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Exposição ao ar poluído na gravidez altera estrutura da placenta (1 notícias)

Publicado em 31 de outubro de 2017

A exposição de gestantes à poluição do ar durante a gravidez influencia o desenvolvimento do feto. A criança pode apresentar baixo peso ao nascer, além de ter aumentada a possibilidade de apresentar determinadas doenças na vida adulta, de acordo com estudos realizados no Brasil e no exterior. Os mecanismos moleculares por trás desses impactos da poluição na gestação, contudo, ainda não estavam completamente elucidados.

Um grupo de pesquisadores da FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) constatou agora que a exposição a poluentes atmosféricos, antes ou durante a gravidez, altera algumas características da placenta, além de causar distúrbios em um sistema hormonal relacionado ao fluxo sanguíneo uteroplacentário e diminuir os níveis de fatores envolvidos no processo de formação placentária.

Os resultados do estudo, realizado no âmbito de um Projeto Temático e do doutorado de Sônia de Fátima Soto, feito com Bolsa da FAPESP, foram publicados na revista PLOS ONE.

“Observamos que a exposição a poluentes antes e/ou durante a gravidez desencadeia alguns fenômenos inflamatórios ao longo do desenvolvimento da placenta que comprometem seu crescimento. Isso possivelmente interfere na transferência de nutrientes e de oxigênio da mãe para o feto”, disse Joel Claudio Heimann, professor da FMUSP e orientador de Soto.

Os pesquisadores realizaram um experimento em que expuseram ratas Wistar — linhagem albina da espécie Rattus norvegicus —, antes de acasalarem e ficarem prenhes, tanto ao ar filtrado como ao ar poluído com concentração de material particulado fino (menor que 2,5 micrômetros) de 600 microgramas (µg) por metro cúbico (m3), utilizando para isso um equipamento chamado CPFAH (concentrador de partículas finas ambientais de Harvard). O tamanho de partícula foi determinado com base nas exposições ambientais reais na Região Metropolitana de São Paulo.

Os animais foram divididos em quatro grupos. O primeiro foi exposto ao ar filtrado antes e durante a gravidez, o segundo foi colocado em contato com ar filtrado antes da gravidez e com ar poluído durante a gravidez, um terceiro grupo foi submetido ao ar poluído antes da gravidez e ao ar filtrado durante a gravidez, e o quarto, ao ar poluído antes e durante a gravidez.

Para simular as condições reais de exposição de mulheres à poluição do ar antes e durante a gravidez em cidades como São Paulo, antes da gravidez os animais foram colocados em contato com ar poluído durante uma hora cinco vezes por semana por três semanas seguidas. A partir do sexto dia de prenhez, o número de exposições foi de sete vezes por semana.

As placentas dos animais foram coletadas no 19º dia de gravidez, dissecadas e pesadas de modo a avaliar os efeitos dos poluentes em sua estrutura e no sistema RAS (hormonal renina-angiotensina) uteroplacentário.

Os resultados das análises indicaram que a exposição ao ar poluído antes e/ou durante a gravidez diminuiu a massa, o tamanho e a área superficial da placenta e causou alterações no sistema RAS.

Estudos anteriores apontaram que distúrbios nesse sistema podem levar a uma redução do fluxo sanguíneo uteroplacentário. Além disso, a angiotensina II (AngII) – um peptídeo que faz parte desse sistema – é um potente regulador da migração e invasão de trofoblasto – camada de células epiteliais que forma a parede externa da blástula dos mamíferos (blastocisto) e atua na implantação e nutrição do embrião – no início da gravidez.

A invasão da vasculatura materna pelo trofoblasto é um pré-requisito para o estabelecimento de uma placenta normal e a continuação da gravidez, explicaram os pesquisadores.

“Constatamos que a exposição das ratas prenhes à poluição antes e/ou durante a gravidez causou alterações no sistema renina-angiotensina dos animais. Mas são necessários novos estudos para elucidarmos mecanismos moleculares adicionais”, disse Heimann.

Interferência na formação da placenta

Os pesquisadores também avaliaram os efeitos da exposição ao ar poluído em fatores que influenciam o processo de formação da placenta, como o fator de crescimento de transformação beta 1 (TGFß1) e o fator de crescimento endotelial vascular (VEGF-A).

Diversos estudos sugeriram que o TGFß1 tem um papel na invasão da mucosa que recobre a face interna do útero (endométrio). E, nos mamíferos, o TGFß1 pode regular uma variedade de funções celulares, incluindo proliferação, diferenciação, morte programada (apoptose) e invasão de células placentárias.

O VEGF-A também desempenha um papel na formação da placenta ao modular a angiogênese, ligando-se a seus dois receptores: tirosina quinase 1 relacionada a fms (Flk-1) e tirosina quinase 1 hepática fetal (Flt-1). As análises moleculares indicaram que a exposição ao ar poluído diminuiu o conteúdo de TGFß1 e Flk-1 na placenta dos animais.

A porção materna da placenta das ratas expostas a ar poluído antes da gravidez e a ar filtrado durante a gravidez, comparada com a daquelas colocadas em contato com ar poluído antes e durante a gravidez, apresentou diminuição nos níveis de angiotensina II (AngII) e seus receptores AT1 (AT1R) e AT2 (AT2R).

Na porção fetal da placenta das ratas expostas a ar filtrado antes da gravidez e a ar poluído durante a gravidez, a ar poluído antes da gravidez e a ar filtrado durante a gravidez e a ar poluído antes e durante a gravidez, os níveis de AngII também diminuíram. Contudo, a AT1R aumentou no grupo de animais expostos a ar filtrado antes da gravidez e a ar poluído durante a gravidez.

A expressão do gene VEGF-A foi menor no grupo de ratas expostas a ar poluído antes e durante a gravidez em comparação com os animais colocados em contato com ar filtrado antes e durante a gravidez.

Essas alterações indicam um possível comprometimento da invasão de trofoblasto e na angiogênese (formação de novos vasos sanguíneos) da placenta, explicou Heimann.

“Isso pode ter consequências para a interação entre mãe e feto, como também limitar a nutrição e o crescimento fetal”, afirmou.

Fonte: Agência Fapesp