Berkeley – A despeito dos avanços sociais conquistados com a redemocratização, a estabilidade econômica e, nos últimos anos, o aumento da renda dos mais pobres, a desigualdade social no Brasil persiste.
Para analisar o problema de forma interdisciplinar e inovadora, pesquisadores reunidos em Berkeley, nos Estados Unidos, durante a FAPESP Week California, discutiram oportunidades de colaboração para pesquisas em Ciências Sociais e estratégias de engajamento popular por meio de novas tecnologias.
O cenário da desigualdade no Brasil foi abordado por Marta Arretche, professora do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo (USP) e diretora do Centro de Estudos da Metrópole (CEM), um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPIDs) da FAPESP.
Arretche apresentou dados utilizados em pesquisas do CEM para ilustrar o histórico da desigualdade social desde a redemocratização. De acordo com a pesquisadora, o auge do problema ocorreu em 1989, quando os mais ricos chegavam a ter renda 70 vezes maior do que os mais pobres.
“Era o final do governo Sarney e o Brasil passava por um momento delicado da sua economia. A partir daí as diferenças de renda vêm caindo sistematicamente, passando pelos planos Cruzado e Real, o crescimento econômico e os programas sociais dos anos seguintes”, afirmou.
Ainda assim, conforme a série histórica apresentada pela pesquisadora, a questão persiste: em 2012, a renda média dos 5% mais ricos era 33 vezes a dos 20% mais pobres.
Arretche alertou para os desafios por trás dos dados. “A desigualdade social no Brasil ainda é muito grande, apesar da elevação da renda dos mais pobres, porque ela não se restringe à questão da renda, mas diz respeito à qualidade de vida e à oferta de serviços essenciais, como saneamento básico e energia elétrica.”
O enfrentamento da desigualdade exige, entre outros esforços de naturezas diversas, o fortalecimento das instituições democráticas. “Nos países desenvolvidos, a democracia não só levou à redução da desigualdade ao longo do século 20 como a manteve em níveis baixos. Nos países em desenvolvimento, esse processo é dificultado pela atuação de instituições problemáticas, por legados sociais históricos e pela própria qualidade da democracia”, disse.
Para a pesquisadora, a redução da desigualdade social não é um resultado direto da democracia, mas “uma combinação de políticas cujas trajetórias são independentes e se desdobram ao longo do tempo”.
O mesmo ocorre com a violência no Brasil, explicou Sérgio Adorno, coordenador do Centro para o Estudo da Violência (NEV), outro CEPID da FAPESP. De acordo com os dados apresentados pelo pesquisador, nas últimas três décadas cresceram substancialmente as taxas de homicídio, de tráfico de drogas e de crimes envolvendo violência doméstica, entre outros.
“As expectativas otimistas para o desenvolvimento da democracia até agora não foram cumpridas: não houve regressão, mas o Estado de Direito continua a ser um objetivo distante”, disse.
Para Adorno, é preciso fortalecer as instituições. “As leis expressam a vontade da população e, em um Estado de Direito, como valor democrático básico, os progressos nesse sentido dependem da legitimidade das instituições que atuam na garantia dos direitos.”