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Estudo revela mecanismo que agrava tuberculose e reduz sobrevida (24 notícias)

Publicado em 04 de fevereiro de 2024

Excesso de linfócitos em infecções podem causar danos ao pulmão; experimentos mostraram o que leva à resposta exagerada

Os linfócitos T CD4+ já foram amplamente descritos na literatura científica pelo importante papel na resposta imunológica durante infecções pulmonares. Porém, pesquisa publicada na revista “ Cell Reports ” demonstrou que um acúmulo excessivo dessas células de defesa nos tecidos pulmonares – responsáveis pelas trocas gasosas essenciais para a respiração – está associado a danos nos pulmões em vez de desempenhar uma função de proteção.

A descoberta, obtida por meio de modelos de camundongos com tuberculose virulenta e influenza, aponta para a presença de uma “ quantidade ideal ” dos linfócitos no tecido pulmonar a fim de assegurar o bom desfecho da doença. Esse achado abre perspectivas para intervenções terapêuticas que visam reduzir o impacto no hospedeiro sem afetar a capacidade do sistema imunológico de combater a infecção. Mesmo números reduzidos de células T CD4+ no pulmão se mostraram suficientes para proteger contra a tuberculose, por exemplo.

Os pesquisadores observaram que o acúmulo dos linfócitos no tecido pulmonar é mediado por um tipo específico de receptor, o P2RX7, capaz de detectar a presença de ATP (sigla em inglês para trifosfato de adenosina) extracelular. O ATP tem função energética para a célula, mas em contextos de estresse ou dano tecidual é liberado no meio exterior, atuando como um sinal de perigo para as células de defesa e, em alguns casos, induzindo uma resposta excessiva.

O P2RX7 induz o acúmulo excessivo dos linfócitos, aumentando a expressão de CXCR3, um receptor de quimiocinas (proteínas que atuam como sinais químicos no sistema imunológico atraindo células específicas para áreas onde são necessárias). Segundo o estudo, o acúmulo de T CD4+ no pulmão induzido pela ativação do P2RX7 está ligado ao agravamento da patologia e à redução da sobrevida dos animais.

“ Quando esse ATP está no meio extracelular, ele é reconhecido como um sinal de dano pelo sistema imune, já que a molécula que deveria estar dentro da célula saiu. Estudos vinham mostrando a importância dele para o desenvolvimento de formas graves da tuberculose, mas ainda não se sabia quais eram os mecanismos e especificamente qual célula mais expressava. Partimos daí para a pesquisa, porém, sempre tivemos a intenção de melhorar a resposta dessa célula. O que não esperávamos era que, se tirássemos o receptor bloqueando o reconhecimento do ATP, haveria uma melhora e não piora ”, disse à Agência FAPESP o doutor em imunologia Igor Santiago-Carvalho , do ICB-USP (Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo).

Primeiro autor do artigo, Santiago-Carvalho trabalhou sob a orientação da professora Maria Regina D'Império Lima , que vem pesquisando imunologia celular, principalmente em malária, doença de Chagas e tuberculose, há mais de 20 anos. “ Quanto mais conseguirmos compreender quais são os principais ‘jogadores' no balanço entre uma resposta imune deficitária, uma ótima e uma excessiva, maior será a chance de manipular essa resposta por meio de drogas e tratamentos visando um melhor controle e desfecho da doença ”, afirma Lima.

De acordo com a professora, os linfócitos T são “ players” importantes nesse processo pela capacidade de estimular e regular a resposta imune.

“ Por isso, buscamos entender quais são as vias de sinalização que influenciam esse balanço. Percebemos durante o projeto que, quando o tecido está muito danificado, acaba liberando uma grande quantidade de sinais de dano. Nos preocupamos particularmente com o ATP e vimos que a quantidade de linfócitos T que entra no tecido ao detectar essa molécula foi excessiva, induzindo uma resposta inflamatória intensa e lesiva. Em alguns casos, chega a levar a um processo fibrótico no pulmão. Interferir nessa via de sinalização pode ser interessante para reduzir os danos causados pela resposta imune excessiva contra a infecção ”, afirmou.

A tuberculose ainda é considerada um importante problema de saúde pública, agravada recentemente pelo aparecimento de bactérias resistentes a antibióticos. Infecciosa e transmissível, a doença afeta prioritariamente os pulmões.

Os sintomas mais comuns são tosse seca contínua, que depois de 4 semanas pode ter secreção; cansaço excessivo; febre baixa; sudorese noturna; falta de apetite; e emagrecimento acentuado.

O atraso no início do tratamento, a alta virulência das cepas e a suscetibilidade do paciente contribuem para a severidade do caso, frequentemente associada a uma resposta inflamatória deletéria, conduzindo à dificuldade de respiração e até necrose pulmonar. O tratamento é feito à base de antibióticos durante 6 meses, não podendo haver abandono nem irregularidade.

No mundo, os novos casos diagnosticados de tuberculose foram recorde em 2022, com 7,5 milhões de registros , o que representa o maior número desde que a OMS (Organização Mundial da Saúde) iniciou o monitoramento global em 1995. O crescimento foi atribuído à ampliação dos serviços de diagnóstico e tratamento.

Inicialmente projetado para trabalhar com tuberculose, o estudo também testou o papel do P2RX7 específico para T CD4+ em camundongos infectados com influenza. O resultado foi semelhante.

“ Isso direcionou bastante o que estou fazendo ao continuar estudando como sinais de dano controlam as respostas imunes. No artigo, chegamos à conclusão de que as células T CD4+ podem ser patogênicas. Agora queremos entender o que leva ao aumento dessa patogenia para, assim, defini-la e mostrar os mecanismos por trás disso, podendo aplicá-los para outras doenças. Entendendo as características dessa célula que acabam induzindo uma resposta tão forte a ponto de danificar o tecido é possível buscar alternativas terapêuticas ”, explica Santiago-Carvalho.

Com informações da Agência Fapesp