A ideia de que a Amazônia foi, no passado remoto, uma região quase despovoada, habitada apenas por grupos indígenas pequenos, esparsos e carentes, ficou definitivamente para trás. Pesquisas recentes trouxeram à luz outra Amazônia: com fartura de recursos materiais, povoamento denso, estradas e cidades. “A presença humana na Amazônia remonta há mais de 8 mil anos. Em alguns lugares, temos evidências de povoamento há 13 mil anos. E a população total da Amazônia, no início do século 15, antes da chegada dos europeus, pode ser estimada em cerca de 10 milhões de pessoas”, diz Eduardo Neves, professor titular de arqueologia brasileira e diretor do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (MAE-USP).
Neves é nome referencial da nova pesquisa arqueológica e um dos principais protagonistas da grande revisão que mudou o paradigma sobre o passado da Amazônia. Ele foi o palestrante da segunda Conferência Fapesp 2024: “Há algo de novo no passado: o estado da arte da pesquisa arqueológica na Amazônia”, realizada no último dia 22.
“O que descobrimos nos últimos anos que mudou nossa visão sobre o passado da Amazônia foi, primeiro, a antiguidade da presença indígena. Segundo, que a região foi um centro independente de domesticação e cultivo de plantas e abrigou mais de um centro independente de produção de cerâmica. Terceiro, que o povoamento transformou a paisagem e produziu abundância. Quarto, que o adensamento demográfico gerou diversidade cultural e urbanização. Sabemos, hoje, que havia cidades na Amazônia – em, pelo menos, três ou quatro contextos diferentes”, afirmou Neves.
Vestígios dessas cidades, escondidos pela floresta densa, vêm sendo escavados em campo por Neves e sua equipe. E também foram detectados recentemente por meio da tecnologia de sensoriamento remoto aerotransportada “Lidar” (acrônimo para a expressão em inglês light detection and ranging). Tal estudo, conduzido por Stéphen Rostain e colaboradores, foi matéria de capa da revista Science no início deste ano. No trabalho, os autores afirmam que a área central do sítio arqueológico de Kilamope, na Amazônia equatoriana, seria comparável em tamanho à do planalto de Gizé, no Egito, ou à da avenida principal de Teotihuacan, no México.