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Exploração de águas subterrâneas afeta vazão de rios no Brasil, aponta estudo (83 notícias)

Publicado em 10 de março de 2025

Pesquisa revela que mais da metade dos rios brasileiros pode sofrer redução no fluxo devido à perfuração indiscriminada de poços subterrâneos.

A exploração excessiva de águas subterrâneas está afetando drasticamente a vazão dos rios no Brasil. Um estudo publicado no periódico Nature Communications revelou que 55,4% dos 17.972 poços analisados apresentaram níveis de água inferiores aos dos rios mais próximos, causando um gradiente hidráulico que favorece a percolação da água fluvial para o subsolo. Esse fenômeno pode comprometer a sustentabilidade hídrica, principalmente em regiões como a bacia do Rio São Francisco e o Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), onde a dependência das águas subterrâneas é elevada.

Na bacia do Rio São Francisco, 61% dos rios analisados apresentaram potencial de perda de fluxo para os aquíferos subterrâneos, enquanto na bacia do Rio Verde Grande, esse percentual chegou a 74%. “Essas regiões são vitais para a produção agrícola e a geração de energia, tornando-se um alerta para a segurança hídrica nacional”, destaca Paulo Tarso Sanches de Oliveira, hidrólogo da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e um dos autores do estudo.

Um dos principais fatores de impacto é a perfuração descontrolada de poços subterrâneos. Dados apontam que existem cerca de 2,5 milhões de poços tubulares no Brasil, sendo que 88% deles operam sem registro ou licença. O volume de água extraído anualmente, de aproximadamente 17,6 bilhões de metros cúbicos, seria suficiente para abastecer toda a população brasileira, mas beneficia apenas 20% dela.

A retirada excessiva de água subterrânea também pode causar a subsidência do solo, levando ao afundamento e colapso da superfície, como já ocorreu em regiões da Índia e Califórnia. “Se não houver um controle eficiente, o Brasil poderá enfrentar um cenário semelhante nos próximos anos”, alerta Oliveira. O problema se torna ainda mais crítico diante das projeções de aumento de mais de 50% das áreas irrigadas nos próximos 20 anos.

A necessidade de um planejamento integrado para o uso de águas superficiais e subterrâneas é essencial. Ferramentas de sensoriamento remoto e monitoramento hidrogeológico são apontadas como soluções viáveis para mitigar os impactos negativos. “O Brasil pode expandir a irrigação de forma sustentável, mas precisa planejar o uso hídricos com estratégias mais eficientes”, afirma José Gescilam Uchôa, primeiro autor do artigo.

Outro alerta vem do impacto direto sobre a saúde da população. Em 2017, um aumento significativo nos casos de hipertensão foi registrado em uma comunidade no litoral de Alagoas, que consome água do Rio São Francisco. A causa foi a intrusão de água salgada no rio, resultado da queda na vazão fluvial.

O estudo reforça a urgência de políticas públicas eficazes para a gestão dos recursos hídricos. Além de ser um problema local, ele serve como alerta global para países tropicais que enfrentam desafios semelhantes no manejo da água subterrânea.

O artigo Widespread potential for streamflow leakage across Brazil pode ser acessado na íntegra aqui.