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Programa Brasileiro GHG Protocol

FAPESP e BBSRC aplicam R$ 19 milhões em pesquisas sobre biocombustíveis avançados (1 notícias)

Publicado em 01 de novembro de 2016

Por Elton Alisson, da Agência FAPESP

A FAPESP e o Biotechnology and Biological Sciences Research Council (BBSRC), do Reino Unido, aplicarão conjuntamente £ 5 milhões (equivalente a cerca de R$ 19 milhões) para apoiar dois projetos de pesquisa voltados à produção de biocombustíveis avançados – obtidos de matérias-primas não convencionais, como bagaço e palha da cana-de-açúcar – e produtos químicos de alto valor.

Os projetos, selecionados em uma chamada de propostas lançada em conjunto pelas duas instituições, serão realizados nos próximos quatro a cinco anos por pesquisadores vinculados a universidades e instituições de pesquisa do Estado de São Paulo em colaboração com parceiros no Reino Unido.

A FAPESP concederá o equivalente a £ 1,5 milhão (cerca de R$ 5,7 milhões) e, em contrapartida, o BBSRC destinará £ 3,5 milhões (aproximadamente R$ 13,3 milhões) para financiar os dois projetos colaborativos de pesquisa que envolvem diferentes abordagens em biorrefinaria – como são chamados os complexos industriais que produzem combustível, eletricidade e produtos químicos a partir de biomassa.

O valor investido nos dois projetos representa um dos maiores volumes de recursos já aplicados pela FAPESP em uma chamada conjunta de propostas e é justificado pelos desafios científicos e tecnológicos envolvidos.

Entre eles estão o desenho e o desenvolvimento de enzimas e novos microrganismos fermentativos, a otimização de características da biomassa de plantas que têm sido avaliadas para produção de biocombustíveis avançados e produtos químicos, além da exploração de novas rotas tecnológicas e a avaliação de sua viabilidade industrial e comercial.

Um dos projetos selecionados, liderado por Telma Teixeira Franco, coordenadora do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Estratégico (Nipe) da Universidade Estadual de Campinas, e David Leak, professor da University of Bath, da Inglaterra, pretende explorar novas técnicas de conversão de hidratos de carbono complexos presentes na biomassa de plantas, como a celulose e a hemicelulose, para produzir biocombustíveis de segunda geração e produtos químicos de alto valor usando menos recursos e energia.

Principais elementos estruturais da parede celular de plantas, a celulose e a hemicelulose são unidas pela lignina – uma molécula responsável pela rigidez, impermeabilidade e resistência dos tecidos vegetais.

A fim de poder convertê-las em açúcar, que é fermentado e, a partir desse processo, obter o bioetanol, a lignina precisa ser extraída dos resíduos agrícolas, como bagaço e palha de cana-de-açúcar e de sorgo sacarino, cascas, gramíneas e resíduos florestais.

Os processos utilizados hoje para essa finalidade – como a deslignificação com a separação das frações de celulose e hemicelulose (chamada de pré-tratamento) e hidrólises ácida e enzimática – são complexos, apresentam baixo rendimento na conversão, balanço energético negativo e custo de produção elevada.

Durante o projeto, os pesquisadores brasileiros e do Reino Unido pretendem avaliar novas tecnologias, como a de quebra da celulose, em que a estrutura molecular do bagaço e da palha da cana-de-açúcar e do sorgo sacarino, além de resíduos de eucalipto, é quebrada em açúcares mais simples e solúveis, que são transformados em combustíveis de segunda geração pela ação de microrganismos.

“Queremos avaliar um processo de pré-tratamento que desenvolvemos muito diferente do que tem sido feito hoje e que permite evitar a contaminação por bactérias durante a fase de fermentação do açúcar para obter não só etanol de segunda geração, mas também outros biocombustíveis avançados, como biodiesel e bioquerosene para aviação”, disse Franco à Agência FAPESP.

Os pesquisadores também pretendem desenvolver durante o projeto um novo processo de fermentação, além de novas linhagens de microrganismos fermentativos e enzimas específicas para o tratamento da palha e do bagaço da cana-de-açúcar, do sorgo sacarino e de resíduos de eucalipto.

