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Estudo revela que traumas na infância estão associados a 30% dos transtornos psiquiátricos em adolescentes (62 notícias)

Publicado em 10 de fevereiro de 2025

Um estudo inédito conduzido por pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) em parceria com a Universidade de Bath, no Reino Unido, revelou uma conexão alarmante entre traumas vividos na infância e o desenvolvimento de transtornos psiquiátricos na adolescência. Publicado na prestigiada revista The Lancet Global Health, o levantamento analisou dados de mais de 4 mil jovens brasileiros e identificou que 30,6% dos diagnósticos psiquiátricos aos 18 anos estão diretamente relacionados a experiências traumáticas precoces.

Os pesquisadores constataram que mais de 80% dos participantes relataram ter passado por pelo menos um evento traumático antes de atingir a maioridade. Dentre os fatores analisados, destacam-se acidentes graves, desastres naturais, violência doméstica, abuso físico e sexual, além da perda de um dos pais. O estudo demonstrou que quanto maior a exposição a esses eventos, maior o risco de desenvolver transtornos como ansiedade, depressão e transtornos de conduta.

Impacto da exposição à violência

A pesquisa teve como base a Coorte de Nascimentos de Pelotas de 2004, um estudo longitudinal que acompanha indivíduos desde o nascimento para avaliar os efeitos dos fatores de risco sobre a saúde. O levantamento contou com financiamento de instituições brasileiras e internacionais, como o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), a UK Research and Innovation (UKRI) e a Universidade de Bath.

A professora Alicia Matijasevich, do Departamento de Medicina Preventiva da FMUSP e coautora do artigo, destacou a relevância dos achados. “Os traumas na infância e adolescência têm um impacto significativo na saúde mental. Nossos resultados ressaltam a importância de estratégias de prevenção e intervenção precoce para mitigar os efeitos desses eventos ao longo da vida adulta”, afirmou.

A estudante de doutorado Megan Bailey, primeira autora do estudo, enfatizou a necessidade de investimentos em políticas públicas para proteger crianças e adolescentes. “A exposição à violência e outros eventos adversos é um fator de risco crucial para o desenvolvimento de transtornos mentais. Isso reforça a urgência de criar programas voltados à prevenção e ao apoio psicológico, especialmente para os mais vulneráveis”, ressaltou Bailey.

A carência de serviços de saúde mental

Um dos pontos centrais do estudo é a lacuna de evidências sobre o impacto dos traumas infantis em países de baixa e média renda. Segundo os pesquisadores, embora existam inúmeras pesquisas sobre o tema em países desenvolvidos, a realidade de nações com menos recursos é pouco explorada cientificamente. No Brasil, a prevalência de adversidades na infância é alta, e o acesso a serviços de saúde mental é frequentemente limitado.

Os especialistas defendem que é fundamental ampliar o suporte psicológico e psiquiátrico para crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade. A conscientização sobre os impactos dos traumas precoces também deve ser fortalecida, permitindo que professores, cuidadores e profissionais de saúde identifiquem sinais de alerta e encaminhem os jovens para o tratamento adequado.

O estudo reforça a importância de políticas públicas voltadas à prevenção de traumas na infância, como campanhas de combate à violência doméstica e abuso infantil, além da ampliação do acesso a serviços de saúde mental. “Proteger a infância significa garantir um futuro mais saudável e equilibrado para milhares de jovens”, conclui Alicia Matijasevich.