O churrasquinho grego é um dos lanches mais presentes na capital paulista. Feito com miolo de acem, a especiaria é pedida certa para quem não quer enfrentar grandes filas.
Apesar das vantagens, muitos brasileiros evitam o produto, por conta de dúvidas a respeito de sua origem e higiene, fato que inspirou Aline Katsurayama, estudante de biomedicina da Unesp Botucatu (SP).
Ao longo de 2014, ela coletou 100 amostras em dez pontos de venda do churrasco grego. O resultado mostrou que 71% apresentavam alta quantidade de coliformes termotolerantes, ou seja, coliformes fecais.
“Foram constatadas mais de um milhão de bactérias em 35% delas, o que indica que o alimento estava em processo de deterioração”, conta Aline, que desenvolveu seu trabalho de conclusão de curso sobre o churrasco grego, com apoio da Fapesp. “Quando se compara este resultado em 71% das amostras em São Paulo com o que eles encontraram na Austrália, em que não chegava a 15%, fica claro que a higiene está bem ruim”, constata.
Só R$ 2,50, com suco grátis
Marcos Silva Carvalho, 30 anos, trabalha com a venda da especiaria há seis anos. Todas as noites, ele fatia, tempera e molda a carne. Em seguida, o alimento é envolto em papel filme e posto na geladeira. Às 5h da manhã, a carne é assada na máquina.
“Recebo umas 200 pessoas por dia”, revela ele. O ponto de Marcos vende o lanche por R$ 2,50 e o cliente ainda ganha, de brinde, um copo de suco. Para manter a higiene do produto, Marcos diz que usa luvas plásticas e as troca a cada dois ou três lanches.
O consumidor ainda pode adicionar vinagrete ou salada de repolho, cenoura e pimentão ao lanche, o que o torna mais saboroso. Porém, em todos os pontos visitados por Aline, a salada é armazenada em uma gaveta, abaixo das grelhas que assam a carne, sendo que as verduras deveriam estar refrigeradas.
“Os termotolerantes são resistentes à temperatura. Porém, a hipótese mais provável é que a contaminação tenha ocorrido após o cozimento da carne, porque a colher utilizada para pegar a salada é a mesma que pega a carne”, explica Katsurayama.
As cinco diferentes análises realizadas por Aline identificaram a presença de outros micro-organismos regulados pela RDC, resolução da ANVISA que estabelece microbiológicos sanitários para alimentos. Em 1% das amostras foi encontrada Salmonella. Além disso, em quatro foram detectadas a presença de Staphylococcus aureu, que se reproduz com a presença de oxigênio. Todas estas bactérias podem causar doenças como infecções alimentares, infecções intestinais, gastroenterite e septicemia.
Outro ponto que indica a falta de higiene é a manipulação do dinheiro pela mesma pessoa que faz o lanche, prática que ocorre em outros comércios alimentícios. Além disso, a pesquisa de Aline revela que os comerciantes entrevistados usam luva em apenas uma mão.
"Eu tive sorte e ainda estou vivo"
O caso inspirou, até mesmo, um texto do dramaturgo Mário Bortolotto, um dos nomes mais conhecidos da cena teatral paulistana. “Dentre as inúmeras opções gastronômicas de sabor indubitavelmente apetitoso que o Centro da Cidade nos oferece, o insuperável Churrasco Grego paira solene e majestoso acima de todos com essa norma os outros”, escreveu Bortolotto. “Não quero incitar ninguém a provar de tal acepipe, mesmo porque já ouvi falar de pessoas que morreram intoxicadas depois de provar esse quitute divino. Eu tive sorte e ainda estou vivo”, adverte o escritor.
Porém, a fama que o churrasquinho grego tem de trazer problemas para saúde fica apenas no campo das ideias. Por que não se encontram, diariamente, relatos de pessoas que passaram mal por conta do lanche? A orientadora do TCC de Aline, Vera Moraes Rall, acredita que o motivo para a falta de registros seja explicado pela preferência do intoxicado de se recuperar em casa.
“A literatura de pesquisa estima que apenas 30% dos casos de doenças com origem alimentar são diagnosticados no mundo”, explica a orientadora.
"É fresquinho e gostoso!"
Assim como o dramaturgo Mário Bortolotto, Marisa do Carmo Jacinto também teve sorte. A aposentada de 57 anos diz que já foi uma exímia consumidora do churrasco grego. “É bem temperado, o pão é fresquinho, gostoso! Também é bom porque é barato”, conta.
Porém, o hábito de Marisa diminuiu na última década, devido à conscientização referente à qualidade do alimento. “Fica exposto e alguns têm muita gordura”, explica ela.
Entretanto, vale ressaltar que 29 amostras testadas pela pesquisadora Aline Katsurayama apresentaram nenhum tipo de contaminação, o que se relaciona com a recomendação de Marisa: “Não dá para negar que alguns têm mais higiene que outros. Na hora de escolher o ponto para comprar o churrasquinho grego é só observar isso”.