O projeto será realizado em colaboração com pesquisadores da Aberystwyth University, do País de Gales, e do Imperial College London, da Inglaterra.

“Montamos uma equipe excelente de pesquisadores do Reino Unido e do Brasil que atende os requisitos e está muito bem preparada para enfrentar os desafios científicos envolvidos nesse projeto”, declarou Leak em release divulgado pela University of Bath.  “Estamos ansiosos para começar e muito animados com as possibilidades que essa parceria deve resultar”, avaliou.

O segundo projeto de pesquisa selecionado na chamada de propostas será coordenado por Fábio Squina, pesquisador do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE) do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), e por Timothy David Howard Bugg, professor da University of Warwick, da Inglaterra, e visa desenvolver novas rotas biotecnológicas para valorizar a lignina.

O segundo polímero mais abundante no planeta, depois da celulose, a lignina é utilizada hoje primordialmente para queima e fornecimento de energia para processos biotecnológicos.

Por meio do projeto, os pesquisadores do CTBE e da University of Warwick, em colaboração com colegas da University of Manchester e da University College London, da Inglaterra, pretendem desenvolver novas rotas de valorização da lignina utilizando microrganismos, desenvolvidos por engenharia metabólica, em produtos químicos.

“Nosso objetivo é desenvolver novos métodos para valorizar a lignina usando ácido ferúlico como intermediário e que esse composto antioxidante, encontrado nas folhas e sementes de plantas, como farelo de milho, arroz, trigo e aveia e usado pelas indústrias de cosméticos, possa ser convertido em outros compostos, como fragrâncias, princípios farmacológicos e aromas”, explicou Squina.

Durante o projeto, os pesquisadores também pretendem integrar os processos biotecnológicos para valorização da lignina com a produção de etanol celulósico.

“Essa integração dos processos biotecnológicos pode ajudar a viabilizar biorrefinarias de material celulósico”, avaliou Squina.

Parceria profícua

A FAPESP mantém desde 2009 uma parceria com o BBSRC, que é um dos sete Conselhos de Pesquisa (Research Council) do Reino Unido – RCUK, na sigla em inglês.

Ao longo desses anos, as duas instituições lançaram em conjunto com o Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (Confap) uma chamada de propostas, no âmbito do Newton Fund, voltada a selecionar centros virtuais de pesquisa em nitrogênio para a agricultura.

Além disso, mantêm uma chamada de propostas de fluxo contínuo – em que pesquisadores do Reino Unido podem submeter ao BBSRC propostas de pesquisa conjuntas com pesquisadores vinculados a universidades e instituições de pesquisa no Estado de São Paulo a qualquer momento – e outra voltada a promover colaborações científicas de curto prazo.

“Essa chamada de propostas conjunta para apoiar projetos voltados à fabricação de biocombustíveis avançados, liderada pela FAPESP, demonstra a força da parceria e baseia-se em colaborações de longa data entre cientistas do Reino Unido e brasileiros”, disse Steve Visscher, diretor executivo do BBSRC, em um comunicado publicado pela instituição.

“Esse investimento demonstra o compromisso contínuo do BBSRC em estabelecer a bioenergia como uma das nossas prioridades estratégicas e os benefícios de trabalhar com parceiros globais para enfrentar os desafios de pesquisa nessa área”, disse Visscher.

A chamada de propostas foi a primeira lançada em conjunto pela FAPESP com um dos Conselhos de Pesquisa do Reino Unido em que todo o processo de análise do mérito científico foi conduzido pela Fundação.

Para Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor cientifico da FAPESP, os projetos aprovados buscam enfrentar um dos desafios mais significativos para a produção de bioenergia hoje no mundo.

“A chamada FAPESP-BBSRC mobiliza colaboração científica para estudar um tema extremamente relevante para o Brasil, que é a bioenergia.  Os dois projetos selecionados, cada um liderado por um par de destacados cientistas de São Paulo e do Reino Unido, enfrentam um dos desafios mais importantes em bioenergia hoje: a utilização de material lignocelulósico para produzir insumos químicos valiosos e combustíveis líquidos”, disse.