Alguns dos principais programas de pesquisa mantidos por pesquisadores do centro são sobre captura e armazenamento de carbono.
Está em tramitação no Senado Federal o Projeto de Lei nº 1.425 com o objetivo de criar um marco legal para a exploração econômica no Brasil da atividade de captura e armazenamento de carbono em reservatórios geológicos, como poços de petróleo e gás, aquíferos salinos e camadas de carvão.
De autoria do senador Jean Paul Prates (PT-RN), o projeto é embasado em estudos sobre o tema realizados por pesquisadores vinculados ao Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI).
Constituído com apoio da FAPESP e da Shell na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), o RCGI é um dos 23 Centros de Pesquisa em Engenharia (CPEs) criados pela Fundação nos últimos dez anos.
"O projeto de lei proposto é fruto da pesquisa desenvolvida ao longo de quatro anos por cientistas brasileiros na Universidade de São Paulo, via Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa [Research Centre for Greenhouse Gas Innovation -- RCGI] -- um lócus de excelência da parceria entre indústria, governos e universidade pública para encontrar soluções para os problemas que elencamos", destaca o texto do projeto de lei.
O RCGI conta com cerca de 400 pesquisadores atuando em 46 projetos de pesquisa focados em estudos avançados relacionados ao uso sustentável do gás natural, biogás, hidrogênio, gestão, transporte, armazenamento e uso de CO2.
Alguns dos principais programas de pesquisa mantidos por pesquisadores do centro são sobre captura e armazenamento de carbono (CCS, na sigla em inglês) e bioenergia com captura e armazenamento de carbono (BECCS, na sigla em inglês).
"O Brasil tem enorme potencial de fazer CCS não apenas offshore [em poços de petróleo e gás no fundo do mar], como também onshore [em terra]. Um exemplo é a captura e o armazenamento de CO2 que é emitido durante a produção de etanol e de outros biocombustíveis, a chamada BECCS", diz ao Pesquisa para Inovação Julio Meneghini, diretor-geral do RCGI.
"Se for feita a captura e o armazenamento de CO2 gerado pela queima do diesel utilizado em caminhões para o transporte e em máquinas para o plantio da cana, por exemplo, e reduzida a aplicação de fertilizantes de origem fóssil para o cultivo da planta destinado à produção de bioenergia, o etanol brasileiro pode ter pegada negativa em termos de emissão de gases de efeito estufa", avalia.
Economia de baixo carbono
O texto do projeto de lei destaca que a utilização de mecanismos de sequestro geológico de carbono (CCS), que visam armazenar grandes quantidades de CO2 de forma permanente no substrato geológico, impedindo sua liberação, representa uma alternativa para a redução de emissões de GEE para setores que não conseguem atingir esse objetivo em razão de seus processos produtivos ou custo.
O texto aponta, contudo, que as tecnologias de baixo carbono no Brasil estão longe de um cenário de implantação em larga escala, especialmente para o sequestro geológico de carbono. Atualmente, apenas alguns campos na região do pré-sal conseguem desenvolver a atividade de CCS. Algumas das razões para isso, segundo o autor do projeto de lei, são restrições de licenciamento ambiental e a falta de regras claras, além do desafio de integrar os polos industriais em que ocorre a emissão do CO2 aos projetos de injeção para estocagem permanente.
Entre as barreiras à implementação de projetos de CCS em larga escala, três aspectos vêm sendo apontados como estratégicos. Primeiro, os custos para construção e operação das infraestruturas; segundo, a falta de políticas de incentivos para fomentar o desenvolvimento de CCS; e terceiro, a ausência ou falha na definição de questões jurídico-regulatórias relacionadas, principalmente, à etapa de armazenamento geológico do CO2.
"A implementação das atividades que formam a cadeia de CCS requer a edição de um marco regulatório específico para o seu desenvolvimento no Brasil, especialmente no que se refere à etapa de armazenamento de CO2, uma vez que esta etapa da cadeia inaugura novos usos para o subsolo brasileiro, que podem representar custos e riscos econômicos para o operador", avalia.
Essa ausência de normas sobre CCS no Brasil motivou a criação em 2017 de um grupo de estudos sobre o tema no RCGI, chamado de projeto 42. Atualmente, parte dos pesquisadores migrou para o novo projeto denominado Advocacy, cujos resultados das pesquisas subsidiaram o projeto de lei.
O grupo é composto, além de advogados, por pesquisadores com diferentes formações, como engenheiros, geógrafos, economistas e físicos, e mantém colaboração com centros de pesquisa sobre o tema nos Estados Unidos e no Reino Unido.
"Um dos objetivos do estudo que realizamos ao longo desses últimos cinco anos foi definir uma proposta legislativa sobre CCS no Brasil que estabelecesse alguns parâmetros, como a autoridade competente para outorga e regulação, os direitos de propriedade relativos à atividade de estocagem de carbono, o licenciamento ambiental e a responsabilidade civil de longo prazo", explica Hirdan Katarina de Medeiros Costa, coordenadora do projeto que embasou o projeto de lei.
Uma das conclusões dos pesquisadores, refletida no projeto de lei, é que por serem formações rochosas com valor econômico e, por isso, se enquadrarem no conceito de recursos minerais, os reservatórios geológicos são de propriedade da União. Em virtude disso, é ela quem deve conceder a outorga para atividade de CCS via Ministério de Minas e Energia (MME), por meio de uma autorização com prazo predeterminado e condições de revogação estipuladas em lei.
"Isso dá segurança jurídica para empresas interessadas em fazer o armazenamento de CO2, que é uma atividade econômica custosa", afirma a advogada Isabela Morbach, uma das pesquisadoras do grupo, que estudou os principais aspectos jurídicos que idealmente precisam estar definidos em um projeto de lei sobre CCS.
Uma vez que a tecnologia e a expertise em injeção e armazenamento de CO2 no Brasil foram desenvolvidas pela indústria de petróleo, a regulação de CCS no país deve ser feita pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), sugerem os pesquisadores. Já o licenciamento ambiental deve seguir as normas estabelecidas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama).