saúde à academia na busca por novos produtos e soluções capazes de transformar o nosso cenário. Espero que este tenha sido apenas o começo de uma discussão que vai se prolongar para gerar resultados positivos a todos os envolvidos”, finalizou.