Segundo estudo, tanto as pessoas que tiveram ou foram vacinadas podem ser infectadas pela variante
Experimentos laboratoriais realizados na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) indicam que anticorpos presentes no plasma sanguíneo de pessoas que já tiveram covid-19 e se recuperaram, são cerca de seis vezes menos eficientes para neutralizar a variante brasileira do SARS-CoV-2, denominada P.1., do que a chamada linhagem B, que circulou no País nos primeiros meses da pandemia.
O estudo mostra ainda que o plasma coletado de indivíduos que receberam a segunda dose da CoronaVac há cerca de cinco meses apresenta baixa quantidade de anticorpos capazes de neutralizar o novo coronavírus- tanto a linhagem B quanto a variante P.1.. Os dados foram divulgados nesta segunda-feira na plataforma Preprints with The Lancet e ainda estão em processo de revisão.
“ O que esses resultados preliminares sugerem é que tanto as pessoas que já tiveram covid-19 como aquelas que foram vacinadas podem ser infectadas pela nova variante P1. e, portanto, não devem se descuidar ”, alerta o professor do Instituto de Biologia e coordenador da investigação, José Luiz Proença Módena.
Segundo o pesquisador, esse fenômeno é comum e ocorre também com outras vacinas, fazendo com que alguns vírus continuem circulando mesmo após uma população ser imunizada. “ Em hipótese alguma ele sugere que a vacina não funciona ”, afirma.
Os experimentos descritos no artigo foram realizados com apoio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) no Laboratório de Estudos de Vírus Emergentes da Unicamp, que tem nível 3 de biossegurança (NB3) e é administrado por Módena.
O grupo recebeu de colaboradores do Centro Brasil Reino Unido para Descoberta, Diagnóstico, Genômica e Epidemiologia de Arbovírus 20 amostras de secreção nasofaríngea de pacientes infectados pela variante brasileira, que foram inoculadas em culturas celulares suscetíveis ao SARS-CoV-2. A presença da P.1.. nas amostras dos pacientes foi confirmada por sequenciamento do genoma viral. Dois isolados da variante P.1. obtidos a partir das culturas infectadas in vitro foram usados nos testes de neutralização feitos tanto com o plasma de convalescentes quanto de vacinados. “
Nós já tínhamos uma coleção de plasma doado por pessoas que se recuperaram da covid-19 — todas as amostras com altas quantidades de anticorpos neutralizantes. Esse material foi originalmente colhido e analisado para o tratamento de pacientes em estado grave [ método conhecido como transfusão passiva de imunidade ou terapia com plasma convalescente ”, contou Módena à Agência Fapesp.
As amostras de plasma convalescente — coletadas entre dois e três meses após a infecção — foram testadas paralelamente contra a linhagem B e a variante P.1.. Os resultados indicam que o potencial de neutralização frente à nova cepa foi em média seis vezes menor.
“ Esse é um valor que chama a atenção ”, diz Módena. “ No caso do vírus influenza [ causador da gripe], por exemplo, quando de um ano para outro surge uma nova variante que é seis vezes menos neutralizada pelos anticorpos, já se considera que há escape imune e que é necessário atualizar a vacina. ”
MAIS ESTUDOS
Os experimentos de neutralização com o plasma de vacinados foram feitos com amostras coletadas de oito voluntários que participaram do ensaio clínico de fase 3 da CoronaVac.
Como os testes clínicos de fase 2 já haviam indicado, a quantidade de anticorpos neutralizantes no sangue dos vacinados cai fortemente após aproximadamente seis meses. Desse modo, nos testes in vitro feitos na Unicamp, o efeito de neutralização do plasma sanguíneo foi pequeno tanto contra a P.1. quanto contra a linhagem B. No entanto, os pesquisadores destacam que esses resultados precisam ser interpretados com cautela, pois anticorpos neutralizantes são apenas um dos componentes do sistema imunológico.
Segundo o pesquisador, o número de indivíduos avaliados no estudo é pequeno e os resultados não são robustos o suficiente para concluir algo relacionado à eficácia da CoronaVac contra a variante brasileira do novo coronavírus. “ São necessários estudos mais aprofundados para avaliar tanto a eficácia da CoronaVac como de outras vacinas contra a P.1. ”, diz.