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Experimentos com ratos explicam como treino aeróbio pode beneficiar coração (29 notícias)

Publicado em 03 de janeiro de 2023

Pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) descobriram, por meio de experimentos com ratos, como o exercício aeróbico melhora o controle da hipertensão arterial em indivíduos com hipertensão crônica ou insuficiência cardíaca. De acordo com os estudos, o treinamento ajuda a corrigir disfunções na barreira hematoencefálica e restaura o fluxo sanguíneo no sistema nervoso central mesmo em caso de persistência da doença.

A barreira hematoencefálica é uma estrutura que tem a função de regular o transporte de substâncias entre o sangue e o sistema nervoso central, barrando a entrada de substâncias tóxicas e de hormônios plasmáticos em excesso. Esses hormônios, em quantidade acima do ideal, são capazes de ativar neurônios envolvidos na regulação do sistema cardiovascular, levando à disfunção autonômica e ao desequilíbrio da circulação sanguínea. Isso facilita o aparecimento de lesões em órgãos-alvo, podendo comprometer coração, cérebro, rim, entre outros órgãos.

“Além de corrigir o controle autonômico da circulação, o treinamento aeróbico também contribui para reduzir de 10% a 15% os níveis da pressão arterial nos hipertensos”, afirma Lisete Compagno Michelini, coordenadora do Laboratório de Fisiologia Cardiovascular, responsável pelos estudos, em entrevista para a Assessoria de Imprensa do ICB-USP.

A investigação recebeu financiamento da FAPESP por meio dos Projetos Temáticos “Barreira hematoencefálica: um novo paradigma no tratamento da hipertensão” e “Amelioration of the autonomic imbalances of old age with exercise: exploring the molecular and physiological mechanisms”, além do projeto “Barreira hematoencefálica e regulação autonômica na hipertensão arterial: efeitos da angiotensina ii e do treinamento aeróbio”.

Filtro de substâncias

Encontrada nos capilares cerebrais por onde o sangue circula, a barreira hematoencefálica é composta por células endoteliais intimamente ligadas umas às outras por junções oclusivas que limitam a passagem de substâncias solúveis em água. Não há limite para a passagem de substâncias lipossolúveis, como oxigênio e gás carbônico, através da célula endotelial. O problema são as macromoléculas, entre elas substâncias tóxicas e hormônios plasmáticos.

“Em indivíduos saudáveis, a passagem de macromoléculas, que ocorre através de vesículas sanguíneas, é bastante limitada. No entanto, observamos que em hipertensos e portadores de insuficiência cardíaca há um aumento expressivo no número dessas vesículas em áreas autonômicas, o que eleva a permeabilidade da barreira hematoencefálica. Por outro lado, observamos que o treinamento aeróbico reduziu em muito a formação dessas vesículas, além de normalizar a permeabilidade da barreira hematoencefálica”, explica Michelini.

Segundo a professora do ICB, já se sabia que em casos de acidente vascular cerebral (AVC), traumas e doenças neurodegenerativas a integridade da barreira era comprometida pela quebra das junções oclusivas, o que permitia livre acesso das substâncias. “Em nossos experimentos, observamos que na hipertensão e na insuficiência cardíaca não há quebra em áreas de controle cardiovascular e sim aumento da permeabilidade por facilitação do transporte das vesículas, o que pode ser prontamente corrigido pelo treinamento aeróbico”, destaca.

As descobertas feitas pela equipe reforçam a importância do treinamento físico para a melhora do controle autonômico da circulação, pois, além de ser um importante aliado no tratamento farmacológico dessas patologias, permite reduzir a quantidade necessária de medicamentos e, consequentemente, diminui a ocorrência de efeitos colaterais.

“O exercício físico, assim como diferentes fármacos, favorece a vasodilatação vascular, ajuda a balancear desvios do sistema renina angiotensina, responsável por regular a pressão arterial, e melhora o controle autonômico da circulação”, afirma Michelini.

O grupo segue estudando o funcionamento da barreira hematoencefálica, agora com o objetivo de avaliar se o transporte vesicular aumentado na hipertensão e insuficiência cardíaca, mas reduzido em ambas as situações pelo treinamento aeróbio, é mediado pela disponibilidade do hormônio angiotensina II e/ou de citocinas pró-inflamatórias. O grupo verificará ainda se os resultados obtidos na hipertensão primária (sem causa esclarecida) são também aplicáveis à hipertensão secundária, derivada de uma outra condição (como apneia do sonoinsuficiência renal e hipotireoidismo, entre outras).

Parte dos resultados já obtidos pela equipe do ICB foi divulgada em três artigos. O estudo intitulado Transcytosis within PVN capillaries: a mechanism determining both hypertension-induced blood-brain barrier dysfunction and exercise-induced correction pode ser acessado em: https://journals.physiology.org/doi/full/10.1152/ajpregu.00154.2020.

O artigo Perfusion of Brain Preautonomic Areas in Hypertension: Compensatory Absence of Capillary Rarefaction and Protective Effects of Exercise Training está disponível em: www.frontiersin.org/articles/10.3389/fphys.2021.773415/full.

E o estudo Maintenance of Blood-Brain Barrier Integrity in Hypertension: A Novel Benefit of Exercise Training for Autonomic Control pode ser encontrado em: www.frontiersin.org/articles/10.3389/fphys.2017.01048/full.

Por Agência FAPESP*

* Com informações do ICB-USP.