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Diário Oficial do Estado de São Paulo

Estudo permite diagnóstico sobre impactos da elevação do nível do mar até 2100

Publicado em 31 agosto 2017

O município de Santos, no litoral paulista, é o primeiro do Brasil a ter dados específicos para planejar ações de mitigação dos efeitos da elevação do nível do mar, que pode chegar a 23 centímetros no ano de 2050 e a 45 centímetros em 2100.

Caso nenhuma obra de adaptação seja feita, as mesmas informações estimam prejuízos de, no mínimo, R$ 1,5 bilhão com os danos causados nos imóveis atingidos pelas inundações que decorrerão desse cenário. Essas informações resultam de estudo inédito financiado pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e integrado ao Projeto Metrópole, iniciativa internacional dirigida à elaboração de diagnósticos sobre os impactos das mudanças climáticas em cidades costeiras. As outras localidades investigadas são o Condado de Broward, nos EUA, e a cidade de Selsey, na Inglaterra.

Plataforma Coast – Segundo a pesquisadora do Instituto Geológico de São Paulo, Célia Regina Souza, integrante da equipe brasileira, o trabalho iniciado em 2013 e recém-concluído abrangeu desde o modelamento digital de projeções climáticas, para estimar a elevação do nível do mar e os potenciais danos nas estruturas dos municípios neste século, realizado com a plataforma Coast (Costal Adaptation to Sea Level Rise Tool), a levantamentos relacionados a outros aspectos, como as percepções de risco entre a população, avaliações dos riscos das mudanças climáticas para a saúde e a capacidade adaptativa do município.

No caso de Santos, também houve a formação de grupos de trabalho para a elaboração das medidas adaptativas. “A metodologia foi idêntica em todas as localidades, mas as ações se deram de forma paralela, e a próxima fase será a de comparação dos dados”, explica a geóloga.

A escolha de Santos para a pesquisa em solo nacional deu-se porque o município reúne os mais completos dados sobre elevação de marés no País, registrados desde 1945 por marégrafos, e desde 1993 também por satélite, bem como por enfrentar constantes episódios de alagamento decorrentes de ressacas.

Célia destaca que pesou, ainda, o fato de ela possuir um banco de dados suplementar com informações sobre a ocorrência de marés altas no município desde 2010, quando realizou um serviço de monitoramento no porto santista. “Essas condições garantiram o pioneirismo do trabalho, já que pudemos utilizar dados locais e não os do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), como ocorre normalmente. Temos, assim, um resultado bem mais realista”, afirma a pesquisadora.

Riscos de impacto – Coordenada pelo climatologista do Centro Nacional de Monitoramento de Desastres Naturais (Cemaden) José Marengo, e integrada por cientistas de várias instituições, como o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a pesquisa brasileira foi direcionada às duas áreas santistas com maior risco de sofrerem impactos com as mudanças climáticas.

Denominadas Zona Sudeste (inclui 2 quilômetros quadrados da costa, onde vi - vem 34 mil habitantes, entre o canal 4 e a Ponta da Praia) e Zona Noroeste (11 quilômetros quadrados, entre os morros de Santos e o estuário, habitados por 83 mil pessoas), essas regiões foram avaliadas na plataforma a partir de três variáveis: dados espaciais georreferenciados; séries históricas sobre a elevação do nível do mar (ENM), incluídos os eventos de ressacas; e as socioeconômicas, no caso os danos relacionados a níveis de inundação e os valores venais de ativos imobiliários.

Os modelos de projeções elaborados, com cenários de aumento de nível do mar associado a tempestades, apontaram previsões mínima e pessimista para 2050, de 18cm e 23cm, respectivamente, e, para 2100, de 36cm e 45cm. “Sendo que o mais provável de ocorrer são os cenários pessimistas, porque observamos uma aceleração da elevação e de episódios de ressacas a partir da década de 1990”, alerta a geóloga.

Prejuízos – Os dados foram apresentados no decorrer da pesquisa a grupos de trabalho do município, que, convidados a levantar as medidas de adaptação consideradas mais adequadas pela comunidade, relacionaram as mais votadas para compor um plano de ação.

Para a Zona Noroeste, as escolhas são dragagem, readequação do sistema de comportas e estações de bombeamento, além de recuperação do manguezal. Para fortificar a sudeste, a maioria sugere a alimentação artificial da praia e a readequação do muro de proteção.

A pesquisa mensurou ainda os custos da adoção ou não dessas propostas, levando em consideração apenas os valores venais dos potenciais imóveis atingidos. Com projeções de elevação das marés em 45cm até 2100, os danos custariam mais R$ 230 milhões na Zona Noroeste e passariam de R$ 1 bilhão na região sudeste do município, sem a adoção das medidas adaptativas. Com elas, seriam nulos na orla e cairiam em R$ 64 milhões na região noroeste.

Planejamento – O coordenador do estudo salienta que a finalidade maior do levantamento é fornecer aos tomadores de decisão a melhor informação possível para o planejamento urbano futuro, ou seja, as ações indicadas e seus benefícios. Marengo alerta também que é necessário antecipar as medidas aos danos.

“A adaptação, ainda que seja discutida pela ciência e pelos tomadores de decisão, tem de ter uma política, tem de partir do Governo. É uma ação que não pode parar e, obviamente, tem de ter investimento. A cidade de Santos chegou a um alto nível de conscientização, com amplo diálogo entre população, tomadores de decisão e universidades, conclui o pesquisador.

Segundo ele, os métodos utilizados no município podem ser replicados em qualquer cidade da costa brasileira, “mas é importante, para isso, poder contar com o interesse e envolvimento da administração e da comunidade local”, ressalta.

Simone de Marco Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial